Demóstenes confirma 'presentes' de Cachoeira

Senador diz no Conselho de Ética que pivô do escândalo bancava as contas do aparelho Nextel e admitiu que fez lobby para laboratório ligado ao contraventor

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Por Ricardo Brito e BRASÍLIA
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O senador Demóstenes Torres (ex-DEM, sem partido-GO) admitiu, em depoimento ontem ao Conselho de Ética, que o contraventor Carlinhos Cachoeira bancava as contas do aparelho Nextel que ganhou dele e no qual conversavam. A confissão complicou ainda mais a situação política de Demóstenes, ameaçado de cassação por ter defendido, como senador, os interesses de Cachoeira.O parlamentar disse que o contraventor pagava a conta de até R$ 50 por mês e afirmou que não aceitou o Nextel do contraventor para escapar de eventuais interceptações telefônicas. O grupo de Cachoeira achava que o aparelho, que é um rádio e telefone habilitado nos Estados Unidos, era imune a grampos.Ao tentar mostrar naturalidade com o presente recebido, Demóstenes afirmou que, desde 1999, quando era secretário de Segurança Pública de Goiás, sabia que qualquer aparelho é passível de ser grampeado. Questionado por Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), como pode um senador da República ganhar tal tipo de presente, respondeu: "O contexto é completamente outro. Isso não teve conotação de pagamento ou do quer que seja". Outro ponto tido como frágil pelos integrantes da comissão, durante o depoimento que durou cinco horas, foi o fato de que o senador teria repassado ao contraventor, em uma conversa telefônica grampeada, informações sigilosas de uma operação da Polícia Federal e do Ministério Público Federal de combate aos jogos ilegais. Demóstenes disse que, na verdade, jogou verde para saber se Cachoeira ainda atuava na ilegalidade.O contraventor, segundo ele, deu a mesma resposta dada anteriormente ao governador de Goiás, Marconi Perillo, de que era apenas empresário. "Então, evidentemente, aqui foi realmente jogar verde, tanto é que nenhuma operação acontece", afirmou.Demóstenes confessou ter utilizado várias vezes avião de empresários e amigos, mas nunca um cedido por Cachoeira, apesar de ter admitido que é amigo do contraventor.O parlamentar também confessou ter feito lobby na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em favor do laboratório Vitapan, da família de Cachoeira. Mas ressalvou ter atuado para todas as empresas do ramo farmacêutico de Goiás. O senador negou ser sócio oculto ou ter atuado em favor da Delta Construções.Prevaricação. Durante o depoimento, Demóstenes afirmou que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, cometeu o crime de prevaricação e ato de improbidade administrativa ao segurar, em 2009, uma investigação que apontava o seu envolvimento com o Cachoeira. "Ele prevaricou. Praticar ou retardar ato de oficio para satisfazer interesse pessoal", respondeu o senador à pergunta feita pelo colega Fernando Collor (PTB-AL). "A improbidade administrativa é evidente", ressaltou. "Creio que mais dia, menos dia ele vai ter que responder por isso." Ao fim da reunião, o relator do conselho, Humberto Costa (PT-PE), não quis fazer prejulgamento de Demóstenes, mas considerou que "não é usual" um parlamentar receber um telefone de um contraventor. Depressão. Demóstenes fez uma exposição inicial de mais de duas horas em que apelou para o discurso sentimental. Chegou a dizer que pensou em renunciar. "Vivo o pior momento da minha vida. Vivo um momento que eu jamais imaginaria passar", afirmou, dizendo que está com depressão, tem tomado remédios para dormir e assistido à fuga dos amigos.Ao senador Aníbal Diniz (PT-AC), disse que é um "homem que tem vergonha na cara". "Sou um carola. Contei o que me aconteceu e ninguém precisa se sensibilizar com isso", afirmou. Dos 30 parlamentares da comissão, apenas 4 fizeram perguntas a Demóstenes durante o depoimento.

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