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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

A ilusão do rápido aprendizado nos seres humanos

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Por Redação
Atualização:

Gustavo Corrêa Mirapalheta, é professor do Departamento de Tecnologia e Ciência de Dados (TDS) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP-FGV).

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Virou moda em tempos recentes comparar o tempo que uma pessoa adulta leva para "aprender" a diferença entre duas categorias de imagens e o tempo que leva para treinar uma rede neural com várias camadas (estrutura conhecida por Deep Learning) a ser capaz de realizar a mesma tarefa. Nada poderia ser mais equivocado!

Uma regra clássica da matemática (e da estatística) é que não podemos somar "laranjas" com "bananas" e supor que o resultado será "uma maçã", ou seja, para comparar dois resultados eles devem estar medidos na mesma "régua". E é exatamente este equívoco que está ocorrendo no momento. Um ser humano adulto de digamos 25 anos de idade, tem a seu dispor, uma rede neural com 10 bilhões de neurons, interligados por 10 trilhões de sinapses, com um infindável número de camadas, interligadas através de circuitos dos mais diversos tipos, inclusive com sistemas de feedback entre sí. Este vasto sistema, o qual tornaria a mais complexa rede neural artificial de aprendizado "profundo" (Deep Learning) que tenhamos criado até hoje, "rasa" que nem um pires, passou por pelo menos 70.000 horas de treino ao longo dos seus supostos 25 anos de existência. Isso sem contar as 70.000 horas de reparo ("sono") e 70.000 horas de operação regular ("tarefas do dia a dia").

Sendo assim, seria de espantar se uma pessoa não fosse capaz de rapidamente reconhecer as mais diversas imagens e os mais diversos textos em sua lingua mãe. A dificuldade e o tempo que leva para ensinar, mesmo uma rede fantástica como o cérebro humano, pode ser apreciada se tentarmos fazer o mesmo aprender coisas realmente novas. Por exemplo: uma lingua estrangeira cujos textos sejam baseados em ideogramas e não em letras. Tente aprender chinês em uma semana e você vai entender o que eu estou falando. No entanto, redes neurais de propósito específico, após 12 ou 24 horas de treino são capazes de traduzir chinês para o inglés e vice-versa, sem maiores problemas.

Desmistificar a idéia de que o cérebro humano requer poucos exemplos e pouco tempo para aprender e que portanto ele tem de ter uma estrutura completamente diferente daquela utilizada por nossas redes de Deep Learning é essencial, justamente para adequar as expectativas das pessoas em relação aos futuros sistemas de inteligência artificial. O problema do aprendizado, em sua forma mais elementar, se não foi resolvido pelo menos está "bem encaminhado". E esta solução é a estrutura de Deep Learning, com aprendizado supervisionado (ou pelo menos por reforço) utilizando o método Back-Propagation & Gradient Descent. A partir deste trio, um dia, quem sabe, chegaremos à inteligência artificial genérica.

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No entanto, ainda estamos MUUUUUUUUUUITO longe da mesma. Se não por nada, pelo fato das nossas redes neurais terem de ser treinadas em ritmo alucinante, se comparado com o ritmo de aprendizado de uma pessoa. Sim, o nosso ritmo de aprendizado é MUUUUUUUUUUITO lento. E isso, apesar de sermos dotados (ou talvez pelo fato de precisarmos utilizar) uma rede neural de complexidade inimaginável pelos padrões atuais.

Precisamos métodos de acelerar o treino das redes que temos hoje, mas é ilusão acreditar que a natureza foi capaz de criar um sistema que aprende rápido. O maior sistema de deep learning que a natureza já criou (o nosso cérebro) requer uma quantidade de treino impensável! O que precisamos entender é como alavancar o treino de uma rede neural em outras redes, da mesma forma que nascemos com estruturas prontas para aprender determinadas tarefas (tais como falar e enxergar). Mas é ilusão achar que temos de exigir um padrão "humano" das máquinas, não porque seria "injusto" com as redes atuais, mas justamente porque a melhor rede de deep learning que temos a disposição no momento, nos mostra que aprender é uma tarefa longa, desgastente e que requer, muito, mas muito, esforço da estrutura que passa por tal processo.

Quem viver verá!

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