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A Ciência Política e um olhar sobre os Legislativos

Uma reforma melhor que a encomenda

É comum dizermos que o Legislativo não possui incentivos para mudar as regras eleitorais e contrariar os próprios interesses, para produzir a tal "reforma política"; afinal de contas, quem mudaria as regras usadas para sua própria eleição? A velha lógica do "em time que está ganhando, não se mexe".

Por Vítor Oliveira
Atualização:

Paradoxalmente, a promulgação da Emenda Constitucional 97/2017 nesta 4ª feira (04/10) mexe sensivelmente com o interesse dos mesmos políticos que a aprovaram, ainda que de forma progressiva, gradual. Ainda assim, há muita gente que diga ter sido pouco. Será?

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No Brasil, há muita incerteza sobre o resultado das eleições proporcionais - aquelas em que elegemos deputados federais, estaduais e vereadores. Em média, um deputado tem a mesma chance de se reeleger que a de vencer no cara ou coroa, o que deveria levantar suspeitas quanto à preferência dos parlamentares pelas regras vigentes.

Não obstante, mesmo sem garantir a sobrevida de deputados, as regras atuais já são conhecidas pelos candidatos. As alternativas, por outro lado, podem ter efeitos inesperados e a aversão ao risco acaba por ser mais forte que o desejo de mudanças profundas.

Ao mesmo tempo, poucas medidas possuem tanto apoio entre cientistas políticos quanto o fim das coligações em eleições proporcionais. O fim dessa estratégia eleitoral tem o potencial de melhorar a visibilidade do voto proporcional, fazendo com que eleitores visualizem o destino de sua escolha partidária mais facilmente.

O fim das coligações significa que, de 2020 em diante, os votos dados em candidatos do "Partido Fulano" só serão contabilizados para a votação deste mesmo partido. Hoje em dia, se esta legenda estiver coligada ao "Partido Beltrano", os votos dos candidatos de ambos são somados.

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Esta reforma aponta para uma abordagem diferente, que pode ser melhor sucedida no longo prazo, em que pese ser menos perceptível como importante: a melhoria incremental, com espaço para avanços e reavaliações no meio do caminho, reduzindo a aversão da elite política às mudanças, que se tornam mais fáceis de acomodar no atual arranjo partidário. Ao alargar o horizonte, a reforma incremental deixa de ser um refém das necessidade de curto prazo.

Já em 2018, teremos uma cláusula de desempenho que exige ao menos 1,5% dos votos válidos nacionalmente aos partidos para a obtenção de recursos como tempo de TV e fundo partidário. Não apenas isto, mas também que esses votos sejam obtidos em ao menos 9 estados, evitando que partidos concentrem seus esforços em apenas uma região do País. Essa exigência crescerá ao longo do tempo, chegando a 2,5% em 2026.

Não é uma solução ideal do ponto de vista de muita gente, mas pode ser um jeito menos traumático de lidar com a principal das consequências negativas das virtudes do nosso atual sistema: a fragmentação partidária.

Isso não exclui a discussão sobre o Financiamento Eleitoral, da baixa representatividade do território e de minorias, podendo inclusive separar os debates da reforma política, todos embolados em um mesmo novelo, jogando luz sobre estes fatores de modo individual.

Juntos, o fim das coligações e a cláusula de desempenho podem reduzir o incentivo ao balcão pré-eleitoral, montado para garantir tempo de televisão nas eleições majoritárias aos partidos cabeça-de-chapa. Nada contra a formação de coalizões, mas será que não haveria mais liberdade para a montagem de governos com afinidade ideológica, em bases mais republicanas, se as coalizões também fossem menos dependentes dessa barganha eleitoral? Esperamos agora pelos dados e resultados que aparecerão nos próximos anos, mas meu palpite é que eles serão melhores que o esperado.

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