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A vingança do Grilo Falante

No clássico infantil de Carlo Collodi, o Grilo Falante é a consciência de Pinóquio, que o adverte, aconselha e incomoda, mas o boneco mentiroso não o ouve e prefere a companhia de raposas felpudas e gatos gatunos. Infantil? Parece mais uma profecia metafórica do tsunami que devastou os políticos e partidos mentirosos e gatunos nas eleições italianas, quando o Movimento Cinco Estrelas, fundado pelo comediante Beppe Grillo, conquistou 25% dos votos e fez 109 deputados e 54 senadores. Grillo recusou o financiamento público legal, não foi a nenhum debate na televisão, não deu entrevistas e fez toda a campanha pelas redes sociais, percorrendo o país num trailer emprestado e lotando as praças em grandes manifestações contra os políticos e partidos. Não aceitou doações de empresas, só individuais, e fez a campanha mais barata da história. O M5E se diz um não partido e não tem sede física nem assembleias, é tudo na nuvem digital. As decisões e candidaturas são votadas on-line pelos militantes, sem qualquer hierarquia. Os homens e mulheres eleitos pelo Cinco Estrelas são de todas as classes sociais e regiões, têm idade média de 37 anos e nenhuma experiência política. No Parlamento, querem o tratamento de "cidadão" e não de "honorável", porque os políticos mentirosos e gatunos o desmoralizaram. Não exigem cargos nem participação em ministérios e estatais, mas ficha limpa e concursos públicos. Não se sabe o que os "grilos" farão no Parlamento, mas com certeza não vão se aliar a nenhuma coalizão partidária, no máximo votarão as propostas caso a caso, como independentes. Grillo não é um Tiririca, é inteligente e informado, anárquico e desbocado, como um mix de Bussunda e Rafinha Bastos. O cofundador e ideólogo do movimento é o pensador Gianroberto Casaleggio, um dos maiores estrategistas da internet na Itália. O irônico é que os grandes partidos de centro-esquerda e de centro-direita, com medo das ruas, encerraram suas campanhas em teatros, o palco dos comediantes, enquanto o cômico levava multidões ao delírio nas praças, território dos políticos. Nada será como antes no país de Dante.

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Por Nelson Motta
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