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Professor titular de Teoria Política da Unesp, Marco Aurélio Nogueira escreve mensalmente na seção Espaço Aberto

Opinião|"A História Vivida": livro de entrevistas revisita Brasil moderno

É um livro para ser lido com calma. Cada capítulo nos projeta para um tempo histórico denso, repleto de acontecimentos que forjaram o Brasil que conhecemos. São tempos já dantes navegados, sobre os quais pesam inúmeras versões e interpretações. Por suas 1500 páginas, passam alguns dos mais importantes políticos, intelectuais e líderes brasileiros, um panteão de 57 "heróis" do Estado nacional, de Prudente de Morais, neto a Miguel Arraes, de Nelson Rodrigues, Tristão de Athayde e Mario Schemberg a Orlando Villas Boas, Darcy Ribeiro e Pierre Monbeig, de Oscar Niemeyer a Celso Furtado, Lívio Xavier, Teixeira Lott e Jorge Amado.

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Atualização:
 Foto: Estadão

Amostra preciosa de um conjunto de brasileiros que desempenharam papel de relevo nas épocas em que viveram e atuaram. Reunidos como entrevistados, permitem que se veja a história com novas lentes.

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A façanha se deve ao jornalista Lourenço Dantas Mota, que coordenou a obra, ampliando-a na segunda edição, feita pela Topbooks em 2014. A ideia inicial, apresentada em 1977 a Júlio de Mesquita Neto, então diretor de O Estado de S. Paulo, foi realizada ao longo de 3 anos de trabalho. As entrevistas foram então publicadas pelo jornal, sob a rubrica "Documento", entre 25 de dezembro de 1977 e 6 de janeiro de 1985. Um plano executado com rigor, de modo a valorizar o significado profundo e as características particulares de cada entrevistado. O coordenador ofereceu um roteiro básico e convidou outros intelectuais para atuarem como entrevistadores, o que garantiu espontaneidade, pluralidade e dinamismo a cada conversa. Os entrevistados foram incitados a explicar seus atos e comportamentos, sem se limitarem a narrar a participação que tiveram nos acontecimentos. Não tiveram sossego.

Projetos desse tipo têm valor inestimável. Resgatam fatos e interpretações, analisam a história pelo processo duro e pela palavra dos atores, pelo que foi e pelo que disseram ter sido. Oferecem material para que novas pesquisas ganhem corpo, revisões possam crescer, conclusões tenham como ser relativizadas. O lugar dos personagens na história, suas ideias, os vínculos que estabeleceram com os ambientes políticos e intelectuais em estiveram inseridos, sua biografia e formação, tudo é articulado tendo como pano de fundo o evolver histórico, com sua sinuosidade e suas armadilhas. O título do livro não poderia ter tido melhor escolha: ele nos apresenta mesmo a História "vivida".

Ganham os leitores, desde aqueles que se dedicam a pesquisar a história das ideias e o pensamento político-social, até os que se preocupam em entender melhor o país em que vivem. Cada leitor mergulha nas páginas do livro como se estivesse revisitando épocas preteridas e delas participando, e ao fazer isso vai incorporando novas visões, ponderando suas próprias interpretações, sendo convidado a rever o lugar que imaginava estar atribuído a certos personagens.

Fazer com que falem os que foram de algum modo atores e espectadores estratégicos da história: essa a tarefa empreendida por Lourenço Dantas Mota e seu qualificado time de entrevistadores. Criar condições para que, com inteira liberdade, um seleto grupo de personalidades expusesse suas opiniões pessoais, suas idiossincrasias, sua narrativa dos fatos que viram e vivenciaram.

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Ao final da viagem, o leitor já não será mais o mesmo. Entrará novamente em contato com o Brasil moderno, que o livro reapresenta sem fechar as portas para novas leituras e interpretações mas, antes, estimulando-as. Compreenderá melhor a história mediante uma sucessão de diálogos enriquecedores, que farão com que se sinta parte e entenda melhor quem tomou parte.

Opinião por Marco Aurélio Nogueira

Professor titular de Teoria Política da Unesp

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