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A Ciência Política e um olhar sobre os Legislativos

Qual o papel do PSL no governo Bolsonaro?

*Escrito em parceria com Vitor Vasquez, doutorando em Ciência Política (UNICAMP) e Visiting Scholar na Universidade da Califórnia - San Diego.

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Por Vítor Sandes
Atualização:

O presidencialismo de coalizão brasileiro tem funcionado a partir de apoios construídos em bases partidárias. Quando um presidente falha em conduzir a formação e a manutenção de uma coalizão de governo sólida, seu governo tende a sofrer derrotas no Legislativo. Isso ocorre devido à forma como a Câmara dos Deputados no Brasil organiza seus trabalhos, com forte centralidade das lideranças partidárias.

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Na coordenação das votações em medidas do interesse do governo, o Executivo costuma negociar com as lideranças e estas, por sua vez, tentam construir posicionamentos coletivos com suas bancadas. Quando uma medida não tem chance de ser aprovada, na maioria das vezes, ela sequer é colocada em votação no plenário, como ocorreu recentemente com a proposta de Reforma da Previdência.

Para aprovar sua agenda de governo, os presidentes brasileiros negociam com os partidos, via distribuição de ministérios, a formação de uma coalizão majoritária, ou seja, que garante o apoio de mais de 50% dos deputados federais. O novo governo que está sendo gestado por Jair Bolsonaro, no entanto, tem apontado para um modelo diferente de formação de governo, prezando por indicações para as pastas que não têm passado, necessariamente, pelo apoio dos partidos da próxima legislatura eleita. Como afirmou Vitor Oliveira, semana passada, em publicação neste blog, "nada garante um alinhamento automático da base conservadora e dos novos deputados à reforma da previdência, à política de reajustes de combustíveis diária da Petrobras e à privatização das estatais", que são propostas definidas por sua equipe econômica.

Contudo, para poder governar e, por exemplo, aprovar as medidas econômicas que defendeu, o presidente precisará contar com o apoio dos partidos, incluindo do seu próprio, o PSL, que elegeu a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados. Para ter este apoio, ao PSL será necessário atuar de forma unificada, isto é, o partido deverá discutir internamente suas decisões e, uma vez que elas forem tomadas, a maioria de seus membros precisará acatá-las. Isto demandará do partido organização interna e liderança e, quanto mais homogêneo forem seus membros, menos dificuldade o partido terá de se articular desta maneira. Mas quão homogênea é a bancada eleita para deputado federal pelo PSL? Para responder a isto, precisamos descrever minimamente o perfil dos membros desta bancada, e é o que faremos a seguir.

Nosso primeiro passo foi verificar a origem partidária dos 52 deputados federais eleitos pelo PSL. Neste aspecto, o perfil deles tem uma homogeneidade, pois boa parte daqueles que estava em outro partido era filiada a partidos de direita. Os principais fornecedores para a base do PSL foram o PSC, de onde migraram seis políticos, e o PP e o PR, cada um fornecendo três. Como pode ser observado na tabela que segue, 22 deputados da legenda vieram de outros partidos, ou seja, 42% da bancada.

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*Origem dos deputados federais eleitos pelo PSL em 2018

Partido de origem

Deputados federais eleitos pelo PSL

PSL

30

PSC

6

PP

3

PR

3

PSDC

2

PV

1

PSD

1
SD

1

PMN

1

DEM

1

MDB

1

PHS

1
PRB

1

Total

52

 

Deve-se destacar que, entre os 30 eleitos pelo PSL, somente um, Luciano Bivar, tem sua vida dedicada à política. Isto é, de todos os 30 puros-sangues, 29 disputaram sua primeira eleição em 2018. É válido mencionar, conforme já destacou Joyce Luz em publicação neste blog, na semana passada, que a maioria dos parlamentares inexperientes são oriundos justamente do PSL.

Outro aspecto que analisamos foi o perfil profissional dos deputados federais do partido de Bolsonaro. Salta aos olhos que 21 dos eleitos pelo PSL, 40% da bancada, têm vínculo com segurança, seja pelas forças armadas, polícias rodoviária, civil, militar e federal. Além disso, outros 13 são empresários e mais seis têm a carreira vinculada ao direito. Novamente, há uma certa homogeneidade no partido, mas que ajudaria em termos de unidade somente ao tema de segurança pública. Afinal, temas como a privatização podem ser controversos entre funcionários públicos de carreira, caso de todos os membros das áreas de segurança. De forma análoga, isto se estende a outros assuntos. Exemplo disso é a reforma da previdência. Dentre os deputados eleitos, dois deles já foram presidentes dos sindicatos de suas categorias, sendo que um deles, Sanderson Federal, já se manifestou contrário à atual proposta.

Em suma, se por um lado o partido conta com certa homogeneidade na temática da segurança pública e na origem em partidos de direita, por outro, existe dúvida sobre a unidade da bancada em outras temáticas que fatalmente compõem a agenda defendida pelo presidente eleito. Isto poderia ser sanado via estruturação e liderança partidária. Entretanto, o PSL parece carecer também destas características. Afinal, 56% de sua base nunca havia se candidatado antes e são esses os políticos puros-sangues do partido. Dos migrantes, somente seis possuem experiência como deputado federal, sendo este o cargo máximo ocupado por qualquer membro da bancada do partido de Bolsonaro.

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Embora haja possibilidade de unidade, o PSL certamente enfrentará dificuldades para se articular como partido internamente coerente, principalmente por debilidade em encontrar possíveis lideranças para a sua bancada que, de fato, consigam coordenar internamente o apoio do partido às propostas de caráter econômico do novo governo. Para que o governo aprove as medidas que defendeu, Bolsonaro precisará ajudar a coordenar o apoio do seu partido, criando incentivos concretos para os deputados federais da sua sigla que não seja somente a simples fidelidade pessoal ao presidente. O fato de ser do mesmo partido não implica em apoio automático. É preciso também criar as condições de governabilidade junto com seu partido e as evidências apresentadas sugerem fortes desafios para isso.

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