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Programas de Renda Básica Municipal: o que podemos esperar em 2021

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Por Redação
Atualização:

Eduardo H. DinizProfessor da Escola de Administração do Estado da Fundação de São Paulo Getulio Vargas (FGV EAESP) desde 1999, foi editor-chefe da RAE, Revista de Administração de Empresas, FGVexecutivo e FGVcasos, de janeiro de 2009 a dezembro 2015. Atualmente é Chefe do departamento de Tecnologia e Ciência de Dados (TDS).

 

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Para os eleitos (e reeleitos) nas eleições municipais é o momento de organizar as prioridades para um 2021 certamente complicado. Passadas as eleições, espera-se que as propostas escolhidas pelos eleitores devam ser transformadas em projetos concretos de governo. As propostas de renda básica municipal apareceram com frequência inédita nas propostas dos candidatos, da esquerda à direita do espectro político. 

Uma análise das propostas apresentadas aos TSE por candidatos nas 95 maiores cidades brasileiras mostrou que em 80% delas o tema esteve presente. Em 19 dessas cidades, que contam com mais de 25 milhões de habitantes, prefeitos foram eleitos com o tema da transferência de renda em suas propostas. Destes, apenas 4 são de partidos de esquerda ou centro-esquerda, enquanto 6 são de partidos de centro, e os 9 restantes são representantes de partidos de direita e centro-direita. 

Em algumas cidades em que o prefeito eleito não apresentou proposta de transferência de renda, o percentual de voto somado pelos candidatos derrotados ultrapassou os 50% no primeiro turno, quando se elegeram os vereadores neste ano sem coligação nas eleições proporcionais, indicando que a transferência de renda pode vir por bancada alinhada com o tema na câmara dos vereadores. É o caso de Porto Alegre, em que o vencedor no segundo turno das eleições não apresentou proposta de transferência de renda, mas 57% dos eleitores no primeiro turno apoiaram candidatos com esses programas. 

Há ainda cidades em que os prefeitos eleitos não mencionaram esse tipo de programa em suas propostas apresentadas ao TSE, mas fizeram campanha com o tema da renda básica. Neste grupo estão Juiz de Fora, Contagem, Diadema, Fortaleza, Serra, Recife e Petrópolis, cujos prefeitos eleitos são de partidos de esquerda e centro-esquerda, dos quais pode-se esperar alguma articulação para incentivo no nível local a programas de transferência de renda. 

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Considerando as previsões sombrias para a economia em 2021 e indefinição do governo federal com relação ao aventado "Renda Brasil", não se deve descartar a adesão a esses programas por parte de prefeitos que não o consideraram durante a campanha. Este fenômeno aconteceu, por exemplo, nos EUA. Após o sucesso de um programa experimental de renda mínima criado pela prefeitura de Stockton, na Califórnia, dezenas de outras cidades pelo país acompanharam a ideia e desenvolveram seus próprios programas. Tudo isso somado, podemos ter neste ano uma onda de iniciativas em dezenas de cidades brasileiras com incentivos a programas de transferência de renda atendendo a milhões de brasileiros que foram mais severamente prejudicados pela pandemia.

Analisar o texto das propostas de governo das 19 cidades cujos prefeitos eleitos já explicitaram as suas intenções pode dar uma ideia dos modelos de programas que podem emergir ao longo deste ano. Dentre estas 19 propostas analisadas, predomina o modelo de "atuação do município para ampliação e fortalecimento dos programas existentes, em parceria com os governos federal e estaduais", com 8 deles defendendo propostas similares. Neste grupo estão 3 prefeitos de centro, 3 de centro-direita, 1 de direita e 1 de esquerda. 

Um segundo modelo, encontrado em 6 de propostas de diferentes candidatos, defende que os programas de transferência de renda tenham origem e controle unicamente municipal, embora restritos, ou por tempo, enquanto durar a emergência sanitária relacionada à pandemia, ou por população, com preferência na assistência a idosos, gestantes e população de rua. Neste grupo estão 1 prefeito de centro, 2 de centro-direita e 2 de direita.

Num terceiro grupo de propostas fica clara a intenção de se criar um modelo de renda básica municipal mais ampla e que sirva a toda a população vulnerável sem restrição de idade ou de qualquer outra condição temporária. É a lógica da "renda cidadã", a que todos os munícipes teriam direito indefinidamente, ou pelo menos enquanto durar a sua condição de vulnerabilidade social. Neste grupo estão 2 prefeitos de centro, 1 de centro-direita, 1 de centro-esquerda e 1 de esquerda, este defendendo que o benefício, além de não-restrito, deve ser pago em moeda local com validade apenas no município.

Com o cenário que se desenha sobre os programas de transferência de renda municipal, esse tipo de política pública que ganhou relevância a consolidação do Programa Bolsa Família, sob a batuta do governo federal, volta às suas origens na década de 90, quando estavam ligados a programas de alcance local. O Programa Bolsa-Escola em Recife, por exemplo, foi criado por legislação municipal em 1997. Campinas e o Distrito Federal também implantaram programas locais antes do governo federal, que só estreou neste campo depois de ver comprovada a eficácia dos programas locais. Agora a maré se inverte e os programas locais tendem a crescer em importância enquanto o programa federal estanca.

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Independente do modelo a ser adotado, é importante que os novos programas de transferência de renda prestes a sair do forno sejam pautados por critérios republicanos na distribuição de auxílio aos mais necessitados. Não se pode repetir o erro do governo do Rio de Janeiro que, entre 1999 e 2007, entregava o "cheque-cidadão" de R$100 a famílias carentes, mas deixava a seleção dos beneficiários a instituições não ligadas ao estado e que usavam critérios religiosos para a distribuição do benefício. Felizmente, após duas décadas de Bolsa Família, o Cadastro Único mantido pelo Governo Federal se consolidou e deve ser a base para a maioria desses programas emergentes. A conferir.

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