Foto do(a) blog

Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Um Balanço da Covid-19 no Brasil e no Mundo

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Alexandre Ricardo Pereira Schuler, Engenheiro Químico com Mestrado na UFRJ e Doutorado na UFPE, Professor Aposentado da UFPE, foi Diretor do Centro de Tecnologia e Geociências da UFPE.

PUBLICIDADE

Antônio Sérgio Araújo Fernandes, Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) com Pós Doutoramento em Administração Pública pela Universidade do Texas em Austin, é Professor do NPGA/EA-UFBA.

 

O Brasil chegou a marca de pouco mais de 100.000 óbitos, vítimas da COVID-19, entre o último fim de semana e o início desta semana. Um dos principais aspectos que determinou este quadro dramático no país se deve, como sempre observamos, pela ocorrência de uma dissonância entre o Governo Federal na figura do Presidente - que foi indiferente ao problema da COVID-19 desde o início da pandemia; e a ampla maioria dos Governos Estaduais e Municipais - que procuraram agir responsavelmente de acordo com os protocolos da Organização Mundial de Saúde (OMS). Isso já foi por demais discutido no espaço deste blog em outros artigos, por nós e outros colegas. Além disso, há um fato adicional, dado que na era das redes sociais, não faltaram "celebridades", "celebridades políticas", políticos, e até profissionais da saúde discordantes dos protocolos da Organização Mundial da Saúde (OMS) a fazer, no início da pandemia, as mais absurdas previsões sobre os números da COVID-19 como se fossem experts. Mais ainda, temos observado também muitos comentários a respeito da letalidade da COVID-19 no Brasil, quando comparada com outros países. Neste artigo apresentaremos os dados acerca de letalidade e mortalidade informados pela OMS em seu site (https://covid19.who.int/table), atualizados em 10 de agosto de 2020.

 

Publicidade

Cabe primeiramente para melhor entendimento, destacar a diferença entre as duas metodologias para calcular a probabilidade de uma doença infecciosa causar uma fatalidade:

Taxa de letalidade (case fatality rate) - medida que se refere à proporção de mortes em relação aos casos diagnosticados.

Taxa de mortalidade (infection fatality rate) - medida que se refere à proporção de mortes em relação a todos os casos de pessoas infectadas (diagnosticadas ou não).

 

Inicialmente foi realizada a coleta de dados (acumulado de casos e de óbitos) por país, mas apenas dos 98 países com mais de 1 milhão de habitantes, desde a China, com 1.402.509.320 habitantes até Djibuti, com 1.078.373 habitantes. Esses dados foram registrados numa planilha, que calculou, para todos os 98 países, a letalidade (óbitos por 100 casos), a incidência (casos por 100 mil habitantes) e a mortalidade (óbitos por 100 mil habitantes). Concluída a planilha, a mesma foi ordenada das seguintes formas: população, casos, óbitos, letalidade, incidência e mortalidade. Em seguida foram selecionados apenas os países com mais de 100 milhões de habitantes. Os Quadros 1, 2, 3, 4, 5 e 6 correspondem, respectivamente, aos dados de: população, casos, óbitos, letalidade, incidência e mortalidade.

 

Quadro 1 - Países com mais de 100 milhões de habitantes.

Publicidade

País Continente (*) População
China Ásia 1.402.509.320
Índia Ásia 1.361.865.555
Estados Unidos América 329.634.908
Indonésia Ásia 266.911.900
Paquistão Mediterrâneo Leste 220.892.311
Brasil América 211.482.342
Bangladesh Ásia 168.557.578
Rússia Europa 146.745.098
México América 126.577.691
Japão Ásia 125.950.000
Filipinas Ásia 108.584.658
Egito Mediterrâneo Leste 100.336.647

(*) Classificação da OMS.

 

Quadro 2 - Países com mais casos de Covid-19.

País Continente Casos
Estados Unidos América 4.951.851
Brasil América 3.012.412
Índia Ásia 2.215.074
Rússia Europa 887.536
África do Sul África 553.188
México América 475.902
Peru América 471.012
Colômbia América 376.870
Chile América 373.056
Irã Mediterrâneo Leste 326.712
Espanha Europa 314.362
Reino Unido Europa 309.767

 

Quadro 3 - Países com mais óbitos por Covid-19.

Publicidade

País Continente Óbitos
Estados Unidos América 160.989
Brasil América 100.477
México América 52.006
Reino Unido Europa 46.566
Índia Ásia 44.386
Itália Europa 35.203
França Europa 30.201
Espanha Europa 28.503
Peru América 20.844
Irã Mediterrâneo Leste 18.427
Rússia Europa 14.931
Colômbia América 12.540

 

Quadro 4 - Países com maior letalidade da Covid-19.

País Continente Letalidade
França Europa 16,29
Reino Unido Europa 15,03
Itália Europa 14,08
Bélgica Europa 13,46
Hungria Europa 12,94
México América 10,93
Holanda Europa 10,62
Espanha Europa 9,07
Canadá América 7,53
Suécia Europa 7,00
Irlanda Europa 6,65
Sudão Mediterrâneo Leste 6,53

(*) O Brasil é o 34o, os Estados Unidos o 39o e a Argentina o 64o.

 

 

Quadro 5 - Países com maior incidência da Covid-19.

Publicidade

País Continente Incidência
Catar Mediterrâneo Leste 4111,23
Bahrain Mediterrâneo Leste 2851,75
Chile América 1952,44
Oman Mediterrâneo Leste 1748,92
Panamá América 1745,78
Kuwait Mediterrâneo Leste 1622,43
Estados Unidos América 1502,22
Peru América 1465,89
Brasil América 1424,43
Armênia Europa 1366,36
Moldávia Europa 1023,33
Singapura Mediterrâneo Leste 966,13

 

Quadro 6 - Países com maior mortalidade da Covid-19.

País Continente Mortalidade
Bélgica Europa 85,64
Reino Unido Europa 70,09
Peru América 64,87
Espanha Europa 60,52
Itália Europa 58,44
Suécia Europa 55,74
Chile América 52,74
Estados Unidos América 48,84
Brasil América 47,51
França Europa 45,03
México América 41,09
Panamá América 38,14

 

Os Quadros 2 e 3 mostram que os casos confirmados e os óbitos resultantes da COVID-19 se concentram mais no continente americano, com 67,7% dos casos e 61,4%. De acordo com o Quadro 4, a Europa lidera com folga em letalidade, contribuindo com 80,8%, enquanto que Estados Unidos e Brasil, apesar do elevado número de casos, ocupam a 34a e a 39a posições, respectivamente. A Argentina está na 64a posição. Os países do Mediterrâneo Leste apresentam a maior incidência de casos (47,4%), seguidos dos americanos (37,1%), conforme se vê no Quadro 5. Finalmente, no Quadro 6 se vê que os óbitos estão concentrados na Europa (56,2%) e no continente americano (43,8%).

 

Em síntese, dentre os 12 países mais populosos do mundo, apenas cinco estiveram entre os doze ranqueados nos Quadros 2 a 6, conforme se resume no Quadro 7. As Américas lideram, seguidas da Índia.

Publicidade

 

 

Quadro 7 - Posição dos países em cada um dos cinco parâmetros.

País Casos        Óbitos Letalidade (*) Incidência Mortalidade
Estados Unidos 1o 1o Acima de 12o 7o 8o
Brasil 2o 2o Acima de 12o 9o 9o
México 6o 3o 6o Acima de 12o 11o
Índia 3o 5o Acima de 12o Acima de 12o Acima de 12o
Rússia 11o Acima de 12o Acima de 12o Acima de 12o Acima de 12o

*número dos mortos para cada 100 confirmados com a doença

 

Em algum momento logo no início da pandemia no Brasil, foi divulgada uma comparação entre quatro países europeus (Bélgica, França, Itália e Reino Unido), cuja soma das populações (205.273.526) é praticamente igual à do Brasil (211.482.342). Na ocasião mostrou-se que a situação da Covid-19 no Brasil era melhor do que naquele conjunto de países. Hoje tornamos a realizar essa comparação (Quadro 8) e verificamos que o Brasil lidera com folga em número de casos (quase 4 vezes mais), embora tenha um pouco menos de óbitos (82%), o que se reflete em sua menor letalidade (23%). A incidência quase quatro vezes maior, entretanto, mostra que a difusão da pandemia no Brasil está sendo bem maior do que nos outros países, levando-nos à conclusão de que não tivemos a mesma eficiência na retenção da pandemia.

 

Quadro 8 - Comparação entre o Brasil e quatro países europeus com mesma área territorial.

Publicidade

País Casos Óbitos Letalidade (*) População Incidência Mortalidade
Bélgica 73.308 9.870 13,46 11.524.454 636,11 85,64
França 185.353 30.201 16,29 67.075.000 276,34 45,03
Itália 250.103 35.203 14,08 60.238.522 415,19 58,44
Reino Unido 309.767 46.566 15,03 66.435.550 466,27 70,09
Grupo 818.531 121.840 14,7 205.273.526 398,75 59,35
Brasil 3.012.412 100.477 3,34 211.482.342 1424,43 47,51
Razão Grupo/BR: 0,27 1,21 4,41 0,97 0,28 1,25

*número dos mortos para cada 100 confirmados com a doença

 

Outra alegação também no início da pandemia foi a de que a situação na Argentina seria pior do que a do Brasil. Como já naquela época o número de casos no Brasil era maior, muitas autoridades diziam que deveríamos considerar os casos em relação ao tamanho da população (a incidência), que é o mais correto, de fato. Isso nos motivou a realizar essa comparação. No Quadro 9 é apresentada a comparação entre Brasil e Argentina, bem como com os Estados Unidos. Observamos que o número de casos e de óbitos é bem menor na Argentina. Mas como a população da Argentina também é bem menor do que a do Brasil, devemos olhar para os números relativos (incidência e mortalidade). A incidência no Brasil é 2,65 vezes maior do que na Argentina, enquanto que a mortalidade é 4,69 vezes maior. Para completar, a letalidade no Brasil é quase o dobro (77% maior) do que a da Argentina. Ao comparar o Brasil com os Estados Unidos, vemos que a incidência e mortalidade são praticamente iguais (ambas as taxas são ligeiramente maiores nos Estados Unidos). O mesmo podemos dizer em relação à letalidade: quase iguais, embora um pouco menor no Estados Unidos.

 

Quadro 9 - Comparação entre Brasil, Argentina e Estados Unidos

País Casos Óbitos Letalidade (*) População Incidência Mortalidade
Estados Unidos 4.951.851 160.989 3,25 329.634.908 1502,22 48,84
Brasil 3.012.412 100.477 3,34 211.482.342 1424,43 47,51
Argentina 241.811 4.556 1,88 44.938.712 538,09 10,14

Publicidade

*número dos mortos para cada 100 confirmados com a doença

 

Dois pontos a notar aqui, a África é o continente que menos sofre com a pandemia, com exceção da África do Sul, o que demonstra que o vírus se difunde em adensamentos urbanos populosos.  Por outro lado, a Europa e os Estados Unidos, por serem as áreas com muito adensamento urbano, são os continentes mais atingidos pela pandemia. Os Estados Unidos, ainda tem um problema similar ao brasileiro de negação das autoridades federais, com destaque ao Presidente Trump. Uma exceção a todo o quadro dramático do Ocidente desenvolvido, foi a Alemanha. Ali o Governo mostrou um grau estratégia ao planejar medidas enquanto a pandemia ainda estava transitando continentalmente da China para o Ocidente. Ao mesmo tempo foi insistente nas medidas de testagem massiva da população, o que proporcionou a adoção mais precisa de medidas de isolamento social.

E o Brasil com todos os problemas de coordenação federativa e falta de apoio do Governo Federal, reforçada na figura do Presidente, tem apenas como agentes de combate à COVID-19, os Governos Estaduais e Municipais, que de modo responsável, contando com a força e heroísmo dos profissionais de saúde (muitos vitimados também nestes mais de 100.000 óbitos) conseguem manter uma mortalidade de 47,51% e uma letalidade de 3,34. Esse número, diante da circunstância política atual que nos assombra, ressalta a importância que o Sistema Único de Saúde (SUS) tem no combate à COVID-19. E isso mesmo com o amplo corte de recursos do Governo Federal para a saúde ao longo dos últimos 2 anos, e com menos de 30% dos repasses federais à COVID-19 para estados e municípios, aprovados pelo congresso. Caso não tivéssemos o SUS, a letalidade e mortalidade da COVID-19 no Brasil seria muito maior, seria um morticínio sem tamanho.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.