Mesmo com esses critérios, o Judiciário abusa das preventivas: pelo Departamento Penitenciário Nacional, 40% dos presos no Brasil nem sequer tiveram uma condenação em primeira instância. A excepcionalidade que a lei impõe à prisão preventiva se perde em um sistema de justiça que investiga mal e prende muito.
Por esse viés, a decretação da prisão preventiva do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é comum.
Os fundamentos apresentados pelo juiz Sérgio Moro repetem aqueles usados pelo STF quando determinou a suspensão de seu mandato: Cunha abusava de seu poder como presidente da Câmara dos Deputados, interferia em CPI e obstava o Conselho de Ética. Nada de novo.
No mais, a decisão faz conjecturas sobre o risco de fuga, medo de testemunhas e sobre a prática de novos crimes. Entretanto, faz isso sem apresentar nenhum fato novo, com base em risco abstrato. O próprio Moro argumenta que desconhece "a total extensão das suas atividades criminais e a sua rede de influência". Isso é um problema.
Quando se permite que um juiz decida sobre a perda de liberdade de uma pessoa, antes da sentença, sem provas de que estaria obstruindo o processo, viola-se a lei. Isso é um problema mesmo sendo comum e mesmo que essa pessoa seja Eduardo Cunha.
Contra isso, a decisão diz que excepcional não é a prisão, mas a corrupção, o que permitiria a flexibilização da lei, uma versão repaginada da máxima de que os fins justificariam os meios (nas prisões preventivas, nos grampos, nos vazamentos). Nessa toada, excepcional será a Lava Jato, um vale-tudo judicial.
Eloísa Machado de Almeida, professora e coordenadora do Supremo em Pauta FGV Direito SP.