Melhor seria se manifestações anteriores do presidente não tirassem a credibilidade do que disse ontem, quando condenou a punição ao mensageiro e não ao autor da mensagem.
À época da censura ao Estado, não se ouviram senão impropérios de Lula contra a imprensa
O mesmo raciocínio Lula não fez quando saiu a campo para atacar a imprensa em defesa do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), por quem, também ontem, disse ter profunda admiração e deveres de gratidão.
Nada contra as preferências pessoais do presidente. Mas quando a censura se abateu sobre o jornal O Estado de São Paulo, por divulgar fatos apurados pela Polícia Federal em relação ao empresário Fernando Sarney, não se ouviram senão impropérios de Lula contra a imprensa.
O jornal publicou informações do mais absoluto interesse público, envolvendo tráfico de influência do empresário, nepotismo e negociações suspeitas com o governo, sempre escorado no prestígio e poder do pai.
Mas Lula, à época, culpou o mensageiro e não o autor das irregularidades denunciadas pela imprensa. Assim como considerou as denúncias contra a ex-ministra Erenice Guerra armação da imprensa golpista. Da mesma forma como no mensalão.
Não obstante, demitiu Erenice. E o Supremo Tribunal Federal, com maioria de juízes nomeada pelo seu governo, acatou a denúncia do Ministério Público e registrou 40 réus até hoje à espera de julgamento.
No caso atual, o presidente corroborou o pensamento de jornalistas e de juristas, pelo qual o guardião do sigilo - seja ele judicial ou de Estado - não é o jornalista, mas a instituição ou autoridade que o tem sob sua responsabilidade.
O que o WikiLeaks faz é franquear seu espaço para anônimos que têm posse de documentos sigilosos, ou acesso a eles, para que o divulguem anonimamente, sem qualquer esforço jornalístico do site.
Alimenta-se, pois, das indiscrições dos guardiões dessa documentação que, por conveniência política ou pessoal, querem vê-la divulgada desde que não sejam identificados.
Ao defender o site e condenar a prisão do jornalista, Lula vai muito além do que o faria se emitisse a mesma opinião com relação à censura imposta pela família Sarney à imprensa.
O site de Assange ainda carrega uma polêmica por divulgar informações que, teoricamente, podem interferir na segurança do Estado, enquanto no caso Fernando Sarney o sigilo conspira contra os interesses do Estado.
Ainda assim o problema não é de Assange, mas do Estado que não contém o vazamento.
Dessa contradição de Lula se pode concluir que a liberdade de imprensa é boa quando longe de seu quintal, quando serve ao seu estilo irônico sem possibilidade de réplica.
Mas poderia ter lido as críticas à perseguição contra Assange, que julgou inexistentes, se lesse jornais, como repete orgulhosamente que não faz.