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ANÁLISE: Oposição em Mutação? Evidências do Basômetro

Ernani Carvalho*

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Por Redação
Atualização:

A imprensa livre, de uma forma geral, tem dado uma contribuição formidável para o aperfeiçoamento das instituições democráticas. Neste sentido, a ferramenta do Basômetro é uma colaboração ímpar. Ela permite ao (e)leitor avaliar, especular e controlar os partidos e seus representantes. Estaria na esteira do que Robert Dahl (Polyarchy: Participation and Opposition) chamou de uma das condições que as instituições democráticas devem oferecer para um bom funcionamento da democracia, ou seja, a "garantia de acesso a fontes alternativas de informação".

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Neste breve artigo pretendo fazer uma reflexão sobre a oposição partidária no Brasil, tomando como base os dados contidos na ferramenta em questão e, a partir deles, dividir com (e)leitor algumas ilações.

Se dividirmos o período entre governo e oposição podemos observar a priori a força avassaladora do governo. Dos 92 deputados da oposição (PPS, PSOL, DEM e PSDB) 6,52% votaram dentro de um perfil "governista" mínimo, ou seja, votaram com o governo em mais de 50% das votações. O grosso da atividade oposicionista (67,4%) se concentrou no intervalo que foi de 25-50% de apoio ao governo e, finalmente 26,09% da oposição votou abaixo dos 25%. (Figura 1)

Olhando para o outro lado da moeda, a base governista (PT, PMDB, PSB e muitos) teve 2,15% dos seus 418 deputados votando dentro de um perfil "oposicionista", ou seja, abaixo dos 50% de apoio. Em uma posição intermediária temos 8,13% dos deputados votando entre 50-75% em favor do governo. Por fim, uma esmagadora maioria (aproximadamente 90%) apoiaram a proposta do governo acima dos 75%. (Figura 2)

A rigor tanto os governistas como a oposição gravitam em torno do Executivo, o que não é novidade, manda quem pode obedece quem é deputado. Traduzindo isto para uma análise mais focada ao caso brasileiro temos que: a concentração de recursos no governo federal, o controle de agenda do orçamento pelo Presidente da República, a capacidade de editar medidas provisórias com força de lei (apesar de mitigada recentemente) e o alto grau de "pork barrel" (políticas clientelistas) são variáveis institucionais que fortalecem a proeminência governista. Ademais, outras duas variáveis de conjuntura são expressivas para a força governista: 1) o crescimento econômico e 2) o fato do partido do Presidente da República ser, com folga, o de maior capilaridade junto a sociedade civil. Todas essas variáveis institucionais e de conjuntura tiveram um efeito poderoso sobre o comportamento dos parlamentares e corrosivo para a dinâmica oposicionista. Contudo, vale a pena ressaltar que parte da literatura sobre partidos advoga que esta incapacidade não se restringe aos partidos de oposição, embora os efeitos sejam mais perversos sobre estes.

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Apesar que, se fosse possível sustentar aqui um diagnóstico, o meu seria o de que o aumento expressivo do "pork barrel", aliado a conjuntura favorável de crescimento econômico e a alta capilaridade que o PT possui em diversas instâncias da vida pública (intelectualidade, sindicatos, movimento sociais) são as variáveis determinantes para explicar uma parte significativa da incapacidade de a oposição obter respaldo e visibilidade.

Este cenário suscita algumas ilações: a incapacidade da oposição partidária tem gerado um vácuo político que, queiramos ou não, vem sendo ocupado, em boa medida, pelas mídias e pelo Judiciário.

As mídias não são apenas os grandes jornais e revistas de circulação nacional (com articulistas e colunistas pró e contra o governo), mas, também, o Facebook, o Twitter e coisas do gênero. Nessa nova modalidade, milhares de pessoas conectadas em rede produzem o tom de suas insatisfações e transformam o campo virtual em uma realidade política, a de uma oposição apartidária. Eles não seguem um líder, mas uma causa. Essa nova modalidade de mobilização social ganha força e provoca arrepios nos governistas (quem não lembra Marina Silva e sua onda verde?).

Por outro lado o Judiciário tem também se tornado um exemplo de como a apática oposição, desprovida de meios para vencer na dinâmica política tradicional, aciona a justiça para tentar reverter, postergar ou mesmo criar embaraço e aumentar o custo político da ação governista. Tais estratégias são vistas desde o Supremo Tribunal Federal até os Tribunais de Justiça ao nível sub-nacional, a denominada judicialização da política.

Logo, tendo em vista a importância crescente destes novos atores, resta saber se, no longo prazo, eles podem revigora e fortalecer os canais tradicionais de contestação pública (partidos de oposição) ou estamos a falar de uma nova forma de legitimação do espaço público.

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* Doutor em Ciência Política pela USP, Professor do Departamento de Ciência Política da UFPE e Pesquisador do CNPq

 

 
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