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Um breve balanço da jurisprudência atual sobre a Lei Geral de Proteção de Dados

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Por Camila Lima Mansur da Cunha
Atualização:
Camila Lima Mansur da Cunha. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Após seu primeiro ano de vigência, o que muito se questiona é como a LGPD tem sido suscitada judicialmente pelas partes e, consequentemente, aplicada pelos Tribunais.

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Em resposta a esse questionamento, o Centro de Direito, Internet e Sociedade (CEDIS-IDP) do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e o Jusbrasil divulgaram recentemente o resultado do IDP Privacy Lab, excelente projeto que visa estudar sobre Proteção de Dados e Direitos Fundamentais, bem como analisar como a jurisprudência vem decidindo as questões que envolvem a LGPD.

Foram mapeadas decisões proferidas em tribunais estaduais, trabalhistas, federais, eleitorais, além dos Tribunais Superiores, sendo criado um banco de dados dinâmico e de fácil manuseio abrangendo 274 decisões que aplicam, de algum modo, a LGPD.

Temas como "Tratamento de dados na investigação criminal", "Fraude nas relações de consumo decorrentes de uso indevido de dados" e "Danos morais decorrentes de vazamentos ou uso indevido de dados pessoais" estão entre os mais recorrentemente presentes nas decisões. Ainda assim, a matéria relacionada aos danos morais tem se mostrado bem menos frequente do que se imaginava, não sendo sequer possível se observar uma tendência unificada sobre se o incidente de segurança gerará ou não presunção de danos morais independentemente da comprovação de prejuízos (o TJSP posicionou-se em uma de suas decisões sobre ser necessária a demonstração do prejuízo, não sendo possível o dano in re ipsa - dano moral presumido).

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), até o momento, analisou a LGPD como argumentação complementar (i) contra o compartilhamento indevido de dados sem o consentimento do cliente em caso de fraude em contratação bancária; (ii) ao marco civil da internet, em proteção dos dados pessoais na ausência de indício de ilícito e fundado motivo para a sua divulgação; e (iii) aos princípios da liberdade de expressão e privacidade, entendendo prevalecer os benefícios da criptografia de ponta a ponta às eventuais perdas pela impossibilidade de se coletar dados das conversas dos usuários da tecnologia.

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O Supremo Tribunal Federal (STF), por sua vez, pondera se o sigilo prevaleceria em relação ao interesse público em investigações: há julgado que permite o compartilhamento de dados pessoais e dados pessoais sensíveis para fins de investigação, devendo esta permanecer, por sua vez, sob rigoroso sigilo; há, por outro lado, julgados que ponderam a necessidade de proporcionalidade e adequação ao objeto da investigação, de modo a serem preservados dados pessoais irrelevantes para tal fim, sob pena de manifesto risco de violação injustificada da privacidade.

Ainda dentre suas decisões, o STF (i) possibilita a publicização de dados para aprimorar a execução de políticas públicas, com as advertências e cuidados necessários no seu tratamento e anonimização; e (ii) posiciona-se como sendo medida de prudência que a Corregedoria Nacional de Justiça promova estudos técnicos para análise da necessidade de compatibilização de seus provimentos com os ditames da LGPD. Nas demais decisões por ele proferidas, a LGPD é apenas citada, não sendo, por ora, enfrentada qualquer outra matéria relevante.

Em suma, neste primeiro ano de vigência, o que mais pudemos observar foi o enfrentamento e a interpretação de princípios e conceitos trazidos pela LGPD, tanto como norma principal como regramento complementar na aplicação ao caso concreto.

Além das decisões jurisprudenciais, o tema da proteção de dados ganhou tamanha relevância que se tornou Proposta de Emenda Constitucional para sua inclusão dentre os direitos fundamentais do cidadão. Referida PEC foi recentemente aprovada em 2º turno pelo Senado, seguindo, portanto, para promulgação no Congresso, sem necessidade de passar por sanção presidencial.

Certamente, o aculturamento das normas da LGPD dependerá de tal posicionamento jurisprudencial sobre a sua aplicação nos casos concretos, em conjunto às orientações a serem publicadas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados que tem como funções zelar, implementar e fiscalizar o cumprimento desta norma em todo o território nacional. E sua inclusão na Constituição Federal como direito fundamental ampliará mais ainda o seu alcance e eficácia em eventual ponderação com os demais princípios e direitos constitucionais.

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*Camila Lima Mansur da Cunha, advogada do escritório VBD Advogados

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