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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

O Calendário Bolsonariano

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Por Redação
Atualização:

José Antonio G. de Pinho, Professor Titular Aposentado - Escola de Administração - UFBA. Pesquisador FGV-EAESP

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O mandato de Jair Bolsonaro tem pela frente poucos meses. A pergunta é que se faz recorrentemente é: como é que ele chegou até aqui e como o Brasil deixou-o chegar até este ponto? Certamente a situação atípica da pandemia do Covid 19 contribuiu para isso, mantendo a sociedade civil desmobilizada para um possível (e pertinente) impeachment, o mesmo acontecendo com os partidos políticos. Também a presença de atores chave em posição de decisão em instituições da República tem servido para manter nas gavetas os diversos pedidos de impeachment, como o caso da Presidência da Câmara e da "Protetoria Geral da Presidência".

E assim Jair Bolsonaro chega a um novo pleito buscando a reeleição. Em 2018 valeu-se, para ser eleito, de um certo desconhecimento que a população tinha dele, evidentemente em um País marcado pela falta de memória. Também ocorreu uma conjunção de fatores políticos, ideológicos e sociais, incluindo uma fatídica facada. Em 2022, Bolsonaro não engana mais ninguém, os três anos de mandato revelaram plenamente o tipo de ser humano que é.

Neste breve artigo vamos examinar as possibilidades eletivas do candidato Bolsonaro. Em artigos anteriores, neste espaço, já defendemos que as possibilidades de vitória são escassas paraele. A Economia naufragando, a inflação disparando, o desemprego mostrando-se resiliente, nada anima sua postulação. O Auxílio Brasil, sua maior aposta, além de atender a apenas uma parcela dos desesperados o faz em valores que não conseguem alcançar o atendimento das suas necessidades mais básicas.

Se o quadro é este, o que fará Bolsonaro para estancar uma sangria e uma provável derrota? Ao que tudo indica, ele fará o que mais sabe fazer: continuará sendo Bolsonaro, agindo, atuando como esta figura patética que estamos acostumados a ver. Continuará atacando as instituições e seus membros, jogando questionamentos infundados sobre suas condutas (como o recorrente caso do STF e da ANVISA), prevaricando e terceirizando sua responsabilidade de Presidente para outrem, esperneando contra tudo que se põe no seu caminho, se vitimizando.

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Em artigo anterior neste mesmo espaço, cogitamos a possibilidade de Jair Bolsonaro desistir da Presidência para concorrer ao Senado, após constatar a inviabilidade de sua vitória e visando construir um abrigo para sua imunidade parlamentar. Isto tem uma data limite para sua renúncia à Presidência, dia 02 de abril. Essa seria a primeira data do calendário bolsonariano. Estamos há dois meses e meio dela. É tempo suficiente para o candidato, sua família e staff avaliarem suas reais chances, o que certamente levará em conta as pesquisas de opinião, nas quais, aliás, diz não confiar.

Convém examinar então o quadro sucessório, empreendimento de alto risco distando nove meses da eleição, mas risco que se atenuará um pouco nesse momento de decisão (Senado ou Presidência), quando faltará exatamente meio ano para o pleito. Duas condições, no nosso entender, terão que ser atendidas para Bolsonaro se manter na disputa: que o ocupante da primeira posição, que ao que tudo indica será Lula, não esteja muito desgarrado em termos de aprovação, com possibilidades de levar no 1.o turno (ou estiver faltando um "Alckmin") ou a 2.a posição que tem mantido não esteja ameaçada por outro candidato.

Esta segunda condição merece um exame mais circunstanciado. A tal 3a via, até agora, parece difícil de despontar no horizonte. Dória com o peso de ser governador de São Paulo e com o papel ativo na questão das vacinas, não consegue nem no seu próprio Estado assumir papel de ponta. Em artigo anterior também neste espaço, defendemos que não teria physique du rôle para esta postulação. Moro, por outras razões, pode padecer do mesmo mal, o que o faria acionar a saída para o Senado. Resta Ciro que, por sua experiência pode despontar nas etapas finais da campanha, principalmente com os debates e ainda apostando na expectativa que a eleição se decide na reta final onde os eleitores passam a ter um quadro mais delineado das propostas dos candidatos.

Em um cenário onde esses três postulantes cresçam alguns pontos e estes sejam tirados do ex-capitão, os pontos perdidos por este serão preciosos colocando em risco sua segunda posição e consequente ida para o 2.o turno. Ou seja, os 22/24% que ora ostenta, não são nada confortáveis. É conveniente considerar também que podem decidir por Bolsonaro. Seria o caso do PL e do centrão, abandoná-lo caso revele-se inviável eleitoralmente, uma vez já cumprida a agenda extrativista desses partidos.

Caso não se concretize a saída para o Senado, o ex-capitão vai para o tudo ou nada, não existindo outra rota de fuga a posteriori. Aí será possível ver Bolsonaro em sua plenitude. Com todas as condições econômicas e sociais se deteriorando e o tempo ficando mais escasso, a aprovação popular tenderá a cair mais ainda. Longe de querer dourar qualquer pílula, no horizonte da eleição as condições sociais serão dramáticas, mais do que hoje.

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Assim, não restará ao ex-capitão fazer o que sabe fazer: contestar as instituições, no caso o TSE como alvo preferido, a imprensa, a mídia em geral, o STF, os institutos de pesquisa eleitoral. Enfim, tentará quebrar a ordem democrática. Caso isso tudo repercuta nos seus índices nas pesquisas inviabilizando sua ida ao 2.o turno, muito possivelmente tentará inviabilizar o processo eleitoral. Seria algo nunca visto nas suas ações, apesar de todo seu longo currículo de insanidades, delírios e de tentativas de agressões à ordem democrática. Nesse calendário que estamos esboçando, caberia colocar o 7 de setembro de 2021 como marco zero de uma tentativa de golpe.

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Penso que podemos aprender com o recente episódio das chuvas na Bahia (agora atingindo também Minas e tantos outros Estados). Diz-se que o candidato Jair Bolsonaro objetiva reverter a situação no Nordeste onde foi derrotado e onde as pesquisas revelam um desempenho fraco por sua parte. Com seu espírito dedicado à morte, sem empatia alguma com o outro, assentado em um enraizado negacionismo, não consegue nem pensar politicamente.

Pegando duas cidades da Bahia que sofreram intensamente com as chuvas, Itabuna e Ilhéus, o então candidato em 2018 foi vitorioso no 1.o turno na primeira, mas derrotado no 2.o Turno. Em Ilhéus foi derrotado nos dois turnos, de forma fragorosa no 2.o. Pergunta-se: com que ânimo vão esses eleitores em outubro próximo à cabine eleitoral depois do escárnio com que foram tratados por Bolsonaro? Cabe observar que as duas cidades constituem o 55.o colégio eleitoral do Brasil. Várias cidades se desmanchando, gerando forte crise social, e o mandatário da Nação vai curtir as férias em local bem distante do epicentro da crise. Isto é Jair Bolsonaro.

Configurado um quadro das ameaças acima consideradas a sua postulação eleitoral, restará uma tentativa de quebra da ordem democrática, o que seria a segunda data desse calendário bolsonariano. Data indefinida. Quem apoiaria o homem em transe? Seguramente os bolsonaristas raiz bem como os que não reconhecem qualquer outra opção eleitoral ou partidária. Quantos ainda são e quantos serão? Mas como se posicionariam os evangélicos (ou parte deles)? O mesmo cabe perguntar aos militares que se locupletaram nesse período com a vasta abertura de vagas do RH da administração bolsonarista? Por certo, os militares são os que mais sabem quem é Bolsonaro.

As instituições democráticas resistiram até agora aos arreganhos autoritários de Bolsonaro. Acredito que darão outra lição de recusa as saídas autoritárias ou autocráticas. É de se esperar que os militares façam uma autocrítica e acionem o Plano Q, de volta aos quartéis. E que as instituições republicanas, a opinião pública, a mídia e organizações da sociedade civil mantenham-se atentas para conter esses possíveis delírios. Que a segunda data do calendário bolsonariano seja sua derrota.

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