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De volta às brumas eleitorais

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Por Redação
Atualização:

José Antonio G. de Pinho, Professor Titular Aposentado - Escola de Administração UFBA. Pesquisador FGV - EAESP

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Dois meses atrás neste mesmo espaço publicamos o artigo "As Brumas Eleitorais" discorrendo sobre a grande quantidade de névoas que envolviam a corrida eleitoral deste ano. Naquela ocasião faltavam seis meses para o pleito. Agora faltando um pouco menos de quatro meses, voltamos ao tema para examinar o grau de clareza que existe nessa pista de corrida. Pode-se dizer que o horizonte já está bem mais claro com o número de candidatos efetivamente competitivos tendo se reduzido bastante.

Uma desistência que se mostrava difícil de acontecer acabou ocorrendo, a do candidato João Dória, que capitulou pressionado pelo seu próprio partido em um processo tumultuado e confuso. A planilha das pesquisas eleitorais era extremamente nítida, apontando como o candidato Dória não decolava. O PSDB, pouco tempo atrás um dos três ou quatro grandes partidos nacionais, passa a ter um papel coadjuvante, apoiando a Senadora Simone Tebet (MDB), ficando a posição de vice reservada aos tucanos.

Assim, as candidaturas competitivas agora se resumem a apenas quatro nomes: Lula, Bolsonaro, Ciro e Tebet, dando um voto de crédito às duas últimas por conta de tudo que envolve o processo político eleitoral, por sua própria lógica, pelas surpresas ou ainda manifestações do "sobrenatural". Está aí a presente situação da Colômbia sendo esfregada nos nossos olhos. Merece um comentário ainda a candidatura de Luciano Bivar, pelo União Brasil, o partido com o caixa mais gordo do fundo eleitoral. Parece possível supor que esta candidatura, com risíveis possibilidades de êxito pelo portfólio do seu postulante, foi posta apenas para aumentar o cacife do partido em um segundo turno.

O processo eleitoral pátrio comporta ainda a possibilidade de alguns partidos liberarem seus quadros para votar nos candidatos de suas escolhas, cometendo o que seriam apenas pecadilhos e não um pecado capital. Essa ação se deve em boa parte ao fato desses quadros de partidos "não-ideológicos" e seu eleitorado não se identificarem com as diretrizes de suas direções nacionais. Neste conjunto estão partidos como o próprio União Brasil e mesmo segmentos do PSDB e do MDB arredios às decisões de cima. O PSD de Kassab representa um caso à parte, dado o seu perfil de partido que se alia, no primeiro ou no segundo turno, ao suposto vencedor fazendo sua aposta neste.

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Como se constata, faltando já menos de quatro meses para a realização do pleito, ainda existem algumas brumas no horizonte. Estas devem se dissipar pela imposição do calendário eleitoral do TSE onde se visualizam duas datas: a primeira quando param de jorrar as torneiras do governo federal marcada para julho, cerca de um mês, data em que quem sugou, sugou, e não se suga mais. A segunda data está representada pelas convenções partidárias e o registro de candidaturas, em agosto, dias 5 e 15 respectivamente. Nesse momento, as brumas explícitas estarão removidas, restando apenas o "sobrenatural" para se manifestar.

Assim sendo, parece-nos crível criar três cenários para o desenrolar das eleições: I) baseado nas pesquisas o candidato Lula vem assumindo a posição de liderança com uma margem expressiva de vantagem sobre seu concorrente direto, Bolsonaro. O primeiro cenário seria Lula vencer no 1° turno. Porém, como ainda falta um tempo razoável para o pleito e a campanha propriamente dita não tenha se iniciado, este cenário pode não se concretizar. No entanto, vamos mantê-lo, reservando, portanto, este cenário como exequível; II) o segundo cenário remete a decisão para o 2° turno, com embate entre os dois primeiros colocados nas pesquisas feitas nesses últimos meses, valendo observar que seria uma disputa entre um atual presidente e um ex-presidente; III) este último cenário seria a ascensão de uma terceira candidatura que tiraria o candidato Bolsonaro da disputa, por ser este o concorrente mais próximo.

Por certo, o 3° cenário é o de mais difícil visualização devido a uma expectativa não concretizada de crescimento da candidatura Ciro Gomes até o momento bem como das dificuldades conhecidas de emergência de uma candidatura da 3.a via, só agora concretizada pela definição em torno do nome da senadora Simone Tebet. Este cenário só se torna factível com o atendimento de algumas condições preliminares. Data vênia, permitam-me o seguinte exercício: se o candidato Ciro ao longo dos dois próximos meses alcançar, digamos, 14% nas intenções de voto (lembrando que ele tem um histórico de 12/13% em eleições anteriores) e Tebet atinja 10% por conta do fato de ser uma candidata mulher, o que certamente será explorado em sua campanha e se ela adotar o mesmo padrão de crítica que dirigiu à Bolsonaro por ocasião da CPI da pandemia.

Dispondo de um acumulado de cerca de 24%, as duas candidaturas teriam que se juntar para se apresentarem como única na reta final da campanha. Os votos desses dois postulantes seriam tirados dos dois primeiros candidatos, principalmente de Bolsonaro, e daqueles ainda indecisos. Superado o 2° candidato, Jair Bolsonaro, a dupla Ciro-Tebet estaria se gabaritando para disputar o 2° turno com Lula. Mesmo que haja diferenças expressivas entre as duas proposituras, talvez as semelhanças, objetivos comuns e o cálculo estratégico possam aproximá-los. Separados seria a derrota inevitável, juntos poderá haver uma chance concreta de vitória.

Cabe esclarecer que não estão sendo considerados os seguintes cenários: a) uma vitória de Bolsonaro no 1° turno e b) a exclusão de Lula no 1° turno. So far, so good, como dizem os anglófonos, ou seja, até aqui tudo bem, tudo normal. Mas esse percurso não é assim tão racional e previsível, muito menos asséptico. Se temos brumas na definição das candidaturas, temos brumas também no processo eleitoral em si, com as reiteradas e recorrentes ameaças de golpe por parte do atual presidente, caso não seja ele o ungido pelas urnas.

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A persistente campanha contra as urnas eletrônicas mostra-se um expediente lançado pelo Sr. Jair Bolsonaro para criar uma justificativa de sua provável derrota. Esmiuçando um pouco essa proposição, a dobradinha econômica: desemprego e inflação/ custo de vida, que vai ser a grande eleitora nestas eleições deverá derrubar o candidato da situação. Ele mantém o discurso de 2018: pauta de costumes, armamento da população para defender a Pátria (!) e combate ao comunismo (onde estão os comunistas!?). Se em 2018 isto já soava estranho, assumirá neste 2022 uma dimensão completamente fora da realidade. Agora, sentindo a terra tremer debaixo dos seus pés, tenta de tudo para atrair votos, inclusive com medidas econômicas completamente fora do padrão. São "políticas" não de Estado nem de governo, mas de candidato, como é o caso da tentativa de controle dos preços dos combustíveis. Atos desesperados de alguém que sabe que tem grandes chances de derrota.

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Com o início da campanha propriamente dita e com os debates (aos quais já anunciou que não vai estar presente pelo seu telhado de vidro), serão expostas todas as mazelas produzidas por Vossa Excelência. O elenco destas é amplo, como a destruição da Amazônia, o pouco caso com as Universidades e a Educação em geral, mas podemos sintetizar algumas mais impactantes e tangíveis, como o número de mortos na pandemia, a dobradinha econômica já mencionada, sua incapacidade e inaptidão para governar terceirizando sempre a responsabilidade para outros, onde até Deus tem a sua cota.

Não deixará de ser apontada a sua total falta de empatia. Só para mencionar um caso, foi recentemente à Pernambuco para manifestar uma suposta solidariedade com as vítimas das enchentes e deslizamentos de terra, que produziram mais de 100 mortes. No dia seguinte já estava em Goiás em atividade de campanha em uma motociata, comendo churrasco, rindo abundantemente enquanto os bombeiros em Pernambuco ainda escavavam a lama à procura de corpos. Não é à toa que pesquisas eleitorais já estão medindo a aversão ao seu nome, não mais a rejeição ao mesmo.

Sabendo de sua iminente e provável derrota, a Bolsonaro só resta a tentativa de golpe, coerente com sua negação à vida democrática. Fica no ar quando e qual forma terá. Caso não chegue ao 2° turno, será mais do que claro. Mas a tentativa também poderá ser antecipada na situação em que as pesquisas eleitorais próximas à data do pleito indicarem que corre esse risco. Pode se dar também no próprio dia da eleição com ataques físicos a seções eleitorais, afinal já tem muita arma em circulação, em mãos de milícias e de seus seguidores fanatizados. Tudo isso exige uma vigília permanente da Nação, pois o Bolsonaro de 2022 será muito mais pernicioso ao Brasil do que o de 2018.

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