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Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

Um tiro no pé

Por Paulo Klein
Atualização:
Paulo Klein. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A recentíssima decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, pode criar um precedente gravíssimo no enfrentamento da criminalidade, ao usurpar a competência constitucional dos órgãos da administração pública vinculados ao Poder Executivo. Ela mantém restrições a incursões policiais em favelas do Rio de Janeiro durante a pandemia e as condiciona à apresentação de um plano ao STF.

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A decisão dos excelentíssimos ministros do STF revela o absoluto desconhecimento da atividade policial e, ainda, reforça o estigma de que as ações dos policiais do Estado do Rio de Janeiro não estariam revestidas de nenhum planejamento. E destaca, em sua essência, um suposto sentimento desses agentes de segurança de total desprezo pela vida dos cidadãos.

A história recente do país já nos revelou o desastre que foi o Poder Judiciário tentar se apresentar como o ator principal do "combate à corrupção", especialmente no caso da criminalidade do "colarinho branco". De início, relembremos, o STF referendou diversas medidas que, até então, só aumentaram o poder de um determinado grupo de juízes e membros do Ministério Público, tendo como resultado o próprio tribunal reconhecer que boa parte daquelas medidas deveria ser anulada, porque desrespeitaria diversos direitos e garantias fundamentais. Alimentaram um "monstro", que se autodenominou Lava-Jato, para, ao final, reconhecerem que esta esteve em absoluta dissonância com a ordem jurídica do nosso país, como bem assentado no brilhante voto do ministro Gilmar Mendes.

Mais uma vez, ao colocar-se como ator principal de um tema extremamente complexo, de absoluto desconhecimento dos ministros da mais alta Corte do país, é certo que o resultado da decisão trará efeitos perversos e irreversíveis, que tendem a piorar a situação da segurança pública do Rio de Janeiro, que já se encontra insustentável.

Primeiro, porque estamos tratando de agentes de segurança que são mal remunerados, com uma escala de trabalho exaustiva, submetidos à pressão dos superiores hierárquicos. Não por outro motivo, o número de policiais afastados por doenças psiquiátricas é recorde. Somado a essa informação macabra, temos o número significativo de suicídios e mortes no exercício da atividade policial.

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Segundo, de um lado a sociedade exige policiamento ostensivo, investigações que revelem a autoria e materialidade da prática de crimes em tempo real e, ao mesmo tempo, cobra punições a esses mesmos agentes de segurança no primeiro alarido da imprensa. Exigem o emprego de força policial, mas, quando algo dá errado, são os primeiros a exigir uma punição sumária.

O resultado dessa equação é o afastamento gradual dos agentes policiais das atividades diárias nas ruas, o que, no curto e médio prazos, nos levará ao caos total, pois eles são a última barreira entre a criminalidade e a sociedade, queiramos ou não.

A bem da verdade, o agente de segurança pública não espera o reconhecimento da sociedade ou dos superiores hierárquicos, não almeja o enriquecimento pessoal, confia, cada dia menos, que em algum momento possa ser respeitado e que não seja punido pelo simples exercício de sua atividade, prevista na ordem jurídica de nosso país.

*Paulo Klein, advogado - Área Direito Penal e Processual. Sócio-fundador do escritório Klein & Giusto. Pós-graduado em Direito Penal Econômico pelo IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais em convênio com a Universidade de Coimbra, em Portugal, membro da Comissão de Direito Penal da OAB de Petrópolis/RJ

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