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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Os caminhos da solidariedade em tempos de pandemia no Brasil

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Por Redação
Atualização:

Andréa Pineda, doutoranda em Administração Pública e Governo na FGV EAESP e pesquisadora do CEAPG

Alexandre Abdal, professor da FGV EAESP, pesquisador do Cebrap e pesquisador associado a rede - INCT Observatório das Metrópoles, núcleo São Paulo

Mário Aquino Alves, professor da FGV EAESP e pesquisador do CEAPG

Fernando Nogueira, professor da FGV EAESP e pesquisador do CEAPG

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Pedro Henrique Campos, mestre em Administração Pública e Governo pela FGV EAESP

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O volume de recursos privados arrecadados para projetos de combate ao Covid-19 e suas consequências no Brasil é impressionante. Por meio de alianças, em menos de dois meses o setor corporativo e a sociedade civil mobilizaram mais de R$ 5,6 bilhões em doações, provenientes de mais de 400 mil doadores diferentes, de todo o país, segundo dados do Monitor das Doações COVID19 - ferramenta liderada pela Associação Brasileira de Captadores de Recursos - ABCR. Trata-se de um número muito superior à média histórica de todo o investimento social privado organizado desde que o Grupo de Instituições, Fundações e Empresas (GIFE) passou a mensurá-lo de forma sistemática por meio do seu censo. Também igualmente importantes têm sido são as mobilizações locais, comunitárias, que têm se organizado para providências práticas, mesmo com poucos recursos, como a da Central Única das Favelas (CUFA) e da comunidade de Paraísópolis.

Embora todas essas mobilizações sejam muito importantes, temos que compreender que a situação da sociedade civil no Brasil é extremamente delicada. Em levantamento recente das consultorias Mobiliza e Reos Partners com mais de 1760 representantes organizações da sociedade civil (OSCs) revela que 87% das organizações já interromperam suas atividades, mesmo que parcialmente, devido ao impacto da diminuição de recursos captados para realizar suas atividades e mesmo na diminuição de voluntários para oferecer estes serviços.

Se a pandemia tornou a situação da sustentabilidade financeira das OSCs muito mais difícil, isto não significa que o cenário pré-Covid-19 fosse favorável. A tendência dos últimos anos era o da diminuição de recursos captados por meio de editais públicos ou junto a organismos internacionais, a realidade da maioria das organizações sociais (OSC) nunca foi confortável. Desde o governo Michel Temer, a falta de prioridades e o desdém governamental pelo acelerou a crise de sustentabilidade financeira das OSCs. O governo Bolsonaro piorou ainda mais o cenário, com uma postura desde o início agressiva contra o setor, sobretudo contra as OSCs de defesa de direitos e ambientalistas.

Além da diminuição de parcerias e financiamento do setor público, há problemas também na captação de recursos junto ao investimento social privado nacional, sobretudo de grandes empresas e fundações. Segundo dados do último Censo Gife, apenas 30% do total de institutos e fundações empresariais (ou familiares) apoiam institucionalmente organizações da sociedade civil (OSC), provendo auxílio financeiro independente de projetos/programas. A maior parte dos investidores sociais brasileiros (72%) executa diretamente (com equipe própria) seus próprios programas. Assim, as OSCs vêm tentando se valer de doações individuais como estratégia de captação de recursos.

A pesquisa Doação Brasil, realizada em 2015 (IDIS), identificou que pessoas físicas doam, em média, R$ 30,00 (trinta reais) por mês para causas e OSCs. Este valor, porém, pode oscilar de acordo com a instabilidade financeira do doador. Além disso, os custos de transação envolvidos (estruturar e treinar equipes de captação, emissão de boletos, campanhas, dentre outros) na atividade de captação e retenção de doações individuais de doação não são triviais. Logicamente, muitas organizações procuram doações de valores maiores para maximizar os ganhos marginais para as organizações em relação aos custos de captação. Para isso, faz-se necessário um esforço de aproximação destas organizações de um público de maior renda. Porém, apesar de ser um grupo caracterizado pela alta renda e, em geral, originada de fonte estável, os potenciais doadores de alta renda constituem um público ainda pouco mobilizado pelas OSCs no Brasil.

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Com o objetivo de compreender as motivações e interesses de potenciais doadores de alta renda (identificados por 'profissionais em meio de carreira, com renda mensal igual ou superior a 30 mil reais'), em 2018 conduzimos pelo Centro de Estudos em Administração Pública e Governo (CEAPG) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EAESP), a Pesquisa Comportamental sobre Doadores de Alta Renda (PCDAR), em parceria com a Conectas Direitos Humanos, com financiamento FGV EAESP Pesquisa e do Fundo BIS. Entre os respondentes da PCDAR, há sinalizações de doações mensais em um patamar mínimo de R$ 300,00: valor dez vezes superior à faixa identificada pela média da população.

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Voltando aoMonitor das Doações COVID19, nota-se que, de todas doações destinadas ao combate da Covid-19, somente oito por cento (8%) do total delas foram feitas a partir de campanhas de financiamento coletivo; a imensa maioria (83%) veiode empresas. A baixa participação das doações de indivíduos e famílias (4%) pode ser explicada pela insegurança financeira de grande parte da população que, frente à pandemia, teve - ou terá - sua renda afetada. Isto reforça ainda mais a importância de engajar a população de alta renda no financiamento das OSCs.

O grande desafio é vencer as dificuldades de desenvolver este tipo de engajamento em um ambiente onde não contamos com uma cultura de doação estabelecida. Na pesquisa PCDAR identificamos que doação não era um assunto cotidiano entre a população de alta renda; não se percebia que praticar ações de doação constituem uma possibilidade concreta e realizável em seu dia-a-dia. Assim, passamos a nos indagar se a experiência de uma pandemia mundial será suficiente para mudar hábitos de doação e fomentar a solidariedade da população de alta renda?

 

Este texto faz parte de uma série de artigos escritos por pesquisadores do Centro de Estudos em Administração Pública e Governo (CEAPG) da FGV EAESP - https://ceapg.fgv.br

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