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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Como interpretar as transições de governo pelo país nas eleições de 2022?

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Por Redação
Atualização:

Fernando de S. Coelho, Doutor em Administração Pública e Governo pela FGV-EAESP. Professor de Gestão Pública da EACH-USP. Coordenador do Lab.Gov da USP

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Guilherme José Rodrigues Rezende, Mestre em Administração Pública e Governo pela FGV-EAESP. Profissional de relações governamentais

Maria do Carmo Meirelles T. Cruz, Doutora em Administração Pública e Governo pela FGV-EAESP. Secretária Executiva do Instituto JUS. Professora de Gestão Pública da FESPSP e da UNICID

Mírian Lucia Pereira, Mestre em Administração Pública pela UNIVASF-PROFIAP. Servidora da UFPE e Coordenadora do Observatório Nacional de Transição Governamental.

Encerradas as eleições na União e nos Estados, o tema em voga, agora, no Poder Executivo federal e nas unidades da federação, é a transição de governo (TG). Em uma acepção temporal, a TG é o período entre a divulgação do resultado do processo eleitoral e a posse do eleito, variando entre três e dois meses no Brasil, a depender se houve um ou dois turnos no pleito.

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O processo de transição de governo no país é relativamente novo como práxis com arcabouço jurídico e estrutura organizacional. Neste ano de 2022 completamos 20 anos da sua institucionalização na União; a Lei 10.609/2002 regeu, na ocasião, uma TG equilibrada entre o presidente FHC (PSDB) e o presidente Lula (PT). Tal legislação, vigente até os dias atuais, oportunizou a nomeação de uma equipe de trabalho com quase 50 pessoas, ocupantes de cargos em comissão transitórios que se extinguiram nos primeiros dias do novo governo.

Com seu reconhecimento internacional e nacional, essa norma inspirou vários governadores, prefeitos e o Poder Legislativo a instituírem orientações e regras, nas eleições subsequentes, para uma TG baseada no ethos republicano e com maturidade democrática no nível subnacional. Como ilustração, menciona-se o caso de Pernambuco que promulgou a Lei Complementar 260, em 6 de janeiro de 2014, para observar os princípios de responsabilidade e transparência na TG no âmbito estadual e aplicável aos seus 184 municípios - de iniciativa, na oportunidade, da deputada Raquel Lyra, recém-eleita governadora do Estado.

Em suma, a importância da TG é a de que o eleito (presidente e governadores, em 2022) e suas equipes de trabalho possam obter, do governo em encerramento, todas as informações sobre o status da administração pública para o ajustamento do plano de governo à realidade e a continuidade administrativa da prestação dos serviços públicos sem transtornos aos usuários-cidadãos. Em adição, como uma política de gestão pública, a TG pode ser utilizada tanto para a avaliação dos programas de governo e a prestação de contas à sociedade em final de mandato, como o planejamento governamental, com desdobramentos nos 100 primeiros dias de governo e na elaboração do Plano Plurianual (PPA), da próxima gestão.

No Brasil, o senso comum supõe que a TG ocorre tão somente perante uma alternância de poder no Executivo, como teremos, por exemplo, no governo federal com a sucessão do presidente Bolsonaro (PL) pelo presidente Lula (PT). E é tal fato, adicionado aos riscos de instabilidade na TG na União entre hoje e o dia 31 de dezembro (vide o discurso lacônico e dúbio de Bolsonaro nesta tarde), que explica todo o rol de manchetes e reportagens dos meios de comunicação no day after das eleições: "Saiba como funciona a transição de governo"; "Como deve funcionar o governo de transição?"; "Quem deve coordenar a transição e quais leis regulamentam o processo?" (...) e assim, sucessivamente.

Lembremos, agora, dos Estados Unidos, uma das principais democracias do mundo, e todo o imbróglio pós-eleitoral entre o presidente D. Trump (Partido Republicano) e o eleito J. Biden (Partido Democrata) em torno do resultado das eleições de 2020, trazendo percalços para um processo de transição de governo regulamentado desde 1963 para a Casa Branca - The Presidential Transition Act of 1963. Muitos não imaginam, mas essas desarmonias em TG são comuns no Brasil, sobretudo em pequenas e médias prefeituras diante de urnas, nas eleições municipais, que contrapõem famílias na disputa pelo poder local e a dinâmica política do personalismo, sem quaisquer procedimentos para a troca de mandatários.

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Na União, mesmo com todo ordenamento jurídico-legal da TG, a cultura de "terra arrasada", com o desejo, velado ou explícito, do perdedor de provocar o desgaste da imagem do vencedor, com estorvos na transição de governo caracterizada por tensões políticas e/ou prejuízos sociais, pode, talvez, pela primeira vez, ter algumas evidências desde aredemocratização do país. O TCU, em ato inédito, ter criado um comitê para monitorar a TG no Planalto Central, e o próprio PT já aventar que o processo pode exigir judicialização, desvelam as incertezas em torno da "passagem de bastão" presidencial neste instante.

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E nos 26 Estados e no Distrito Federal, a quantas anda o processo de transição de governo? Para responder essa questão, grosso modo, deve-se interpretar a TG além do convencional, ou seja, o episódio da alternância de poder, e subdividi-la em três tipos, a saber: a transição de poder ou transição total de governo (TtG); a transição de gestão ou transição parcial de governo (TpG); e a transição de mandato do governo (TmG).

A transição de poder ou TtG relaciona-se com a mudança da coligação partidária no governo, caracterizando uma interrupção política típica da alternância de poder nas democracias.  Neste caso, o pleito eleitoral é marcado por uma disputa entre candidaturas da situação e da oposição, independente se esses grupos políticos estão ou não no mesmo campo ideológico. Esse é o caso, nas eleições de 2022, nos Estados de Pernambuco, São Paulo e Santa Catarina. Em Pernambuco, a primeira mulher eleita para governadora do Estado, Raquel Lyra (PSDB), encerrará a hegemonia de 16 anos do PSB no Palácio do Campo das Princesas; em São Paulo, por sua vez, o novo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) vai quebrar a sequência política de 28 anos do PSDB no Palácio dos Bandeirantes.

Já a transição de gestão ou TpG considera a substituição do chefe do Poder Executivo, mas sem o desfazimento da coalização de poder. Em outras palavras, é a "passagem de bastão" do governo para um sucessor do mesmo partido ou grupo político e/ou apoiado pelo governador atual no pleito eleitoral. Esse é o caso, na atualidade, nos Estados do Amapá, Bahia, Ceará, Mato Grosso do Sul, Piauí e Sergipe. Na Bahia, por exemplo, o governador Rui Costa (PT) elegeu seu correligionário, Jerônimo Rodrigues; a partir de 2023, a gestão do PT no Estado será a mais longeva continuidade política estadual em curso no país, caminhando para 20 anos. No Mato Grosso do Sul, por seu turno, o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) é o primeiro na história política estadual a conseguir fazer seu sucessor, Eduardo Riedel.

E, por fim, mas não menos importante, com a reeleição observa-se uma transição de mandato do governo (TmG). Com o mandatário político no cargo, obtendo um novo mandato, podem ocorrer mudanças na base de sustentação do governo, alterações nas posições de direção pública e/ou reorientação de políticas públicas, o que requer, também, algumas atividades específicas de transição entre o momento pós-eleitoral e o início do novo mandato. Neste caso, temos 18 Estados nessa circunstância, com distintas conjunções: houve a reeleição de governadores eleitos em 2018 (AC, AM, DF, ES, GO, MG, MT, PA, PB, PR, RN, RO, RS e RR), com Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, disputando as eleições sem estar no cargo; ocorreu a reeleição de políticos que foram eleitos como vice-governadores em 2018 e tornaram-se governadores após o afastamento do titular (RJ e TO); teve a eleição de vice-governador eleito em 2018, que assumiu como governador após a desincompatibilização do titular para as eleições deste ano (MA); e decorreu a reeleição de governador eleito indiretamente neste ano, após a desincompatibilização do titular para o pleito e o cargo de vice-governador estar vago (AL).

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O infográfico, abaixo, representa esses três tipos de transição de governo, supracitados, nas unidades da federação do país, considerando as eleições de 2022.

 Foto: Estadão

É tempo, portanto, de acompanhar a transição de governo na União e nos Estados brasileiros, sobretudo em Pernambuco, São Paulo e Santa Catarina que, assim com no governo federal, têm uma alternância de poder ou TtG. E, quem sabe, o ressurgimento do tema na agenda política e dos meios de comunicação, diante das indefinições e apreensões no processo de TG no Palácio do Planalto, não estimulem, definitivamente, a sua institucionalização por Lei em todos os Estados brasileiros e mesmo nos municípios, neste caso, pensando o processo eleitoral de 2024.

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