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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Pela despolitização das atividades policiais

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Por Redação
Atualização:

Rafael Alcadipani, é professor do Departamento de Administração da FGVSP onde leciona nos cursos de graduação, mestrado e doutorado acadêmico em administração de empresas e administração pública, além de colaborador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

 

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Em entrevista a Rádio CBN no último sábado, Renato Sérgio de Lima, Presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, destacou a importância de que as polícias do Rio de Janeiro não tenham seus chefes regionais indicados apenas por critérios políticos.

O problema é grave e não se restringe ao Rio de Janeiro. A ruidosa mudança do chefe da Polícia Federal gerou desconforto e levantou suspeitas de tentativa de influenciar politicamente a instituição. Não são todas, mas há forças policiais do Brasil em que a definição de quem irá comandar uma unidade policial em uma dada região não é do chefe de polícia, mas sim de uma liderança política de peso. Trocando em miúdos: o comandante de um batalhão ou um delegado é indicado, por exemplo, por um deputado que quer ter seu "amigo" como aquele que manda na polícia em uma determinada região de seu interesse.

Mas qual o motivo de um político querer fazer isso? No meio policial, diz-se que quando um comandante de polícia deve favor para um político ele pode usar do cargo para atender os interesses de quem o apadrinhou para o cargo naquela área. Na prática, isso garantiria ao político que seus interesses, alguns deles escusos, não seriam atrapalhados pela polícia. Há, ainda, a suspeita de que em casos extremos o indicado use parte da estrutura sob o seu comando para "levantar" dinheiro para a campanha do político. Esta é uma das portas de entrada do poder paralelo no poder oficial, pois como o político tem poder de influência sob o governador, a quem os chefes de polícia devem obediência, os policiais ficariam reféns dos interesses e dos seus pedidos. A proposição de emendas parlamentares para construir instalações policiais, comprar viaturas e demais equipamentos é também um instrumento usado por alguns políticos para obter prestígio e conseguir favores em algumas forças policiais. É em larga escala a mesma lógica do empresário que ajuda na manutenção da viatura e depois não quer que a polícia o multe e o prenda quando está dirigindo embriagado, ou fazendo coisa pior.

O sucateamento da polícia abre espaço para a perda de sua autonomia na prática e que parcela de policiais tenha que viver de pequenos favores. Há, ainda, pessoas que tentam usar o seu peso político para promover policiais sem que estes necessariamente atendam a um critério de desempenho. Há relatos de casos em que autoridades, até mesmo da cúpula do Judiciário, peçam aos chefes de polícia ou até mesmo ao governador para que um policial específico seja promovido. A forte influência externa de autoridades nas polícias faz com que haja muito policiais que se dediquem a bajular as autoridades em busca de benefícios institucionais e pessoais.

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Outra faceta que se acredita afetar o trabalho policial são os pedidos especiais de membros dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário para que a polícia atue diligentemente em seus casos particulares. Ou seja, policiais tendo que mobilizar recursos, em geral escassos, para atender as exigências e necessidades de poderosos que pedem um tratamento VIP.

Por exemplo, a autoridade que solicita que uma viatura da polícia vá a uma localização específica em busca de um celular furtado ou que faça um Boletim de Ocorrência e leve até a sua residência. Com isso, recursos que deveriam ser usados para a investigação de crimes importantes são usados para atender muitas vezes banalidades das autoridades.

Não é apenas a pressão externa que afeta algumas polícias. Ao decorrer de suas carreiras, alguns policiais desenvolvem relações internas com superiores que crescem na hierarquia das corporações e ocupam posição de chefia. Com isso, formam-se grupos de poder que tendem a defender os interesses de seus membros. Assim, quando um destes grupos assume o poder, pessoas ligadas a eles são promovidas e tem seus interesses privilegiados em detrimento dos demais. Há casos em que policiais que realizam trabalhos importantes como desbaratar quadrilhas inteiras são preteridos no momento da promoção por policiais que dedicam suas carreiras aos conchavos internos e externos com os poderosos. Ou seja, acontece promoções em algumas polícias que não atendem a nenhum critério técnico. Isso gera uma grande desmotivação de policiais que não se sentem reconhecidos.

Há, por fim, casos em que policiais são perseguidos, por exemplo, não conseguem se promover ou são alocados longe de suas casas, por terem tido problemas pessoais com pessoas poderosas de suas corporações. Dentro deste quadro, rapidamente, policiais apreendem que devem ter muito cuidado com quem eles "se metem", quem eles investigam ou até mesmo multam. Lógicas organizacionais assim desmerecem a meritocracia e favorecem o assédio e a corrupção. Para navegar nestes ambientes turbulentos, alguns policiais aprendem na prática que precisam ser mais aduladores do que técnicos.

Organizações são complexas e dinâmicas e muitos policiais são bastante prejudicados por este estado de coisas e tentam combater todas estas práticas cotidianamente. O nível de interferência e da presença da política danosa varia entre as instituições. Porém, há polícias em que a forte influência política prejudica suas carreiras dos policiais, suas instituições e as suas possibilidades de atuação. A política é inerente a toda e qualquer organização. Porém, para melhorarmos a nossa Segurança Pública precisamos que nossas polícias sejam mais blindadas das influências políticas externas e que os policiais tenham seu desempenho medido de maneira mais objetiva e progridam na carreira por seus méritos próprios e não pelos amigos que possuem.

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É urgente repensar o modelo de governança não apenas externo mas também interno de todas as polícias brasileiras, Federal, Militar, Civil e Guardas Municipais. Tal novo modelo deve também contemplar um claro controle externo. Precisamos de polícias de Estado, não para os poderosos e porosas a influência do poder paralelo e dominadas por clãs internos. Fazer isso é defender a sociedade e os bons policiais.

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