Reportagem recente do universo Globo deu conta de apontar que nos últimos 20 anos cerca de 60% das leis aprovadas no parlamento paulistano são homenagens e nomes de rua. Isso não representa qualquer novidade para as pessoas em geral, apenas ilustra um fenômeno, algo que o jornalismo tem por função fazer, e faz muito bem. O Movimento Voto Consciente aponta isso faz anos, e mostra também que a Câmara tem tentado ser mais ágil nesse tipo de solução.
Esses dados são utilizados para indicar que uma casa que custa mais de meio bilhão para os cofres da cidade seria inútil. Opa! Muita calma. E os outros 40% de proposições e decisões? Trabalhei por quase dois anos na Câmara paulistana, presidindo sua escola do parlamento, e posso afirmar: aquilo é um barril de pólvora que concentra interesses absolutamente diversos e concentra manifestações semanais das mais legítimas. Assim: uma coisa é o exagero nas homenagens e denominações, a outra é dizer que um parlamento não serve para nada - como alguns críticos que ocupam espaço nos meios de comunicação gostam de fazer sem qualquer responsabilidade com o assunto. Esse segundo capítulo, se faz parte de alguma narrativa, que o autor volte para a escola. Ou melhor, que estude um pouco de política e democracia por conta, pois muitas de nossas escolas estão preocupadas em evitar a política como tema educativo. O resultado está aí, facilmente ao alcance de nossos olhos.
Não pode ser verdade que denominar ruas seja algo inútil. Ter um endereço é sinônimo de dignidade. Dar o nome de uma rua num cadastro, e o número de uma casa, conecta o cidadão a direitos essenciais. Nominar rua é incluir em certa medida. Já estive no campo dos radicais contrários a tal ação, mas sempre tive endereço: Bela Cintra, Maranhão, Conselheiro Brotero, Mário Ferraz etc. Fácil apontar o dedo morando nos melhores endereços de São Paulo. Vamos com calma. Vamos olhar o outro.
A crítica, assim, deve passar pelo modo de denominar. Aqui está o principal ponto. Não deveria, sequer poderia, caber a um vereador, e ao plenário de uma casa de leis, determinações desse tipo. O problema está aqui. A Câmara seria extremamente produtiva e democrática se aprovasse uma lei em que determinasse o fluxo de funcionamento desse tipo de decisão. Pese o seguinte: um estado, uma cidade para mudar de nome precisa ouvir a população em plebiscito. Foi assim com Embu, que em 2011 passou a ser oficialmente chamada de Embu das Artes porque 67% dos cidadãos dali assim o quiseram. Foram eles quem votaram e decidiram, e a Constituição Federal exige que seja assim.
E por que não podemos fazer dessa forma com o nome das ruas? Criemos um processo com começo, meio e fim. Moradores organizados de alguma rua que ainda não tem nome procuram a subprefeitura, dão entrada num processo de definição de nome do logradouro, ofertam opções de mudança e votam. O vereador pode até ajudar por meio de seu gabinete e assessoria. Isso aproximaria o cidadão do poder público, daria alternativa, criaria envolvimento. Existem limites que precisam ser respeitados, como por exemplo aquele de determinados bairros terem um padrão de nomes. Higienópolis, por exemplo, trabalha com nomes de estados. Não há problema algum. Se lá existisse uma rua sem nome, ela ganharia a homenagem condizente com alguma unidade da federação. A questão aqui é pensar se os vereadores estariam dispostos a ver a sociedade protagonizando o que representou, apenas nessa legislatura, mais de 75% do que foi aprovado na Câmara. E aqui está o ponto: isso só vai ocorrer se ao invés de nos assustarmos com os números a cada ano formos capazes de passar a detectar o problema e propor uma solução.