Fotos: André Dusek/AE, Divulgação e Celso Junior/AE
O episódio da quebra de sigilo do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge, é um dos casos mais graves registrados no contexto político brasileiro.
A saída da Receita Federal chega a ser ofensiva ao contribuinte: por ela, o delito de inspiração eleitoral terá, - se tiver -, punição pós-eleitoral.
Em Quincas Borba, o escritor Machado de Assis advertiu: "O maior pecado, depois do pecado, é a publicação do pecado".
A frase cabe inteira no ocorrido na Receita Federal, com relação ao vazamento do sigilo fiscal do ex-ministro e vice-presidente nacional do PSDB, Eduardo Jorge.
Não contente em violar seu sigilo, os funcionários da Receita - que o secretário Otacílio Cartaxo disse serem vários, nenhum lotado em Brasília - fizeram-no chegar a profissionais a serviço da campanha do PT, empenhados na elaboração de um dossiê. O segundo pecado, portanto.
O terceiro é a sonegação ao nome dos infratores, que o secretário disse saber quais são e onde estão, beneficiários de um sigilo não devido a quem delinque e negado a um contribuinte, que no ato personifica todos os outros.
Quem está em pauta no episódio não é o vice-presidente do PSDB, mas todos os cidadãos-contribuintes, expostos à contaminação de um sistema, que, além de não resguardá-lo, como manda a lei, ainda protege os seus agentes infratores.
Outro agravante: se o crime teve objetivo eleitoral - integrar um dossiê contra uma das candidaturas (no caso, a de José Serra), por que remeter o enquadramento, sobretudo quando já se sabe quem são os responsáveis, para depois da eleição?
Uma segunda leitura do depoimento do secretário da Receita aos senadores revela um intrigante aspecto auto-defensivo. Ele poderia ter simplesmente dito que o caso estava sob investigação e que o prazo para solucioná-lo é de 120 dias.
Não seria satisfatório, mas soaria como uma defesa burocrática.
Mas ele surpreendeu: já havia admitido antes, em nota, o crime, no âmbito da Receita. Aos senadores, foi mais longe: disse saber quem, quando, onde (só não disse por quê, talvez por não ser necessário) o crime foi cometido.
E garantiu não ter sido por gente de Brasília, deixando no ar a suspeita de ter sido de São Paulo.
Talvez por temer o papel de bode expiatório, o secretário, que é um técnico - não um militante partidário -, funcionário de carreira, tratou de se situar fora do círculo de suspeitas, na base do "me inclua fora disso".
O que disse é suficiente para deixar o governo e seu partido em imenso desconforto, atenuado até aqui pela espantosa passividade das lideranças oposicionistas diante do escândalo.
O vazamento é mais grave que o do caseiro Francenildo, que resultou na demissão do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e do presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso - porque tem o objetivo, nada irrelevante, de intervir na lisura do processo eleitoral.