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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Tensão entre a propaganda e a realidade na crise do governo paulista com as polícias estaduais

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Por Redação
Atualização:

Rafael Alcadipani, é professor Adjunto da EAESP-FGV, External Fellow no Cardiff Crime & Security Research Institute - Cardiff University e associado pleno ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

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O governo do Estado de São Paulo conseguiu um feito para poucos na gestão pública: em um cenário de escassez orçamentária e de crise econômica, foi capaz de fornecer um aumento de 5% para policiais e agentes penitenciários, ao custo de 1,5 bilhões ao erário público, e ao invés de colher os louros deste aumento na categoria gerou uma grande revolta. Para entender o que está acontecendo é necessário pensarmos a lógica que perpassa a atual política de segurança pública do Estado.

A despeito da pujança econômica de São Paulo, os policiais e agentes penitenciários possuem salários e condições de trabalho muito aquém do que era de se esperar. Há muitos anos os salários dos trabalhadores da área de segurança pública não recebem sequer a reposição da inflação. Há uma crônica falta de reposição de efetivos que faz com que policiais tenham que atender a uma maior demanda com menores recursos humanos e materiais. Não é incomum que policiais do Estado paguem do seu próprio bolso o conserto de viaturas, ou consigam algum comerciante que arque com o reparo. Os processos de trabalho ainda são extremamente burocráticos e pouco atualizados. Os sistemas de informação são pouco integrados. Há um número inaceitável de suicídios de policiais.

Durante as eleições, o atual governador lançou algumas grandes ideais para a segurança pública do Estado: a criação de BAEPs, batalhões policiais padrão ROTA, o aumento do número de delegacias da mulher (DDM) e a privatização de presídios. Nunca foi apresentada a sociedade nenhum estudo que mostrasse os dados, os fundamentos e as análises que justificam estas ações para a Segurança Pública do Estado.

Na prática, BAEPs estão sendo criados e planejados para áreas do Estado que não possuem a necessidade deste tipo de programa de policiamento, tanto porque não possuem alto grau de violência quanto porque os BAEPs precisam de recursos humanos que na realidade não estão disponíveis na PM. Com isso, estão sendo realocados policiais para compor este tipo de programa de policiamento deixando áreas mais sensíveis e necessárias como as rádio patrulhas desguarnecidas. BAEPs ainda concorrem com um programa de policiamento que existe e dá resultados: as Forças Táticas, estruturas muito mais enxutas.

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As DDMs estão causando o mesmo impacto: elas consomem recursos de uma polícia que está com um número muito alto de claros de pessoal. A violência contra a mulher é um grave problema no Estado, mas isso não se resolve com a criação e abertura de DDMs, pois na prática muitas não possuem demanda que justifique a sua abertura 24 hs. Há formas mais inteligentes e racionais de lidar com a questão da violência contra a mulher, como a criação de equipes volantes especializadas no atendimento deste tipo de crime. As privatizações dos presídios, tema polêmico e que está longe de ser simples como apresentado pelo governador, tem encontrado resistências no Poder Judiciário e do Tribunal de Contas do Estado. Na prática, as promessas de campanha do governo estão mais fundamentadas em achismos do que em estudos técnicos aprofundados ao mesmo tempo que estão colocando mais pressão nos escassos recursos das polícias de São Paulo. As consequências ao longo prazo das práticas dos programas do atual governo é as polícias utilizarem mais recursos de todos os tipos para gerar um resultado menor.

Além disso, o governador, por diversas vezes, disse que faria da polícia de São Paulo uma das mais bem pagas do país. Mas, ofereceu um reajuste de 5% sem mostrar uma proposta clara e estruturada a respeito de como chegará ao objetivo de pagar aos policiais um salário maior. A sensação, mais uma vez, é de que faltam ações concretas e que a imagem vale mais do que a essência. Há em São Paulo uma redução importante de boa parte dos indicadores criminais. Porém, o mesmo tem acontecido em diversas unidades da federação. Como possuímos raros estudos com rigor científico que mostre o que está causando a redução dos indicadores, não é possível dizer ao certo quais fatores estão realmente gerando a redução dos crimes. Não há dúvida que o trabalho da polícia tem ajudado nisso, mas isso tem muito mais a ver com a continuidade do trabalho dos comandos e dos policiais do que de da política de segurança pública do governo do Estado.

O Governo gastou milhões em uma peça publicitária das polícias de São Paulo que mostram uma realidade que não é a que se apresenta nem aos policiais, nem a população. A sensação dos policiais é que se quer vender uma realidade que não existe. Assim, a atual crise entre governo e polícias é fundamentalmente uma crise de credibilidade onde os policiais não percebem que a propaganda do governo corresponde a realidade. É urgente que o Governo de São Paulo faça política de Segurança Pública com base em estudos técnicos aprofundados e que haja um ajuste entre imagem que se quer vender e a realidade.

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