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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Percepção de risco sobre os efeitos das mudanças climáticas nas empresas

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Por Redação
Atualização:

Priscila Laczynski de Souza Miguel é professora de Operações da FGV-EAESP e coordenadora do Centro de Logística e Supply Chain (GVCelog). Renata Peregrino de Brito é pesquisadora visitante da Universidade de St. Gallen e pesquisadora do GVCelog. Susana Carla Farias Pereira é professora de Operações e Supply Chain Management da FGV-EAESP, pesquisadora do GVCelog e Chefe do Departamento de Administração da Produção e Operações da FGV-EAESP.

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A região Sudeste, em especial São Paulo, enfrentou uma crise hídrica em 2014 e 2015 sem precedentes. Fomos todos convidados a reduzir o consumo de água em nossas residências e evitar o desperdício. Por diversas vezes, a mídia trouxe reportagens sobre bairros que ficavam sem água e sobre empresas que tinham que interromper suas operações por falta de água. A agricultura, no estado de São Paulo, foi um dos setores mais afetados. Segundo pesquisa realizada pelo Centro de Logística e Supply Chain (GVCelog) da FGV-EAESP, produtores de laranja, café e cana tiveram perdas de até 40% em sua produção durante o período de seca. Além da quebra de safra, os mesmos reportaram perda de qualidade e aumento de custos. A estiagem afetou também outros elos da cadeia de suprimentos como a indústria e o varejo.

Felizmente, no segundo semestre de 2015, as chuvas voltaram a cair e o nível dos reservatórios voltou a operar no chamado volume útil. Não temos mais motivos para nos preocupar já que esta estiagem foi atípica, certo?

Na verdade, não. Embora realmente atípica e mais severa do que o normal, esta seca não deve e não pode ser esquecida. Segundo relatório do Ministério do Meio Ambiente, as mudanças climáticas irão afetar significativamente o Brasil nos próximos anos. Com exceção da região Sul, todas as demais regiões sofrerão com períodos prolongados de seca e a área disponível para a produção de alimentos será reduzida. Assim, a crise hídrica deveria servir como alerta para que os produtores comecem a desenvolver, imediatamente, estratégias de mitigação de riscos e adaptação para novas estiagens.

Na prática, porém, isto parece estar longe de acontecer. A pesquisa do GVcelog indicou que apesar dos produtores sentirem os efeitos da crise hídrica em suas operações, eles ainda não têm a percepção de que as mudanças climáticas podem ser fonte de risco para seus negócios. É importante entender que a percepção do risco em situações de desastres naturais é fortemente influenciada pela experiência vivenciada, mas também pelo grau de informação disponível sobre estes riscos. Para os produtores entrevistados, suas operações serão sempre influenciadas por fatores climáticos, mas estes são cíclicos. Uma hora chove demais, outra "de menos". Entretanto, os produtores precisam ser conscientizados de que, embora estas variações influenciadas por fatores climáticos continuarão a ocorrer, o patamar de temperaturas aumentou e irá aumentar ainda mais nos próximos anos. É papel do governo e também de centros de pesquisa intensificar a divulgação de estudos sobre o tema. E é responsabilidade do governo, também, desenvolver gestão de risco para assegurar o abastecimento adequado de água para os cidadãos.

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A percepção do risco sobre as mudanças climáticas é apenas o primeiro passo no processo de adaptação. Além de reconhecer a incerteza da vulnerabilidade de suas operações, os produtores precisam também reconhecer as vantagens de se preparar para novos eventos. Conhecido como o paradoxo da percepção de riscos, estudiosos europeus identificaram que indivíduos resistem a se preparar para novos desastres se a relação custo-benefício não for positiva. A pesquisa do GVCelog identificou que os produtores das cadeias pesquisadas no estado de São Paulo não investem sistematicamente em gestão de riscos e entendem que os investimentos necessários, como por exemplo, em irrigação, são muito altos para um risco percebido como baixo.

A consequência da escassez de água na produção de alimentos não se limita apenas aos produtores, mas afeta todos os elos da cadeia. As grandes indústrias de alimentos já possuem mecanismos de antecipação de incertezas e adotam algumas estratégias de mitigação de riscos. Uma estratégia que parece comum às empresas investigadas é o desenvolvimento de novos fornecedores em regiões mais distantes. O aumento da base de fornecedores e a distância resultam em aumento de custos administrativos e custos de transportes. O resultado final é aumento de preço para o consumidor final e inflação.

Em outra pesquisa realizada pelo GVcelog, respondentes apontaram que embora os desastres naturais sejam vistos como fonte de risco, eles não são considerados críticos. Uma possível explicação para isto é a falsa ilusão de que o Brasil é um país abençoado por Deus e abundante em recursos naturais. Entretanto, a realidade mostra outra face: o país tem sido assolado por enchentes, inundações e estiagens constantes nos últimos anos. A probabilidade de ocorrência destes eventos está aumentando e seus impactos para a população e para os negócios também.

Está na hora de abrirmos os olhos!

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