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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Qual a explicação dos casos de sucesso no combate à Pandemia? Capacidades estatais!!!

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Por Redação
Atualização:

Pedro Cavalcante, Doutor em Ciência Política e Professor de Pós-graduação da Enap e IDP.

 

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A maioria dos governos continua enfrentando sérias dificuldades para enfrentar a pandemia e mitigar os efeitos da Covid-19. Os atrasos de parte dos dirigentes em avaliar a gravidade do problema e a incerteza acerca do vírus afetaram as decisões e medidas governamentais eficazes. No entanto, algumas nações, como Coréia, Taiwan, Nova Zelândia e Alemanha, são recorrentemente citadas como exemplos de sucesso no combate à crise vigente. O que explica o êxito desses países? Capacidades estatais.

A ciência política e a administração pública há décadas se debruçam em analisar os determinantes do desempenho das organizações e das políticas públicas. Predomina um relativo consenso de que as políticas de qualidade (efetivas, eficientes, de interesse público, coerentes etc.) são consequências das capacidades estatais ou administrativas[1], isto é, das habilidades da administração pública em mobilizar múltiplos recursos e cooperação entre atores para alcançar objetivos almejados. Se a resposta pode parecer simples, alcançá-las não é nada trivial, na medida em que envolvem a combinação de competências técnico-administrativas e político-relacionais que podem ser classificadas em diferentes tipos: capacidades de entrega, regulação, analítica e coordenação[2].

'Fazer as coisas acontecerem', seja na prestação de serviços, no atendimento ao cidadão ou no pagamento de benefícios, envolve a capacidade administrativa de entrega. Nesse caso, a Coreia do Sul vem se destacando pelo conjunto de políticas que resultaram na célere estagnação da contaminação e em um dos níveis mais baixos de letalidade. Esses resultados se devem a uma ampla estratégia de testagem da população, com rastreamento do contágio, monitoramento individualizado dos pacientes isolados e tratamento diferenciado de acordo com o grau de risco. Tudo isso apoiado por um sofisticado sistema informacional em tempo real com dados transparentes e disponíveis aos tomadores de decisões e à sociedade em geral[3].

Taiwan também foi bem-sucedido nessa crise, que apesar da proximidade e forte interação populacional com a China, praticamente zerou a disseminação de Covid-19 e registra apenas seis óbitos numa população de mais de 24 milhões de habitantes. Essa experiência é explicada pela construção de uma robusta capacidade analítica dos seus 'experts' do governo. Após o crítico aprendizado com a crise do SARS em 2003, o governo passou a investir fortemente em centro de informações de saúde e em capacitação de funcionários para analisarem rapidamente os dados que norteiam as tomadas de decisões rápidas em situação de emergência, como a atual. Alinhado a esse enfoque de políticas públicas baseadas em evidências, Taiwan também inovou na utilização de ferramentas tecnológica, como big data para análise, cruzamento e processamento de dados, além de estratégias de comunicação transparente e interativa de orientação da população[4].

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O terceiro tipo de capacidade estatal é a regulatória, cada vez mais essencial no contexto de governança, ou seja, alargamento das ações públicas em parcerias com a iniciativa privada e sociedade civil. Nesse caso, a dispersão e sobreposição de funções e competências, bem como as condições para execução (enforcerment) se apresentam como desafios adicionais, principalmente, em situações emergenciais. O destaque vai para Nova Zelândia, que na semana passada zerou a contaminação[5], resultante de um rigoroso lockdown que rapidamente fechou as fronteiras, regulamentou e conseguiu executar restrições à circulação da população e, sobretudo, ao funcionamento do comércio não essencial.

A última capacidade estatal, coordenação, conhecida como o santo graal das políticas públicas, muito desejada e dificilmente alcançada, visa criar coerência nas ações do governo, de modo a reduzir redundâncias, lacunas e contradições entre iniciativas e organizações. Em cenário federativo e democrático, a estruturação e o gerenciamento da efetiva coordenação se tornam ainda mais complexos, contudo, a Alemanha vem conseguindo os melhores resultados em comparação aos vizinhos europeus[6]. Certamente, a liderança da Chanceler Angela Merkel tem sido determinante, exercendo papel de facilitadora e articuladora no compartilhamento de poder e responsabilidades com as dezessete autoridades regionais do país.

Nessa conjuntura de intermináveis demandas e pressões por respostas para lidar com esse problema complexo, transversal e repleto de informações incompletas, infelizmente, a maioria dos países vem perdendo essa batalha com efeitos humanitários, sociais e econômicos sem precedentes. Por outro lado, as experiências positivas apresentadas acima colocaram essas nações rapidamente em processos de transição organizada para o 'Novo Normal' de funcionamento dos serviços públicos, da sociedade e da economia. O caminho de superação da crise e de retomada dos padrões anteriores será lento e gradual, porém não há dúvidas de que ele tende a ser mais curto e efetivo para os governos que focam no fortalecimento das capacidades estatais, de seus corpos burocrático de líderes, para planejar, formular e implementar boas políticas públicas, de forma cooperativa com iniciativa privada e a sociedade na Era da governança democrática[7].

 

[1] Christensen, Robert K.; Gazley, Beth. Capacity for public administration: Analysis of meaning and measurement. Public Administration and Development: The International Journal of Management Research and Practice, v. 28, n. 4, p. 265-279, 2008.

[2] Lodge, M.; Wegrich, K. (Eds.). The problem-solving capacity of the modern State. Oxford: Oxford University Press, 2014.

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[3] http://ncov.mohw.go.kr/en/.

[4] https://jamanetwork.com/journals/jama/fullarticle/2762689.

[5] https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,como-a-nova-zelandia-congelou-os-casos-de-coronavirus-no-pais,70003266036.

[6] https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,apos-frear-virus-na-alemanha-merkel-quer-fim-lento-de-quarentena-na-europa,70003280827.

[7]Cavalcante, P; Pires, R. Governança Pública: das prescrições formais à construção de uma perspectiva estratégica para a ação governamental. Boletim de Análise Político-Institucional, v. 1, 2018.

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