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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

 Por que precisamos de mais mulheres pretas em espaços de poder?

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Por Redação
Atualização:

Rosangela Aparecida Hilário, Professora licenciada da UNIR/RO (Departamento de Ciências da Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação/UNIR. Membra do Comitê Executivo da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas

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Maria Ribeiro. Professora do Programa de Pós- Graduação em Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades (FFLCH/USP). Membra do Comitê Executivo da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas

Valdenia Guimarães e Silva Menegon. SEDUC/MA e Instituto Valdenia Menegon. Membra do Comitê Executivo da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas

No longo capítulo do assujeitamento de corpos "fora do padrão" universal, mulheres negras - principalmente a Preta retinta - têm ocupado lugar de servidão, bem como o "dever" de cuidar de si e dos outros, sustentando a cadeia de opressão. Para as Pretas, o lugar é aquele onde conseguem chegar, driblando preconceito, falta de afeto, estrutura e as máximas simplificadoras. Ainda vale o ditado do final da escravidão: mulher branca para casar, mulata para o prazer e preta para o trabalho. O processo de (des)abolição e o ordenamento jurídico foi organizado para manter na servidão o povo preto, especialmente, mulheres pretas, de forma perversa. Não por acaso, essas têm menos anos de escolaridade, ocupam os postos de trabalho mais precarizados, sofrem mais violência obstétrica, são maioria no cárcere. Essas mulheres são exceção nos espaços de poder[1].

Sueli Carneiro afirma que a relação entre mulher preta e poder é como falar de um sujeito ausente, inexiste. Àquelas que ascendem a esses espaços é cobrado alto tributo: não podem errar, devem ser assertivas e competitivas. A trajetória das mulheres pretas em suas escrevivências torna complexa a ascensão aos espaços de poder: não é possível planejar o futuro tendo de lutar para existir e sobreviver no presente.No Julho das Pretas, o maior ato de resistência é manter a si e à sua família vivas, alimentadas, estudadas e esperançadas. É preciso defender a pauta de combate ao capital que coisifica pessoas e emoções, a decolonialidade como conceito basilar na humanização dos corpos e a desorganização do racismo.

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Defendemos que vivências pretas não podem e não devem ser abjetas, hiperssexualizada, reduzidas a corpos ou objetos que apenas sirvam a produção e retroalimentação do capital. Querem ter direitos e não privilégios, honrar Tereza de Benguela e ombrear o acesso a espaços de poder como estratégia para assunção e defesa de vidas pretas. Não basta mais ter uma voz em cada espaço: é preciso representação numérica que nos permita encharcar de cidadania vidas invisibilizadas.

Sim, precisamos de mais mulheres pretas em espaços de poder, já que ao longo dos tempos elas têm cuidado dos seus, limpado, organizado, resistido, estudado e avançado em comunidade. Em meio a todas as ausências, têm alavancado gerações. Também, elas cuidaram para que o mundo estivesse organizado e limpo. Agora, é hora de organizar o mundo para que sejam lembradas para além de datas e passem, finalmente, a bem existir.

Se uma medida firme, humana e pedagógica não for efetivada é possível afirmar que as próximas gerações seguirão vulneráveis. Será preciso projetar existências por meio do fortalecimento da autoestima, compartilhamento de conhecimento formal e ancestral, proposição de possibilidades que conduzam à independência financeira, além, é óbvio, de fomentar coletivas inspiradas no matriarcado africano, com vistas ao fortalecimento de comunidades e que mantém operante o exercício do poder em benefício da coletividade.

Axé muntu.

Referências

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CARNEIRO, Sueli. Escritos de uma vida. São Paulo: Pólen, 2019.

DAVIS, Angela. Mulheres, Raça e Classe. 1ª edição. Bontempo, 2016.

GONZALEZ, Lélia.  A categoria político-cultural da Amefricanidade. IN: Pensamento Feminista: Conceitos Fundamentais. Heloisa Buarque de Holanda (org,). Rio de Janeiro, Bazar do Tempo, 2019. 440 p.

HILÁRIO, Rosangela Aparecida. O feminismo negro como estratégia para assunção de direitos de mulheres preta e periféricas. Ensaios Filosóficos. Rio de Janeiro, 2019. 40-57.

______.O Feminismo e o feminino na academia: memórias, resistências e protagonismos. IN: Feminismo, Pluralismo e Democracia. CAMARANO, Alessandra. Mesquita, Arlete. Souza, Karlla Patricia.(org.), 2019. 413-428.

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Nota

[1]  Segundo o Mapa do Encarceramento (2018) Mulheres negras representavam naquele momento 62% das encarceradas. A situação não melhorou após dois anos de pandemia e aumento do encarceramento por crimes de baixo potencial ofensivo (crimes por necessidade, famélico e de oportunidade ligados a cuidados com a família). A respeito, conferir: https://carceraria.org.br/mulher-encarcerada/brasil-e-o-4o-pais-que-mais-prende-mulheres-62-delas-sao-negras Acesso em 20 de junho.

Sobre a Rede Brasileira de Mulheres Cientistas (RBMC)

 Foto: Estadão

A RBMC surgiu para atuar em defesa das mulheres durante a pandemia e agrega mais de 3 mil cientistas brasileiras, que buscam ampliar os debates públicos sobre as desigualdades e os direitos na sociedade brasileira, atuar junto a gestores públicos para ações em favor da vida das mulheres, compartilhar experiências positivas de resposta à pandemia e avançar na importante discussão sobre o papel das mulheres na ciência. Para saber mais, acesse: www.mulherescientistas.org

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