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Tribunal retoma ação que veta motorista, datilógrafo e copeira como 'assistente parlamentar' na Assembleia de SP

Órgão Especial do Tribunal de Justiça põe em pauta Ação Direta de Inconstitucionalidade da Procuradoria-Geral de Justiça contra a criação de cargos de provimento em comissão 'cujas atribuições não retratam funções de direção, chefia ou assessoramento, mas sim meramente bucrocráticas'

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Por Julia Affonso , Luiz Vassallo e Fausto Macedo
Atualização:

 Foto: Felipe Rau / Estadão

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado põe em pauta nesta quarta, 6, o julgamento de ação direta de inconstitucionalidade contra a criação na Assembleia Legislativa de São Paulo de cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração 'cujas atribuições não retratam funções de direção, chefia ou assessoramento, mas sim meramente burocráticas, administrativas e profissionais'. A ação é movida pela Procuradoria-Geral de Justiça.

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Documento

PEDIDO

"A criação de cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração, deve ser limitada aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o governante e o servidor, para que adequadamente sejam desempenhadas funções inerentes à atividade predominantemente política", sustenta, em parecer, o subprocurador-geral de Justiça Jurídico Wallace Paiva Martins Junior.

Wallace Paiva é enfático. "Há implícitos limites à criação de cargos em provimento, visto que assim não fosse, estaria na prática aniquilada a exigência constitucional de concurso para acesso ao serviço público."

Somente no mês de dezembro de 2018, somando 4870 funcionários ativos e inativos, os gastos da Casa com a folha de vencimentos chegaram a R$ 59 milhões.

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A lei complementar 1.136 é de 2011. Ela dá aos cargos comissionados nomenclatura de 'assistente parlamentar', I a V - alojando motoristas, secretárias, copeiras, datilógrafas, telefonistas e outras atividades.

O relator da ação é o desembargador Francisco Casconi. Em abril do ano passado, o magistrado decidiu, liminarmente, suspender novas nomeações de comissionados na Assembleia Legislativa de São Paulo, por 'ofensa a dispositivos diversos da Constituição Bandeirante'.

Nesta quarta, 6, o julgamento da ação deve ter prosseguimento com o voto do revisor, desembargador Artur Marques. O terceiro magistrado é o desembargador Salles Rossi.

"A regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve ser o preenchimento dos postos através de concurso público de provas ou de provas e títulos, pois assim se garante a acessibilidade geral, prevista inclusive no artigo 37, I, da Constituição Federal; bem como no artigo 115, I, da Constituição do Estado de São Paulo", destaca Wallace Paiva, no parecer datado de setembro de 2018. "Essa deve ser a forma de preenchimento dos cargos e cargos de natureza técnica ou burocrática."

O subprocurador-geral assinala que 'embora a Assembleia Legislativa detenha competência constitucional para criação de postos comissionados, as normas daí advindas devem atender aos preceitos constitucionais que balizam a excepcionalidade elementar'.

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"No caso, não se nega essa possibilidade, mas, os cargos em comissão de livre provimento impugnados nesta via, como se percebe da descrição de suas atribuições, não desempenham funções de assessoramento, chefia e direção, senão atividades burocráticas, técnicas e profissionais."

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O subprocurador argumenta. "Frise-se que é o rol de atribuições de cada específico cargo que define se o seu ocupante atuará para tais finalidades e se, para tanto, o elemento fiduciário é indispensável."

Wallace Paiva observa que as atividades dos cargos 'são executórias e de menor complexidade e refletem atos de simples e corriqueiro funcionamento da máquina administrativa, o que fulmina a possibilidade de provimento em comissão'. A lei questionada prevê como 'Assistente Parlamentar I' o 'responsável pela condução de automóvel de representação parlamentar para o transporte da deputada e do deputado e demais pessoas por eles autorizadas, no cumprimento de atividades parlamentares e protocolares'.

"Trata-se de atribuição operacional (motorista) que não pressupõe a necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado" adverte o subprocurador.

O 'Assistente Parlamentar II', por seu lado, 'desempenha atividades de natureza burocrática consistentes em executar serviços de secretaria, datilográficos, de digitação e afins, receber e entregar correspondência, atividades de copa e atribuições correlatas'.

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"Assim, trata-se de mero agente administrativo subalterno que não exerce assessoramento superior, aliás, é mero servidor burocrático sem qualquer liberdade de atuação", pontua Wallace Paiva.

O 'Assistente Parlamentar III' é o 'responsável pelo atendimento à comunicação interna e externa da unidade parlamentar através dos diversos veículos de comunicação, organização e conservação de arquivo jornalístico, pesquisa de dados para elaboração de notícias ou informações relacionadas ao foco do mandato e seu preparo para divulgação e demais atividades típicas da profissão de jornalista'

O 'Assistente Parlamentar IV': "Responsável pela execução de atividades administrativas relacionadas ao quadro de pessoal; por pesquisas rotineiras de apoio; pelo atendimento às pessoas encaminhadas ao gabinete; pela elaboração da correspondência relacionada ao expediente da unidade parlamentar; e por atividades correlatas."

O 'Assistente Parlamentar V', por seu lado: "Desempenha atribuições administrativas e executórias, consistente em elaborar minutas de pareceres do parlamentar inclusive na condição de membro de comissões, bem como pelo acompanhar a tramitação de proposições em todas as fases, também com vistas à adoção de eventuais providências para seu regular andamento."

"Os cargos comissionados destacados são incompatíveis com a ordem constitucional vigente", afirma o subprocurador. "Essa incompatibilidade decorre da inadequação ao perfil e limites impostos pela Constituição quanto ao provimento no serviço público sem concurso."

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No parecer, o subprocurador-geral enfatiza. "Podem ser de livre nomeação e exoneração apenas cargos que, pela própria natureza das atividades desempenhadas, exijam excepcional relação de confiança e lealdade, isto é, verdadeiro comprometimento político e fidelidade com relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, que vão bem além do dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor."

Ele pondera. "É esse o fundamento da argumentação no sentido de que 'os cargos em comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de certos órgãos, onde se necessita de um agente que sobre ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a promover a direção superior da Administração'."

O subprocurador invoca Diógenes Gasparini (Direito Administrativo, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1993, p. 208). "Por essas razões percebe-se quão necessária é essa fragilidade do liame. A autoridade nomeante não pode se desfazer desse poder de dispor dos titulares de tais cargos, sob pena de não poder contornar dificuldades que surgem quando o nomeado deixa de gozar de sua confiança."

E também Adilson de Abreu Dallari (Regime constitucional dos servidores públicos). "Daí a afirmação de que 'é inconstitucional a lei que criar cargo em comissão para o exercício de funções técnicas, burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior'."

E, ainda, o jurista e ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, em seu 'Direito constitucional administrativo, São Paulo (Atlas, 2002)'.

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"São a natureza do cargo e as funções a ele cometidas pela lei que estabelecem o imprescindível 'vínculo de confiança', que justifica a dispensa do concurso."

O subprocurador-geral de Justiça do Ministério Público de São Paulo segue sua linha de argumentação. "Não há nos cargos impugnados qualquer especificidade que demonstre o desempenho de atividade de direção, chefia, assessoramento ou comando superior que justifique o provimento em comissão. Os cargos em tela revelam funções ordinárias, que exigem tão somente de seus servidores o dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo agente público, estando fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior exigidos pelo Constituinte Originário quando da edição da regra destinada aos cargos comissionados."

Para Wallace Paiva 'evidencia-se claramente que os cargos em comissão denominados 'Assistente Parlamentar I', 'Assistente Parlamentar II', 'Assistente Parlamentar III', 'Assistente Parlamentar IV' e 'Assistente Parlamentar V' têm natureza meramente técnica, burocrática, operacional e profissional não justificando o provimento em comissão, o que contraria os artigos 111 e 115, II e V, da Constituição Estadual, que reproduzem o artigo 37, caput e incisos II e V, da Carta da República'.

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