Se um ministro, por exemplo, não tem densidade técnica, experiência e legitimidade para falar dos problemas de sua área, se tropeça nas palavras, se tem uma visão tacanha do mundo, se está devorado pelo provincianismo, é exibicionista e se acha o rei da cocada preta, nada há para ser feito a não ser mandar o cara de volta para a escola e convencê-lo de que o ministério é muito para ele. Se um político se deixa fotografar, todo pimpão e sorridente, em situações constrangedoras, não são sessões de treinamento que irão curá-lo. O mesmo pode ser dito do deputado ou senador que tem a língua solta, seja para destilar arengas intermináveis e repetitivas só pelo prazer de ouvir a própria voz, seja para deixar "escapar" a última fofoca palaciana só para se mostrar bem informado.
Política séria é coisa para gente de têmpera especial, com boa formação e domínio das linguagens (a oral, a escrita, a cênica e performática). Falta tudo isso entre nós.
Comunicar-se bem não é algo banal. Em política, está vinculado à possibilidade de ingressar no terreno do diálogo entre governantes e governados, do debate público democrático e das lutas por hegemonia, nos espaços simbólicos que movem e orientam as pessoas. Não é coisa para técnicos, mas para políticos e cidadãos.
Não é por acaso que entre políticos e cidadãos o quadro é de incomunicabilidade: uma parte não entende a outra, não ouve a outra e não fala com a outra. A falta de qualidade discursiva é enorme, o gestual é pobre, a mensagem é repetitiva e banal.
A miséria da nossa comunicação política só faz crescer. Aparece no atual governo e em todos os anteriores, com uma ou outra exceção. Toda a nossa classe política, de qualquer credo ou vertente ideológica, de direita, centro ou esquerda, é bisonha neste quesito. É uma desgraça associada tanto às falhas da formação escolar, quanto a certas marcas da brasilidade, da cultura brasileira, com seu gosto pelo improviso, pelo coloquial, pela intimidade, pela indiferença diante do cultivo da linguagem e da língua. A situação só tem piorado, nesses tempos em que falar bem e escrever bem passaram a ser vistas como manifestação de "elitismo" ou como coisa pouco importante.
Em entrevista recente à revista Istoé, Fernando Henrique Cardoso foi direto na jugular: "Está faltando no Brasil uma voz. A política precisa de palavra, quem fale. O verbo". Ele se referia aos silêncios preocupantes do governo Temer, à falta de uma liderança que fale pelo governo e faça com que as coisas andem. Temer não tem estilo e envergadura para isso. Seus ministros, menos ainda, com o agravante de vários serem despreparados para as nobres funções que deveriam exercer. Durante os anos Dilma, passou-se algo parecido. Deu no que deu. A preocupação de FHC, portanto, faz sentido.
É um problema da política em sentido estrito (do sistema), mas não só. Reapresenta-se na política em sentido ampliado (na polis). Ouçamos a voz das ruas ou dos movimentos. Invariavelmente tosca, sem vocação hegemônica, sem pegada cultural, sem uma "filosofia" consistente. Nas redes, a tragédia argumentativa é completa, aumentada pela intolerância e pela dificuldade de assimilar e respeitar os argumentos alheios. A sociedade civil, que muitos entendem ser a referência democrática principal, fala muito, mas fala mal: conjuga precariamente o verbo e não passa mensagens que mobilizem e eduquem a cidadania.
O problema se repete até mesmo onde deveria jamais aparecer: nas escolas e universidades, da graduação ao doutoramento. Em suma, se a comunicação acadêmica e científica, assim como a linguagem miserável que senta em nossas salas de aula, têm livre curso entre nós, é porque a situação chegou a um ponto delicadíssimo.