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Um caminho para aumentar a eficiência na gestão do Judiciário

Por Sandra Negri
Atualização:
Sandra Negri. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O estabelecimento de metas e de ferramentas da gestão por governança pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é um alento para o Judiciário brasileiro, que fez por merecer, ao longo de décadas, uma imagem anacrônica. Mesmo que os modelos burocráticos e gerencialistas ainda prevaleçam no país, em pleno século 21, alguns magistrados têm dado ótimo exemplo de uso das boas práticas gerenciais, indicando que poderemos ter, em breve, uma nova realidade no sistema de Justiça.

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Um caso de sucesso é o da 4ª Vara Federal de Niterói, cujo titular é o magistrado William Douglas. Recentemente, ela se tornou uma das pouquíssimas varas do país a esgotar seu acervo de processos. Isso significa que o gabinete está apto a julgar os novos processos recebidos com a celeridade determinada pela Constituição porque, justamente, não tem pendências antigas para resolver.

Para chegar a esse cenário ideal, o juiz Willian Douglas adota, há muitos anos, um sistema de gestão que leva para o dia a dia do gabinete os princípios democráticos de liberdade, equidade, capacidade de resposta, transparência, participação e cidadania. O resultado é que os servidores da vara não só reconhecem o magistrado como um líder como se referem ao ambiente de trabalho com termos como "comunidade que aprende" e ao c chefe como um "gestor educador".

Tive a oportunidade de encontrar o bom exemplo da 4ª Vara Federal de Niterói durante minha pesquisa de doutorado, em que busquei por magistrados brasileiros que fossem, ao mesmo tempo, gestores com bons índices de produtividade, inovadores no trato humanitário e produtores de valores públicos. O resultado da pesquisa foi apresentado na Universidade Nove de Julho à uma banca que incluiu o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), e foi indicada ao Prêmio Capes de Teses de 2020.

A partir de levantamentos estatísticos sobre o Judiciário e de dados dos próprios tribunais foi possível encontrar a vara comandada pelo juiz Willian Douglas. A Classificação de Desempenho publicada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), por exemplo, atribui a ele elevados índices de produtividade. O Prêmio Innovare chegou a colocá-lo entre os exemplos de Boas Práticas de Gestão do Poder Judiciário e o CNJ o incluiu no Planejamento Estratégico do Poder Judiciário por meio da Resolução 70/2009.

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Na entrevista que realizei para colher informações para a tese, Douglas informou aplicar lições do administrador William E. Deming, que defende que cada colaborador é reconhecido e se percebe como gestor e fiscal da qualidade dos próprios serviços e atividades. Além disso, no ambiente construído pelo magistrado estão presentes diversos elementos abordados também na obra de outro importante estudioso da área, Mark Moore, especialmente quanto à capacidade de produzir valores públicos judiciais de gestão. Na obra "Creating public value: strategic management in government", Moore tratou dos custos e benefícios que os serviços públicos podem promover, não apenas monetários, mas em relação à preservação dos princípios democráticos que estão presentes no gabinete de William Douglas.

Verifiquei que a equipe da vara absorve bem a hierarquia e, concomitantemente, partilha ideias, colaborando os membros uns com os outros, sendo ouvidos quando da tomada de decisões administrativas. O valor público da cooperação, que permite aos atores processuais colaborar para o bom andamento do processo judicial é bastante incentivado. A cooperação é uma valiosa ferramenta de trabalho na execução de encargos de cada colaborador da equipe de trabalho. Destaca-se o trabalho integrado em rede, para a resolução de múltiplas tarefas, inclusive com o uso de fluxogramas criados internamente. O valor público da efetividade, significando a produção de resultados jurídicos no plano material do destinatário do serviço de justiça, é objetivo de atenção dupla. Além das metas recebidas das instâncias superiores e do CNJ, a vara tem metas internas, definidas pelo próprio grupo.

A boa governança no Poder Judiciário é uma abordagem de gestão e também um produto do serviço de Justiça, capaz de oferecer legitimidade, qualidade e confiança ao Estado-julgador. Os valores públicos são normatizados e ditados pelo Poder Legislativo. Assim, o serviço judicial deve tornar realidade os valores gerais da administração pública, como estabelecido pelo artigo 37 da Constituição Federal e, além disso, produzir valores exclusivos do Poder Judiciário.

*Sandra Negri é advogada, mestre em direito, doutora em administração, integrante do Conselho Universitário e professora de direito da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT)

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