REDAÇÃO
28 de janeiro de 2022 | 17h03
Lucas Querido, Advogado tributarista do escritório ASBZ Advogados
Adriano Silvério, Sócio da área Tributária do escritório ASBZ Advogados
Atualmente em votação na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei (PL) nº 4.728/2020 [1] tem como principais objetivos: (i) a reabertura do PERT – Programa Especial de Regularização Tributária, ocorrido em 2017 (Lei nº 13.496 [2]); (ii) promover a expansão da transação tributária; e (iii) viabilizar que as empresas que tenham rompido o parcelamento do PERT anterior possam aderir novamente.
No entanto, antes mesmo da aprovação, o PL já está sendo objeto de críticas, o que nos leva a refletir sobre o cerne dos parcelamentos em momentos de fragilidade da economia nos últimos anos.
Quando são publicadas notícias a respeito da abertura de novos parcelamentos de dívidas tributárias, reacende-se o debate sobre a sua necessidade, o estímulo à cultura do mau pagador em detrimento do contribuinte que se mantém adimplente com o Fisco, eventuais prejuízos aos cofres públicos, tendo em vista ocorrer uma renúncia de parte do tributo por meio dos descontos em geral concedidos nesses programas.
Todavia, a análise do tema não deve se restringir aos seus benefícios/prejuízos sob a perspectiva do contribuinte ou do Fisco, mas também abranger os critérios políticos e econômicos vividos pelo Brasil em certos momentos da sua história, aliado a um fato indelével que é a complexidade do sistema tributário nacional.
Da perspectiva política/econômica é possível perceber que todos os grandes programas de parcelamento (regularidade tributária) instituídos no âmbito federal foram lançados em contextos delicados do País, por exemplo:
E esses momentos de “crises econômicas” trazem consigo, em geral, uma necessidade de incrementar a arrecadação – vide a título de informação que com o Refis II (Lei nº 13.496/2017), no período entre os anos de 2017 a 2020, a União arrecadou cerca de R$ 63 bilhões de reais [7] – sem esquecer, nesse contexto, da necessidade de em momentos críticos oportunizar os contribuintes a buscar a regularização e a continuidade de suas atividades.
Paralelamente às questões políticas e econômicas que são ingredientes para dar fruto aos programas de parcelamento, não se deve ignorar a complexidade do sistema tributário nacional que indiscutivelmente é uma das dificuldades enfrentadas e há anos vem sendo objeto de discussão sob o ponto de vista reformista.
Quando se fala em complexidade do sistema tributário, chama a atenção a quantidade de normas tributárias instituídas diariamente, perfazendo a média de 15,96 normas federias [8], conforme estudo publicado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT). Diante do elevado volume de legislação tributária, torna-se difícil a sua compreensão e acompanhamento de alterações, ainda mais, por exemplo, quando um contribuinte atua em diversos estados, municípios, tornando a operação ainda mais complexa.
Agregue-se à quantidade de normas editadas diariamente o volume de obrigações acessórias atreladas às exigências tributárias de todas as esferas (municipal, estadual e federal).
Em um estudo realizado pelo Banco Mundial, denominado “Payment Taxes 2020” [9], verifica-se que, no Brasil, uma empresa necessita, em média, de 1.501 horas para cumprir todas as determinações que lhe são impostas pelos Fiscos, sejam elas obrigações principais e acessórias, num cenário de Estado brasileiro que, em regra, é punitivo, desconfiado, e que não dá muito espaço para a composição, sendo que apenas recentemente [10] há sinais de se permitir uma conformidade tributária antes mesmo de lavrar auto de infração e com isso iniciar um contencioso que já é estrondoso, conforme relatório publicado pelo Conselho Nacional de Justiça [11].
Soma-se a esse cenário de instabilidades econômicas cíclicas, aliadas a um sistema tributário inóspito a uma das maiores crises da história mundial, causada pela pandemia da Covid-19, que levou a uma paralisação, quase que total, da economia mundial.
Os contextos e dados acima citados revelam que esses programas de regularização tributária, tal como se propõe com o PL nº 4.728/2020 não devem ser vistos como mero “pacote de benefício”, dada a simbiose histórica de necessidade e adequação, que merece ser analisada a fundo, já que de forma recorrente o Estado brasileiro necessita gerar arrecadação em momentos preocupantes [12], fomentar a regularidade até porque temos um sistema tributário que alija o bom contribuinte.
Notas
[1] https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/144949
[2] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13496.htm
[3] https://veja.abril.com.br/blog/reveja/fhc-sobre-a-crise-de-1999-tudo-poderia-ir-para-o-espaco/
[9]
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