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Vacinação obrigatória e o risco de ações trabalhistas

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Por Martha Macedo Sittoni
Atualização:
Martha Macedo Sittoni. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Diante do cenário atual da pandemia, chega-se ao momento em que as atenções estão todas voltadas para a vacinação da população, de onde os empregadores já começam a mirar sua atenção aos impactos que a vacinação terá nas relações trabalhistas.

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Havendo significativas evidência de que uma parcela dos trabalhadores poderão apresentar resistência em ser vacinados, e valendo-se da decisão do STF, ocorrida em 17 de dezembro de 2020, em que julgou pela constitucionalidade da obrigatoriedade de imunização por meio de vacina, que registrada em órgão de vigilância sanitária tenha sido incluída no programa nacional de imunizações, diversos artigos e pareceres passam a ser publicados, principalmente titulando que o empregado que se recusar a tomar vacina ou usar máscara poderá ser demitido, encorajando muitos empregadores a tomar tais medidas.

No mais recente parecer, o Ministério Público do Trabalho apresenta entendimento de que os trabalhadores que se recusarem a tomar a vacina contra a covid-19 sem apresentarem razões médicas documentadas poderão ser demitidos por justa causa. Ressalva, e de forma acertada, que as empresas devem investir em conscientização e negociar com seus funcionários, mas o entendimento é de que a mera recusa individual e injustificada à imunização não poderá colocar em risco a saúde dos demais empregados.

Tal posicionamento se embasa no fato de a vacinação se tratar de uma questão de saúde pública, interesse coletivo e segurança no trabalho, essencial, assim, para a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, conforme previsto no artigo 7º, XXII, da Constituição Federal, combinado com o dever da empresa de cumprir e fazer cumprir normas de segurança e medicina do trabalhando instruindo empregados quanto à precauções de doenças e adotar medidas determinadas pelo órgãos competentes, conforme estipula o artigo 157 da CLT.

Alertamos, no entanto, sobre a complexidade do tema, o qual não nos permite, salvo melhor juízo, uma resposta tão simples e definitiva, quando ainda se discute se haverá insumos para atender aos  primeiros grupos prioritários de vacinação, sendo até difícil prever quando teremos um cenário em que a maior parcela da população já terá tido a oportunidade de se imunizar.

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Ademais, no caso das vacinas contra a Covid-19, não há, ainda, qualquer medida de Estado obrigando a vacinação, o que só pode ser determinado por lei específica, conforme exposto pelo próprio julgado do STF. Se o próprio Estado não obriga à vacinação, é certo que o empregador não pode obrigar.

O artigo 5º, II, da Constituição Federal, é claro quanto a ninguém ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei. Esse é o princípio da legalidade que rege todo o ordenamento jurídico. Nesse sentido, constranger alguém, mediante grave ameaça (dispensa por justa causa), a fazer o que a lei não manda, pode configurar crime, nos termos do artigo 146 do Código Penal.

Por essas questões, respeitando entendimentos contrários, a tese de que o empregador pode obrigar o empregado a tomar vacina, sob pena de sanções trabalhistas, é temerária e não recomendável a empresa na situação atual.

Em contrapartida, para contornar a situação, o empregador pode -- e deve -- adotar outras medidas até que a pandemia seja extinta ou reduzida a um patamar inofensivo, tais como a promoção de campanha de vacinação dentro da empresa; Promover a vacinação particular (quando e se chegar a ser possível) e voluntária de empregados; dar continuidade das demais medidas de proteção, como exigência de máscaras, uso de álcool em gel, higienização diferenciada do ambiente e objetos; fomentar o trabalho remoto de empregados pertencentes a grupos que possam compor o rol de contraindicações das bulas da vacina, tais como gestantes, lactantes e pessoas com alergia severa a substâncias contidas nas vacinas.

As medidas mencionadas certamente cumprem os deveres previstos na Constituição Federal de cuidados com a saúde, higiene e segurança no trabalho, sem gerar riscos de debate sobre sua viabilidade em momento futuro.

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*Martha Macedo Sittoni é advogada trabalhista e previdenciária e sócia do CMT Advogados

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