No sentido inverso, o ciclo eleitoral passado favoreceu petistas e aliados: ganharam prefeitos e, na eleição seguinte, deputados. Mas também aumentou a dispersão partidária. Mais legendas conquistaram espaço nas prefeituras e isso levou à pulverização ainda maior do poder na Câmara dos Deputados. A base de sustentação do governo federal ficou mais fluida, movediça.
Só por isso, o governo Dilma Rousseff já teria muito interesse no que vai acontecer nas eleições de 2012. Mas não fica aí. O pleito será o primeiro teste real de popularidade da presidente. Mesmo que os problemas locais sejam mais relevantes na decisão do voto de prefeito do que as ações federais, o resultado das urnas será creditado ou debitado parcialmente na conta de Dilma. Sua imagem sairá fortalecida ou enfraquecida. É uma prévia de 2014.
O governo federal influencia a eleição de prefeitos com transferências preferenciais de verbas, priorizando obras, alimentando ONGs -como fazem também os governos estaduais. Mas Brasília tem um poder a mais, o de influir no clima geral da opinião pública, pelo que faz com a economia. Otimismo ou pessimismo nascem no bolso e dali se espalham até chegar ao dedo que tecla "confirma" na urna eletrônica.
Um eleitor otimista é mais propenso a reeleger seus governantes. O pessimista é mais aberto a mudanças. Portanto, é do interesse geral dos prefeitos candidatos à reeleição que a economia esteja aquecida no próximo ano. Assim como é do interesse de Dilma.
É difícil encontrar algo que se correlacione mais com a popularidade do presidente no Brasil do que a confiança do consumidor. Se esse índice sobe, a avaliação do governo federal tende a melhorar, e vice-versa. Dentre os itens que compõem a versão do índice divulgada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), dois têm correlação ainda maior: a situação financeira do entrevistado hoje (comparada ao período imediatamente anterior), e a expectativa do que deve acontecer com essa mesma situação financeira no futuro próximo.
A combinação desses dois indicadores, pesquisados mensalmente em sondagem CNI/Ibope, tem um coeficiente de correlação de 0,9 com o saldo de aprovação do governo federal. Grosso modo, é possível antecipar com 90% de acerto a tendência da popularidade de um presidente a partir desse índice composto -que poderia ser batizado de "bolso eleitoral".
O mais surpreendente é o quão mais forte é essa correlação entre o bolso e a popularidade presidencial do que entre a imagem do governo e os outros indicadores que compõem o índice de confiança do consumidor. O medo do desemprego tem correlação, mas significativamente mais fraca do que o "bolso eleitoral". E a expectativa de inflação simplesmente não se correlaciona com a popularidade presidencial. Oscilam frequentemente em direções opostas.
É mais um sinal de que o discurso da estabilidade econômica perdeu para o do crescimento. Talvez porque os últimos oito anos mostraram ser possível crescer sem perder o controle da inflação. Mais do que isso, esses anos de bonança criaram na opinião pública uma expectativa de que a capacidade de consumo não só pode como deve aumentar continuamente.
Quando o governo reativa o crédito, corta impostos sobre operações de financiamento e diminui a taxa de juros básica ele está tomando medidas para tentar reaquecer a economia e gerar mais consumo. O eventual aumento da atividade tem vários efeitos positivos para o próprio governo: aumenta a arrecadação de impostos e a disponibilidade de recursos para gastar.
Mas não dá para ignorar que a retomada do ritmo da atividade econômica também paga bônus eleitoral para aos governantes ao elevar o nível de confiança do consumidor. Toda ação governamental gera uma reação na opinião pública. Não existe o ato de governar exclusivamente técnico. Quem governa são os políticos, não os tecnocratas.
Nem toda medida com impacto eleitoral é ruim em si. A adaptação da política econômica às circunstâncias é do jogo. Entre as circunstâncias estão o ambiente político e a opinião pública. Um governo com popularidade em baixa perde sustentação política e, por tabela, graus de liberdade para determinar sua própria política econômica.
O problema acontece quando os interesses eleitoreiros de curto prazo de chocam com o que é melhor para o País no longo prazo. Por ora, o governo Dilma tem espaço para administrar as contradições entre a pressão inflacionária e o ritmo do consumo. Mas nem sempre é assim.
Logo após o massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, Fernando Henrique Cardoso experimentou seu único momento de impopularidade durante o primeiro mandato presidencial. Logo que as mortes saíram das manchetes, FHC recuperou a boa imagem conquistada pela estabilidade econômica. Reelegeu-se meses depois. Porém, ele nunca recuperou a popularidade perdida pela desvalorização abrupta do real, logo no início do segundo mandato.
Os governantes se tornam escravos do próprio sucesso. Quando não o seguem, pagam por isso.
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