Um século depois de receber uma leva de imigrantes maior do que era a sua população nativa de então, a capital paulista abriga apenas 28% de moradores que não nasceram no Estado de São Paulo. Mas a distribuição dessas pessoas que escolheram viver na cidade está longe de ser homogênea. Varia de 49% de imigrantes na periférica Anhanguera a 14% na tradicional Vila Carrão.
Os imigrantes - originários majoritariamente de outros Estados e, em menor parte, do exterior - se concentram em duas grandes áreas espacialmente distantes, mas economicamente semelhantes: a extrema periferia e o centro histórico de São Paulo. Entre elas, a formar um anel de distritos com maior presença de paulistas, encontram-se as regiões mais ricas da cidade e os bairros de moradia da tradicional classe média paulistana.
Esse anel está pintado com as cores mais claras no mapa que ilustra esta página. Ele compreende 56 distritos cuja renda domiciliar média é de R$ 5 mil. Só 1 em 5 de seus moradores veio de outros Estados ou países. Os outros 78% são, em grande parte, a segunda ou terceira geração de ondas migratórias mais antigas. Numa cidade que teve o maior crescimento entre as metrópoles mundiais no século 20, poucos não são imigrantes ou seus descendentes.
Os outros 40 distritos - identificados pelas cores mais vivas no mapa - têm uma presença de migrantes bem acima da média da cidade: 35%. Não por coincidência, o rendimento médio em suas habitações é metade do resto da cidade: R$ 2,5 mil. Nos mais pobres é a metade da metade. A desigualdade de renda é reflexo de como se deu a ocupação dessas regiões nos últimos 50 anos.
A maioria dos imigrantes recentes foi morar em áreas nos extremos da cidade que foram sendo incorporadas à mancha urbana sem planejamento e com carências de todo tipo de serviço público: do transporte à assistência médica, de escolas ao saneamento básico. Nos anos 70 e 80, esse movimento criou gigantescos distritos dormitórios, como o Grajaú, onde vivem mais de 100 mil moradores nascidos fora de São Paulo.
Esse movimento expansionista transbordou para os municípios vizinhos a São Paulo nos anos 80 e 90. Na cidade em si, até por falta de espaço, ele ficou restrito a poucas regiões. A mais dinâmica delas é Anhanguera. No extremo noroeste da cidade, é o distrito que forma a ponta de uma das orelhas do cachorro imaginário que muitos vêem quando olham o mapa paulistano. Sua renda domiciliar é de apenas R$ 1.788.
O restante dos imigrantes reocupou áreas do centro histórico - muitas vezes em habitações coletivas - em distritos como o Pari, onde nada menos do que 46% dos moradores são imigrantes. Nessas regiões mais centrais a renda média é maior do que na periferia. Chega a R$ 2.784 no Brás e a R$ 2.984 no Pari. Um dos motivos é que nessas áreas vive um outro tipo de imigrante, o estrangeiro.
As ondas mais recentes de migração do exterior para a cidade de São Paulo miraram principalmente o centro. Os distritos paulistanos com maior concentração de estrangeiros são o Bom Retiro (16% de seus moradores nasceram em outros países) e Pari (14%), seguidos por Brás, Belém e República.
Repetem-se os destinos dos imigrantes italianos e espanhóis que desembarcaram em São Paulo na virada do século 19 para o 20. Mas, em vez de europeus, as novas onda migratórias vêm da Bolívia, da China e da Coreia do Sul. Os bolivianos como mão-de-obra, os coreanos como empregadores dos bolivianos, e os chineses em ambas as posições.
METODOLOGIA
As informações analisadas no projeto "96 vezes São Paulo" são fruto de uma parceria do Estadão Dados com o Ibope. Usando métodos estatísticos e de georreferenciamento, o instituto conseguiu associar aos 96 distritos paulistanos as respostas do questionário estendido do Censo 2010.
Aplicado a apenas uma parcela das habitações recenseadas, a chamada "amostra" do Censo inclui informações sobre migração, religião, rendimento, trabalho, condições e bens presentes nos domicílios. Elas serão objeto de reportagens ao longo das próximas semanas e de mapas interativos no blog do Estadão Dados.
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