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Tributar dividendos não é medida para combater pejotização

Por Renato Souza Coelho
Atualização:
Renato Souza Coelho. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Um argumento muito utilizado por aqueles que defendem a tributação dos dividendos no Brasil é que os regimes fiscais alternativos para tributação das pessoas jurídicas - essencialmente Simples Nacional[1] e lucro presumido - permitem que as empresas sejam subtributadas. A principal crítica feita a esses regimes, da qual não discordamos, é que eles propiciam a obtenção de uma alíquota efetiva muito baixa, a despeito da alíquota nominal de 34% (para o lucro presumido).

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A despeito dessa constatação, não nos parece que a solução legislativa para essas possíveis distorções seja a tributação de dividendos, até porque seus efeitos seriam estendidos para todas as demais empresas, incluindo as que apuram o IRPJ e CSLL pelo regime do lucro real e outras no lucro presumido que pagam adequada carga tributária sobre a renda.

Se a conclusão é de que o regime do lucro presumido permite que determinados segmentos não tributem grande parte dos seus lucros e que sua carga efetiva é baixa, o mais natural seria, então, endereçar essas distorções - e não mudar apenas a regra de incidência tributária sobre os dividendos pagos por todo e qualquer tipo de empresa.

Para não haver "dupla não tributação" do lucro das empresas que apuram o IRPJ e CSLL pelo regime do lucro presumido, deveriam ser analisadas as razões para existência dessa distorção. Parece-nos evidente que, se isso acontece, é porque os atuais e limitados coeficientes de presunção previstos em lei não refletem adequadamente a margem de diversos negócios que podem optar por esse regime.

O combate desse problema seria mais pertinente com a criação de uma escala maior de coeficientes de presunção do lucro que reflitam de forma mais fidedigna a margem de lucro de determinados setores da economia. Por exemplo, um único coeficiente de presunção de lucro de 32% para empresas prestadoras serviços em geral, sejam elas com atividade puramente intelectual, de um lado; ou uma atividade de empreitada parcial com emprego de materiais, de outro, nos parece bastante distorcido.

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Essa possível subtributação de determinadas atividades no lucro presumido não se endereça por meio da tributação de dividendos para todas as empesas do país, tampouco com o fim desse regime. É a imprecisão dos coeficientes de presunção existentes que gera dupla não tributação da renda e não o lucro presumido em si ou a isenção de dividendos.

Defensores da tributação de dividendos sustentam, ainda, que a revogação da isenção acabaria com o uso (indevido) de pessoas jurídicas para prestação de serviços de caráter intelectual ou para ocultação de uma verdadeira relação de emprego.

É de amplo conhecimento que diversos profissionais liberais constituem pessoas jurídicas para a prestação de serviços por meio dessas entidades, ainda que essas pessoas figurem como únicas sócias.

Pode haver outras razões, que não serão tratadas aqui, para que haja a prestação de serviços de caráter intelectual por meio de empresas em virtude de especificidades de cada caso, mas a menor tributação da renda no nível da pessoa jurídica, quando comparado com a pessoa física, costuma ser o principal ou um dos principais motivos.

É perfeitamente legítimo, inclusive por expressa previsão legal (Art. 129 da Lei nº 11.196/05), a constituição de pessoas jurídicas para prestação de serviços de caráter personalíssimo. Tal como mencionado no tópico anterior, se a questão for de uma aparente injustiça ou distorção decorrente da baixa carga tributária aplicável a essas atividades intelectuais quando prestadas por pessoas jurídicas, a solução não seria a revogação da isenção dos dividendos. Deve ocorrer uma alteração legislativa para adequar dos coeficientes de presunção de lucro que deveria ser aplicado para esse segmento.

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Também é ampla e notória a existência de situações fraudulentas nas quais empregados são contratados por meio de pessoas jurídicas (os denominados "PJs") para prestar serviços de caráter habitual, pessoal e sob subordinação.

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A existência de fraude tributária também não é e nunca será, obviamente, motivo suficiente para alterar todo um sistema de tributação para as pessoas jurídicas em geral. Fraude tributária se combate com fiscalização e punição, no aspecto repressivo; bem como criando os devidos incentivos para que o comportamento fraudulento deixe de existir.

Além da fiscalização e punição, se o objetivo for desincentivar o fenômeno da "pejotização" para ocultar uma relação de emprego, a medida mais adequada nos parece ser a criação de incentivos para a contratação formal, tais como desoneração da folha salarial, reforma das leis trabalhistas ou possibilidade negociação entre empregado e empregador a partir de determinado nível de remuneração.

Combater a "pejotização" com a revogação da isenção sobre dividendos pagos por todas as pessoas jurídicas é medida arbitrária e totalmente desproporcional.

*Renato Souza Coelho, sócio tributarista do Stocche Forbes Advogados

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[1] Considerando que o regime do Simples Nacional tem suas peculiaridades e que foi, de fato, desenhado para que microempresários pudessem estruturar seus negócios, não iremos abordar nesse trabalho eventuais críticas ou possíveis distorções relacionadas a esse regime.

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