Causa espanto a dificuldade que os partidos da chamada terceira via têm de atuar com racionalidade política. Há esforços para transformar em lei o compromisso assumido, meses atrás, para encontrar um critério que unifique esses partidos em torno de um só candidato à Presidência. Mas nada sai do lugar. Chegou-se mesmo a encomendar uma pesquisa qualitativa para avaliar os índices de aprovação e rejeição dos dois nomes que disputam a posição: Simone Tebet (MDB) e João Doria (PSDB). A pesquisa deve ser divulgada hoje, mas não há nenhuma garantia de que seus resultados serão respeitados.
Isso porque o desentendimento é geral na área. O PSDB se estilhaça em uma luta interna que não parece ter fim. Dória, seu pré-candidato, não conseguiu aceitar que uma coisa é ser aprovado pelo PSDB, outra coisa, bem diferente, é ser escolhido candidato unitário de uma frente democrática de centro, juntamente com o MDB e o Cidadania. Há tucanos que alegam que Dória está correto em ameaçar judicializar a questão, caso não seja o escolhido. O que, em poucas palavras, significa dizer que sairá candidato de qualquer maneira, seja qual for a decisão dos demais partidos.
Se Simone Tebet fizer o mesmo e o Cidadania ficar pendurado na corda, a frente democrática de centro morrerá na praia, confirmando o vaticínio de vários políticos, que não a veem como possível e acreditam que a disputa eleitoral de outubro será mesmo entre Lula e Bolsonaro, num segundo turno antecipado. Esse amontoado de pessoas que pensam assim poderá derivar tanto para engordar os votos de Lula quanto para inchar o balaio de Bolsonaro. Ou seja, temos aí uma variável fora de controle.
Com um fraseado menos elegante, pode-se dizer que a situação mostra que há doses elevadas de burrice política no terreno da terceira via. É uma burrice misturada com cegueira e arrogância personalista. A mesma, aliás, que promoveu a vitória de Bolsonaro em 2018. E que não é exclusividade do centro democrático. No universo petista, por exemplo, há manifestações semelhantes, desferidas pelos ataques das alas "esquerdistas" aos partidos de centro e à tentativa que fazem de escolher um candidato unitário. Batem-se cabeças onde deveria haver apertos de mãos.
A burrice política não prejudica Bolsonaro, que não faz política com primeiras intenções, mas sempre com segundas ou terceiras, com os olhos mais nos amigos e familiares do que no bem comum, mais interessado em agregar os extremistas de direita em torno de bandeiras estapafúrdias do que em governar o País. Quanto mais o centro democrático e a esquerda demorarem para se entender - em torno sobretudo de um padrão elevado de campanha política e de um programa mínimo para governar --, mais trunfos encherão a caixinha bolsonarista.
Nessa toada, dá bem para imaginar com chegaremos às urnas de outubro e, sobretudo, ao início do próximo governo.