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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

O que é cringe na tributação?

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Por Redação
Atualização:

Marco Túlio da Silva, Auditor Fiscal da Secretaria de Fazenda de Minas Gerais e Membro da Comissão Tributária da Federação Brasileira das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)

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Quem em fins do mês passado não se deparou com postagens em suas redes sociais sobre o que é cringe, ou está a perguntar do que se trata, talvez esteja cheugy.

No inglês (origem da palavra), cringe é um verbo (sentir-se envergonhado). No Brasil a palavra viralizou como adjetivo a classificar objetos ou pessoas com atitudes fora de moda, ultrapassadas, cafonas, ou que gere vergonha.

A crítica suscitou uma guerra geracional entre Millennials e Geração Z. Para situar sobre a classificação de gerações temos : Geração silenciosa (1925 a 1944), marcada por um contexto de guerras e busca por direitos individuais; Baby Boomers (1945 a 1964), ênfase na família, solidez e conquistas; Geração X (1965 a 1984), ênfase no questionamento, fraternidade, busca por novas tecnologias e direitos sociais; Geração Y "Millennials" (1985 a 1999), ênfase na inquietação, pluralidade e sociedade da informação; Geração Z (2000 em diante), os nativos digitais, com ênfase nas conexões virtuais, no mutável e em tudo o que é "fast".

No Instagram, a hashtag #cringe superou 20 milhões de publicações. No Tiktok, vídeos com tal hashtag ultrapassaram 10 bilhões de visualizações. No Google, a busca pelo termo está na trend list.

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Consta das notícias que o assunto ganhou destaque após tuíte de Carol Rocha, publicitária e apresentadora de podcast, pedindo para a geração Z listar os hábitos que achava cringe nos Millennials.

Bem, fora do debate geracional, eu que estou entre os Baby Boomers vou ousar entrar na onda de brincar com o termo, ainda que já tenha passado o auge das postagens, e abordar a tributação.

Seja qual for a geração, a tributação soa como um ônus. Claro que as primeiras exigências de tributo foram marcadas por uma contribuição literalmente imposta e cobrada com o uso da força, o que certamente gerou trauma e resistência, marcando o inconsciente coletivo, o que provavelmente é uma das causas da propensão a sonegar.

Ocorre que desde o reconhecimento da necessidade do Estado, e no mundo atual nenhuma sociedade organizada e decente é possível sem a presença do Estado, e mais ainda de um Estado fiscal, tributo é o que garante o mínimo de bem-estar das sociedades. Sobre o tema vale consultar a excelente obra (O dever fundamental de pagar impostos) do professor José Casalta Nabais.

Imaginemos como seria a vida sem o Estado, certamente uma barbárie. Sem as escolas públicas, sem servidores organizando o trânsito, sem bombeiros e policiais para manter a segurança, sem postos de saúde, sem programas de transferência de rendas, sem leis e sem sistema judiciário, sem hospitais públicos, sem coleta de lixo, sem iluminação pública, sem controle do tráfego aéreo, sem as forças armadas a proteger a nação, sem vacinação e uma série de outros serviços prestados silenciosa e diariamente pelos mais diversos servidores públicos para todos os cidadãos, inclusive pelos auditores fiscais, que garantem que cada um contribua com o que a lei definiu como devido à sociedade. Sim, paga-se tributo para a sociedade (questão de solidariedade), o Estado é mero arrecadador e alocador (funções da tributação).

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Neste contexto, penso ser cringe a ideia de movimento "Um dia sem impostos", afinal, dia sem impostos é dia sem Estado, sem justiça social, e com opressão das classes mais necessitadas. A meu ver fora de moda, ultrapassado, cafona, ou digno de vergonha agir assim, sem um mínimo de empatia e cidadania fiscal.

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A carga tributária brasileira, cerca de 31,64% do PIB em 2020 segundo dados do site tesourotransparente.gov.br, é similar àquela do início dos anos 2.000, mas seu problema maior situa-se em quem paga e quem não paga a conta.

Calcada nos tributos sobre consumo nos quais os menos aquinhoados pagam mais e com uma baixa tributação sobre patrimônio, herança, lucros, dividendos, etc., além de uma grande quantidade de benefícios fiscais que nem sempre se justificam, é urgente divisão mais equitativa da tributação. Aqui, também, penso ser cringe querer pesar a mão na tributação sobre o consumo e aliviar na tributação sobre patrimônio, bem como conceder benefícios fiscais para agrotóxicos, bebidas adoçadas, comodities, distribuição de lucros, dividendos etc.

Cringe na tributação é tributar mais quem pode menos (tributa-se o carro e nada paga o dono de helicóptero e lancha, tributa-se a herança no Brasil e quem pode transferir seu patrimônio para holding familiar no exterior nada paga, tributa-se produtos da cesta básica e a soja e carne vão para o exterior sem pagar imposto e deixando rastros de devastação, tributa-se a renda do assalariado e a distribuição de lucros e dividendos nada paga).

A meu ver fora de moda, ultrapassado, cafona, ou digno de vergonha são estes e outros aspectos do sistema tributário brasileiro, socialmente disfuncional, mas muito funcional para uma visão utilitarista de pequenos grupos dominantes, que agem sem um mínimo de empatia, solidariedade e cidadania fiscal, sem pensar na parcela da população brasileira (#somos70%) que depende diariamente dos serviços públicos de educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, etc.

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E você, o que considera cringe na tributação?

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