Idioma nosso de cada dia:
ignorado,
amarfanhado
e, para muitos, parece
até incognoscível.
Uma ode à sua relevância,
enquanto alguns desconhecem a sua face.
Incrível?
Façamos uma prece
à sua santidade!
Anjo recôndito,
blindado nos alfarrábios,
mas que dança nos lábios
como samba no carnaval.
Na boca da gente,
transfigura-se
e fica maleável,
flexível, monumental!
A estrutura castiça,
formal,
assusta a pessoa simples,
todavia,
é destrinchada
no palato do povo,
indiferente às gramáticas.
Marcescível,
repleto de corruptelas
e gostoso.
Nas ruas, usamos suas letras
pro nosso gozo.
Ah, Camões,
quantos versos profligaria
com essa ousadia,
com tantas modificações?
Eça, Machado, Drummond,
Manoel de Barros...
Quantos gigantes carregou em seus braços?
Entretanto, o melhor mesmo
é o português falado
na esquina,
no botequim,
no cabeleireiro,
no bate-papo entre amigos,
na padaria, no posto de gasolina...
Sabe por quê?
Porque é verdadeiro,
de fala genuína
e pura!
Esse é o porquê.
E arranca,
olho no olho,
gargalhadas,
amplexos,
lágrimas
e muxoxos.
Nada insosso,
conquanto complexo...
Nada pernóstico,
apenas sinceridade,
análises,
vaticínios,
prognósticos,
pulcritude.
Sua idade
é a do tempo
que embala o rebento;
evolui com o vento,
prestigia talentos.
Ostenta muitas regras,
exceções, estilos,
engalana
ou lança na lama
pronunciamentos.
Língua pátria,
genetriz de nossas profundas aspirações,
acicata nossos alentos,
difunde nossas emoções.
Deitamos em seu colo
a toda hora,
em cada momento.
No brado
e também no silêncio.
Por seu meio, mostramos,
de certa maneira,
nossa cara ao mundo.
E quem somos na eternidade efêmera
de cada instante,
de cada segundo...
*João Linhares, integrante da Academia Maçônica de Letras de MS. Promotor de Justiça/MPMS. Mestre em Garantismo e Processo Penal pela Universidade de Girona, Espanha. Especialista em Jurisdição Constitucional e Direitos Fundamentais pela PUC - RJ