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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Pandemia e um novo contrato social

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Por Redação
Atualização:

Maria José Tonelli, Professora titular no Departamento de Administração Geral e Recursos Humanos na FGV - EAESP

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Já no seu terceiro ano, a pandemia escancarou inúmeras questões que afetam a todos nós. Todas as previsões de tendências para o ano de 2022 trazem como prementes: a questão do clima, a preocupação imensa com a água, com a desigualdade, com a saúde mental, com a necessidade de requalificação em todas as idades, e as consequências da erosão da coesão social, da crença na democracia. O Antropoceno, era da humanidade que é da responsabilidade da ação dos humanos, trouxe um legado positivo (nem sempre bem distribuído) mas também desafios imensos para o futuro das novas gerações, evidenciadas nesse período.

A pandemia expôs com violência as nossas ilusões e nos deparamos com desigualdades e angústias. A sociedade, as organizações e as pessoas foram chacoalhadas. Não foi pouca coisa o que enfrentamos: fugir da morte, da peste, o isolamento necessário e, simultaneamente, o reconhecimento de que não existe o eu sem o nós. Percebemos que o espaço do trabalho e o espaço privado da casa não são dimensões apartadas. Alguém tem que cuidar das crianças, fazer a comida, limpar a casa para que o trabalho possa ser realizado. O trabalho do cuidado serve à sociedade como um todo. E caímos no século XXI com as tecnologias permeando a vida de todos nós.

As empresas enfrentam a fuga de talentos em busca de novos projetos de vida e questões de saúde mental deixaram de ser tabu e passaram a estar na pauta do dia das organizações. A longo prazo, as empresas enfrentam o momento econômico, as questões climáticas, a necessidade de enfrentar a desigualdade social e a necessária qualificação dos trabalhadores para o seu próprio crescimento.

Na vida pessoal, para aqueles que podem, o questionamento sobre se todos os sacrifícios feitos em nome do trabalho são realmente necessários. A depressão, a ansiedade, o burnout, antes escondidos foram expostos a céu aberto. O burnout foi reconhecido como doença ocupacional, resultante de um esgotamento físico e mental em decorrência do estresse no trabalho. Diretores, CEOs de empresas declararam publicamente o sofrimento mental; e a área de Recursos Humanos passou a se ocupar do burnout como uma questão real, com perdas financeiras em decorrência de afastamentos e impactos na produtividade.

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Minouche Shafik, atual diretora da London School of Economics and Political Science, com trajetória brilhante como vice-presidente do Banco Mundial, vice-diretora do FMI e vice-presidente do Banco da Inglaterra, propõe um novo contrato social para garantir que além de um planeta mais quente, seja possível deixar um legado para o futuro com novas formas de organizar a sociedade, incluindo o cuidado com os filhos, a educação, a saúde, o trabalho, a velhice, novas gerações. No seu livro "Cuidar uns dos outros: um novo contrato social" (Editora Intrínseca, 2021), ela mostra que a COVID 19 trouxe, além das questões dramáticas que todos acompanhamos, tensões entre as gerações e a necessidade de um investimento maciço em educação para reciclar o conhecimento de todos os trabalhadores. Mas essa requalificação não pode ser feita sem considerar princípios éticos e de justiça social. Frente ao crescimento da flexibilidade no trabalho, é necessário garantir saúde e segurança social de modo a assegurar benefícios para a geração jovem que não antevê a mesma possibilidade de enriquecimento que as gerações anteriores.

A autora busca no discurso de Martin Luther King, em 1967, a necessidade do reconhecimento da interdependência que vivemos: "Toda vida está inter-relacionada. Todas as pessoas estão presas em uma teia inescapável de mutualidades, entrelaçadas em único tecido do destino. O que quer que afete alguém diretamente acabará afetando a todos de forma indireta...". Várias décadas depois a frase não poderia ser mais atual, e fortalecer aquilo que nos une e não o que nos separa talvez seja um legado dessa pandemia. Resta saber se vamos aprender...

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