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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

A Administração do século 21: um campo de saber à procura de uma nova legitimidade

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Por Redação
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Autora:  Maria José Tonelli é Professora Titular da Eaesp-FGV

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Com início nos Estados Unidos e na França ao final do século XIX, o campo da Administração reúne hoje um conjunto acumulado de conhecimento de mais de cem anos. Trata-se de um vasto conjunto de pesquisas, permeado por especialidades e fragmentações, aliás, como em vários outros campos científicos. Em face de outras áreas de conhecimento, esse tempo pode indicar uma ciência recente, especialmente no Brasil, onde cursos de graduação em Administração de Empresas se espalharam rapidamente, na maioria das vezes, de modo superficial e pouco consistente (Bertero, 2006).

Embora dados do MEC registrem hoje mais de 2000 cursos de graduação em Administração, mais de 100 programas de Mestrado e Doutorado e aproximadamente 10.000 cursos de pós-graduação latu sensu, há um questionamento sobre a legitimidade social de um campo que parece ter se descolado das necessidades práticas do Brasil contemporâneo.

Mas não é só no Brasil que o ensino de Administração tem sido problematizado. Nos Estados Unidos a profissão não alcançou o mesmo prestígio dos advogados, engenheiros ou médicos.  Khurana (2007) aponta que parte desta desvalorização decorre do descolamento do ensino dos negócios de questões essenciais da sociedade, para além do lucro imediato. É necessário ir além das competências técnicas e resgatar valores no exercício dessa profissão (Khurana e Nohria, 2008). Também na área de Direito há uma busca por novas propostas de ensino que possam diminuir a distância entre as necessidades contemporâneas atuais e as formas tradicionais de ensino (Vieira, 2012).

Hoje, mais do que nunca, o mundo precisa de administradores privados e públicos que possam atender, com seu saber especializado, domínio de tecnologias apropriadas e princípios éticos, às inúmeras demandas sociais no campo da gestão. É necessário que o conhecimento da pesquisa esteja voltado para questões práticas, que demandam interdisciplinaridade, em parcerias que desenvolvam soluções compartilhadas entre nas áreas de administração de empresas, administração pública, empresas e organizações públicas. A sociedade se beneficiaria destas parcerias ainda pouco desenvolvidas no nosso país.

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Esta perspectiva, presente no modelo de Humboldt desenvolvido para a Universidade de Berlim em 1808, surpreendente para a época, e ainda de muito valor para dias de hoje, parece ter se distanciado das universidades atualmente. O modelo de ensino humboldtiano, que propõe o desenvolvimento e o uso da ciência com foco em problemas práticos é uma proposta que ultrapassa o conceito de profissão, propondo a combinação da ciência com a formação intelectual e o desenvolvimento social e coletivo.  Além disso, autonomia e liberdade são questões essenciais neste modelo (Pereira, 2009). Entretanto, a maior parte das instituições brasileiras de ensino em Administração de Empresas e Administração Pública não alia ensino à pesquisa.

Além disso, por necessidades práticas impostas pelo contexto atual, empresários, administradores de empresa e administradores públicos passaram a considerar nas suas atividades profissionais não só os temas clássicos de finanças, estratégia, marketing, operações, mas também questões emergentes como, por exemplo, sustentabilidade, gênero, direitos humanos, ética e transparência, impacto social dos negócios, mudanças demográficas, entre outros. Da mesma forma, para atender essas mudanças globais, o ensino da administração de empresas e administração pública passou por transformações fundamentais nestes últimos anos. Muitas escolas tradicionais e mundialmente renovadas nestes campos têm buscado inovação tanto em conteúdos necessários para enfrentar um mundo em transição como em tecnologias de ensino que se ajuste a esses novos tempos.

 

No século 21, a educação continuará sendo uma das questões centrais para o desenvolvimento do Brasil. As novas gerações precisarão enfrentar desafios do contexto global, como, por exemplo, a redefinição nas relações geopolíticas que colocaram o Brasil em destaque, demandas por produtividade, desequilíbrio entre recursos existentes e a demanda, interconectividade crescente, mudanças demográficas, mudanças no clima, entre outros fenômenos que pedem soluções articuladas entre aqueles que fazem a gestão governamental  e das empresas privadas. A crise econômica do início deste século já apontou para o declínio da confiança nos negócios e a necessidade de governanças cada vez mais compartilhadas em prol do bem comum e da continuidade da civilização e da civilidade. O maior desafio contemporâneo, local e global, parece estar em conciliar o sucesso das empresas públicas e privadas com uma sociedade próspera e justa (Charléty, 2012). Tratam-se também de desafios que a gestão de empresas privadas e a gestão pública precisarão enfrentar no Brasil.

Referências

BERTERO, C. O Ensino e Pesquisa em Administração, São Paulo, Cengage Thomson, 2006.

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CHARLETY, P.(org.) Corporate Governance and Leadership, White Paper, 1st Internacional Forum, Council on Business and Society,  Paris, 2012.

KHURANA, Rakesh  From higher aims to hired hands (the social transformation of American Business Schools and the unfulfilled promise of management as a profession),Princenton, New Jersey, Princeton University Press, 2007.

KHURANA, R. , NOHRIA, N. It's time to make management a true profession, Harvard Business Review, October, 2008.

PEREIRA, E.M.de A. A universidade da modernidade nos tempos atuais, Avaliação, Campinas, Sorocaba, v.14, n.1, p.29-52, março 2009.

VIEIRA, O.V. Desafios do ensino jurídico num mundo em transição: o projeto da Direito GV. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 261, p.375-407, set-dez 2012.

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