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Um panorama dos retrocessos e avanços na política ambiental em 2017

Por Luciana Lanna
Atualização:
Acervo Pessoal Foto: Estadão

Já não é de hoje que as questões ambientais têm sido, progressivamente, protagonistas na sociedade brasileira. Além disso, nos últimos anos, o Direito Ambiental vem ocupando lugar de destaque no âmbito governamental.

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Apesar da atenção e comoção que o tema tem gerado, ao analisar com um olhar crítico o passado, fica claro que o contexto no qual o Direito Ambiental se desenvolve não é positivo.

Dessa forma, elencamos algumas questões que merecem destaque nesse balanço retrospectivo.

Desmatamento Em maio de 2017 completamos 5 anos da vigência do Código Florestal, mas sem muito a comemorar. O seu objetivo é justamente conciliar conservação ambiental com produção agropecuária e desenvolvimento socioeconômico, mas estamos longe de alcançar essa relação.

O Código Florestal ainda apresenta problemas na implementação, como a falta de regulamentação dos instrumentos, especialmente o Cadastro Ambiental Rural, um dos principais alvos das ressalvas feitas pelas organizações ambientais pela falta de mecanismos efetivos de monitoramento e aplicação de penalidades mais severas.

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Dessa forma, infelizmente a conclusão forçosa é que o novo Código Florestal contribuiu para o aumento do desmatamento em 75% desde que as mudanças foram aprovadas, a partir de 2013.

Diante desses resultados ultrajantes, em junho de 2017 a Noruega cortou o repasse ao Fundo da Amazônia à metade.

Ainda relacionado ao tema desmatamento, houve também grande clamor público em torno da tentativa do governo em extinguir a Reserva Nacional do Cobre e associados (RENCA). Neste caso, o que mais chamou a atenção foi a falta de informação técnica e a fragilidade do atual governo, visivelmente desprovido de política ambiental consistente.

É fato que a desafetação da RENCA deveria ter sido proposta com maior planejamento e envolvimento do Ministério do Meio Ambiente, mas não há que se falar em prejuízo ambiental já que a RENCA nunca foi unidade de conservação, não tendo sido concebida como espaço ambientalmente protegido e dificilmente geraria aumento no desmatamento, ao contrário, coibiria o garimpo e a exploração ilegal de madeira na Amazônia.

Sem falar que, mesmo com sua extinção, grande parte da área (70%) continuaria bloqueada em face das unidades de conservação e terras indígenas presentes em seu território.

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Lei Geral do Licenciamento Ambiental Também muito se discutiu sobre a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, em vias de ir a Plenário. É fato inconteste que o direito brasileiro urge por uma lei geral disciplinadora da matéria.

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Atualmente, o licenciamento está previsto em legislação esparsa, desde a Lei Complementar nº 140/2011, tão necessária para disciplinar a definição de competência dos órgãos ambientais até resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), em grande parte setoriais e instruções normativas de cada órgão ambiental com procedimentos diversos.

O objetivo da lei é mitigar a principal fragilidade do ordenamento jurídico ambiental, que é a consolidação da prática do licenciamento, concedendo-lhe legalidade e, consequentemente, reduzindo a judicialização das questões do direito ambiental e fomentar a eficiência no processo de licenciamento.

No entanto, um dos seus fundamentos para a realização desses objetivos é, ao mesmo tempo, considerado um ponto polêmico do projeto: a ampliação do papel dos estados e municípios para a condução do licenciamento.

O motivo da polêmica fundamenta-se no temor de uma guerra fiscal ambiental. Trata-se de análise precipitada e infundada. Na escolha da localização de um empreendimento fatores como logística, mercado e mão de obra tendem a pesar mais do que possíveis facilidades no processo de licenciamento e, em outras atividades, a rigidez locacional se dá pela sua própria natureza, como por exemplo, a exploração de uma jazida mineral ou de aproveitamentos hidrelétricos.

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Sem falar que a federação brasileira se constitui a partir da premissa de que, para um melhor governo, a tomada de decisão nas três esferas de poder deverá, sempre que possível, ser praticada mais próxima dos fatos que a originaram e dos seus destinatários.

Desta forma, para se evitar possíveis irregularidades cometidas pelos estados e municípios, não se deve restringir sua capacidade de atuação e sim assegurar a fiscalização efetiva dos seus atos.

Em todo caso, o projeto de lei é positivo para o direito ambiental, e atualmente encontra-se pronto para pauta no Plenário da Câmara dos Deputados.

Mudanças Climáticas: Acordo de Paris

Também foi assunto recorrente a retirada dos EUA do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas. A repercussão política de sua saída é tão grave quanto a repercussão ambiental.

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Com a recusa de Trump em contribuir com o fundo climático, cujo objetivo é acelerar a transição energética dos países em desenvolvimento, assim como sua adaptação aos efeitos do aquecimento, enaltece a discussão entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento (leia-se China, Coreia do Sul, Cingapura e das nações ricas em petróleo) de quem cobrirá o saldo negativo.

A saída dos EUA afetou o otimismo em torno do Acordo de Paris e, infelizmente, a discussão corre sério risco de esvanecer em razão da questão financeira.

O que, no entanto, é incontestável, é que se não houver mudanças drásticas no paradigma de produção industrial e consumo, o aumento dos eventos climáticos extremos será progressivo e sistemático.

Neste ano dois furacões de força 4 (Harvey e Irma) atingiram o continente americano. Ondas de calor assolaram o Oriente Médio e a Argentina, sem falar nas secas e calor intenso que ocasionaram incêndios florestais de proporções bíblicas em uma série de países.

O Brasil, na contramão, apresentou aumento no seu desmatamento, sendo ainda insatisfatório o ritmo do desenvolvimento de uma política energética com matriz diversificada e limpa.

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As questões destacadas nesse artigo possuem como pano de fundo a difícil relação entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental. A mudança de paradigma é urgente. Se não houver a inserção de fato da sustentabilidade socioambiental como critério de desenvolvimento, não haverá avanços e os governos e a sociedade assumirão sempre uma conduta reativa diante de questões que envolvem a própria viabilidade existencial humana.

É fato que a problemática ambiental sempre parte da exploração dos recursos naturais sem critérios, motivada por valores de dominação e colonização, materializados na capacidade de posse econômica e consumo (http://revistas.ufpr.br/made/article/view/13427/9051).

Dessa forma, a instituição de políticas públicas e o exercício de poderes governamentais de nada adiantarão se a mudança de paradigma não for apoiada numa mudança moral e ética.

* Luciana Lanna, advogada especializada em Direito Ambiental, sócia de Viseu Advogados

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