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Antigo centro de tortura vai virar memorial da ditadura

O conjunto de três edifícios que abrigou as antigas instalações do DOI-Codi, em São Paulo, foi tombado na manhã desta segunda-feira, 27, pelo Condephaat, sigla para Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo. O local é apontado por ex-presos políticos e familiares de mortos como um dos mais ativos centros de tortura do País nos anos da ditadura militar.

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Por Roldão Arruda
Atualização:

O tombamento é o primeiro e decisivo passo para a transformação do local num centro de referência cultural, que terá como foco a memória do período autoritário, entre 1964 e 1985.

Entre o nomes de vítimas torturadas e mortas ali encontram-se o do jornalista Vladimir Herzog e o do estudante de geologia Alexandre Vannuchi Leme. As autoridades negaram violências nos dois casos. Segundo a versão oficial, o estudante, que hoje dá nome ao Diretório Central da USP, teria morrido atropelado, ao tentar fugir da polícia, em 1973; e Herzog teria se enforcado na cela, em 1975.

 Foto: Estadão

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A proposta de tombamento da área, que hoje abriga uma delegacia de polícia, foi aprovada por unanimidade pelos integrantes do conselho e deve ser homologada pela Secretaria de Cultura do Estado. De agora em diante nenhuma modificação poderá ser feita nos edifícios sem a aprovação do Condephaat.

Numa próxima etapa deverá ser apresentado o projeto de criação do memorial, com a participação da Secretaria de Cultura do Estado. Quando o projeto for aprovado, o governo estadual terá que providenciar um novo local para abrigar o 36.º DP, hoje instalado no prédio principal da Rua Tutoia, 121, no Paraíso, bairro da Zona Sul de São Paulo. Os outros dois edifícios funcionam como depósitos da Polícia Civil.

DOI-Codi é a abreviação para Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna, organização que era vinculada ao Exército, com a tarefa de vigiar e reprimir a oposição ao regime. Além de militares, reunia agentes das polícias federal, militar e civil. Em São Paulo funcionava nas proximidades da sede do comando do 2.º Exército, na região do Parque Ibirapuera. No início da década de 1970 o destacamento foi comandado pelo coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, que na época era major.

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 Foto: Estadão

De acordo com estudo apresentado pela Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico aos conselheiros do Condephaat, o tombamento não se deve às características formais dos edifícios, mas por se tratar de um patrimônio que evoca a memória de um momento sombrio da história recente. Para o secretário de Estado da Cultura, Marcelo Mattos Araujo, a decisão do conselho faz parte da "consolidação da democracia em nosso País."

O pedido de tombamento estava sob análise do conselho desde 1º de junho de 2012. Foi apresentado por Ivan Seixas, ex-preso político e atual presidente Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe).

Mais tarde o pedido ganhou o reforço da Comissão Nacional da Verdade, que seguiu as comissões do Estado e do Município. O Grupo Tortura Nunca Mais, o Fórum dos Ex-Presos Políticos do Estado de São Paulo, o Núcleo Preservação da Memória Política e a Comissão de Familiares de Presos Políticos Mortos e Desaparecidos também aderiram.

"Foi uma decisão histórica", comemorou Ivan Seixas ao receber a informação. "O tombamento da seção paulista do DOI-Codi deveria servir de exemplo para outros Estados."

Ivan tinha 15 anos quando, em 1971, foi preso e levado à sede do DOI-Codi em São Paulo. Ele militava no Movimento Revolucionário Tiradentes, ao lado do pai, Joaquim Seixas, preso na mesma ocasião.

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Segundo Ivan, os dois foram torturados durante dois dias, em celas próximas. "Fomos espancados no pátio, logo que chegamos, e depois levados para as salas de tortura", disse. Seu pai não resistiu e morreu ali, num dos edifícios que acabam de ser tombados.

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