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Comissão da Verdade buscará dados fora do País

Na investigação de abusos cometidos pela ditadura, o grupo terá acesso a informações de ONU, OEA e comissões análogas de países vizinhos

Por JAMIL CHADE e GENEBRA
Atualização:

Além de pesquisas feitas no Brasil, a Comissão da Verdade, em sua tarefa de investigar os abusos cometidos contra os direitos humanos de 1946 a 1985, sairá em busca de documentos, arquivos, telegramas e relatórios sobre o assunto mantidos até hoje por governos estrangeiros e organizações internacionais.O que se pretende é lançar luz sobre atos praticados pela chamada Operação Condor, que uniu governos do Cone Sul no combate a movimentos de esquerda. Arquivos já montados por comissões da verdade na Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai serão consultados pelos representantes do grupo brasileiro. Nessa investigação se tentará identificar a cooperação, via Operação Condor, entre os regimes militares da região. O Estado obteve confirmações de que também serão consultados os arquivos diplomáticos desses países. Os nomes dos governos em questão ainda estão sob sigilo. O esforço inclui o acesso a arquivos de entidades do sistema ONU e outras da Organização dos Estados Americanos (OEA).A ONU já comunicou que está disposta a ajudar a Comissão da Verdade no Brasil - o que foi deixado claro, no momento de sua instituição, pela alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Navi Pillay.Nesta semana, questionado pelo Estado, o subsecretário-geral da ONU e ex-diplomata sueco Jan Eliasson reforçou o propósito. "Como diplomata sueco, trabalhei por muito tempo, nos anos 70, recebendo refugiados do Chile, Argentina e Uruguai, que viviam ditaduras", disse ele. "É um grande alívio ver que esse período acabou. Hoje, qualquer esforço de reconciliação deve ser apoiado."Ajuda externa. A busca da comissão brasileira em outros países, ao que consta, não é inédita. Nações que passaram por processos similares no Cone Sul e também a África do Sul recorreram a documentos de diplomacias estrangeiras para saber mais sobre o que ocorria dentro de suas fronteiras. No Mercosul, governos chegaram a fechar um acordo para a abertura conjunta de arquivos, para agilizar a busca por informações. Diplomatas brasileiros envolvidos nesse acordo revelaram ao Estado que, nas reuniões de negociação, ficou claro que os atuais governos enfrentam desafios parecidos. Segundo Eliasson, militares de cada um dos países envolvidos alegavam não haver mais documentos do período - e assim não haveria mais prova de qualquer crime. "A esperança de muitos é que revelações possam estar guardadas justamente do outro lado da fronteira", ponderou.No início do ano, o atual ministro de Relações Exteriores do Uruguai, Luís Almagro, revelou ao Estado que seu governo estava preparando um pedido oficial de acesso aos arquivos da ditadura uruguaia que possam existir no Brasil, justamente para obter informações sobre crimes praticados naquele país. "Precisamos ir no sentido contrário ao do seguido quando criaram a Operação Condor", afirmou. "Ir no sentido inverso e usar o fato de que somos democracias para contribuir justamente na troca de informações."

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