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Transação: novo instrumento para regularização de tributos federais

Contribuintes têm até sexta-feira, 31, para aderir à transação extraordinária

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Por Antonio Carlos de Almeida Amendola
Atualização:

Antonio Carlos de Almeida Amendola. FOTO: DIVULGAÇÃO  

A transação é uma modalidade de extinção de crédito tributário prevista no Código Tributário Nacional desde 1966.  Ela envolve concessões mútuas e recíprocas de fisco e devedor, com vistas a solucionar a dívida tributária.  Em outras palavras, é uma forma de quitação de tributo que pode ser utilizada por todas unidades federadas mediante regulamentação em lei específica.  Apenas recentemente foi editada a medida provisória nº 899/2019, já convertida em lei (Lei nº 13.988/2020), introduzindo a transação como forma de quitação de tributos federais.

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A importância da transação é, de um lado, dar maior racionalidade e eficiência à cobrança de tributos e créditos não-tributários do governo na esfera federal, principalmente daqueles inscritos em dívida ativa e em fase de execução fiscal.  De outro lado, a transação permite uma melhor calibragem na concessão de descontos e prazos para o devedor, conforme a gravidade da crise econômico-financeira por ele concretamente experimentada ou de uma dificuldade macroeconômica, como a atual crise resultante da pandemia da covid-19.

Até esta novidade ser introduzida, a execução fiscal poderia prosseguir por prazo indeterminado e, apenas com introdução de parcelamentos especiais por lei, o devedor teria oportunidade de regularizar sua situação e equalizar a dívida fiscal. Muitas vezes um parcelamento especial era aberto tardiamente, após o devedor quebrar ou ter parado de operar.  Além disso, esses parcelamentos especiais também acabavam beneficiando contribuintes que não necessariamente estavam em crise, e não precisavam de descontos.

Há quinze anos, foi introduzida a nova lei de recuperações judiciais e falências, sendo um marco histórico para regulação do tema no Brasil. Na época, abandonou-se a antiga figura da concordata de 1945, onde o devedor estava obrigado a quitar as dívidas em percentuais fixos e dentro de determinados prazos.  Não havia outras soluções para empresas em crise, que estavam obrigadas a seguir religiosamente a fórmula estabelecida na legislação que, muitas vezes, não permitia a efetiva recuperação da empresa.  Ainda que a Lei nº 11.101/2005 possa ser aprimorada em muitos aspectos, ela é um relevante divisor de águas do tratamento do assunto em nossas terras, tendo dado mais flexibilidade para o devedor buscar um plano que permita não só a quitação de suas dívidas conforme seu caso concreto e desafios de seu setor econômico, bem como sua própria preservação de modo mais efetivo.

Do mesmo modo, mas quinze anos depois, a nova lei de transação tributária na esfera federal proporciona mais flexibilidade para o devedor regularizar seu passivo fiscal.  Abandona-se a ideia de que o crédito tributário é indisponível, a qual cedeu à noção de que alguns descontos e prazos podem ser concedidos ao devedor se tais medidas viabilizarem a efetiva recuperação de valores aos cofres públicos, e preservação do próprio devedor.  Torna a execução fiscal mais realista e eficaz, ainda que isso exija algumas concessões.

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Além dos casos de devedores com dificuldades econômico-financeiras, a transação federal também pode ser utilizada para pôr fim a controvérsia relevante e disseminada, e em contencioso tributário de pequeno valor.

O maior benefício da transação tributária é permitir ao devedor pagar a dívida fiscal de forma mais sintonizada com sua realidade econômico-financeira (com descontos, prazo mais alongado, possibilidade de quitação da dívida com precatório próprio ou de terceiros, etc), e, de outro lado, proporcionar ao fisco o recebimento de seu crédito, ainda que não inteiramente e nem no prazo ideal. Também pode ser apontado como benefício da transação reduzir a litigiosidade, especialmente nos casos de controvérsia reputada como relevante e disseminada.  Ademais, para os casos de pequeno valor, é uma forma mais flexível para recuperar tributos devidos, cujo custo de cobrança pode não valer a pena ao fisco.

Inúmeras são as razões para que um devedor busque utilizar a transação tributária.  No caso de o devedor identificar uma cobrança equivocada ou ilegal, e/ou de o devedor estar em uma crise econômico-financeira que dificulte o cumprimento de um passivo fiscal (inclusive casos de recuperação judicial e extrajudicial), e/ou quando o custo envolvido no contencioso seja alto e induza a transação.  Também pode fazer sentido utilizar a transação tributária no caso em que um contribuinte estiver envolvido em um litígio considerado como uma controvérsia relevante e disseminada.  Nesta hipótese, deve-se examinar as tendências jurisprudenciais e a similitude dos casos.

Há uma série de regras estabelecendo a legitimidade de contribuintes utilizarem a transação de forma individual, como aquela fixada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional que exige que a dívida consolidada do contribuinte exceda R$15 milhões, ou que a transação envolva débito individual com valor superior a R$1 milhão, já devidamente garantido em juízo, dentre outras.  Para transações por adesão, inclusive nos casos da controvérsia relevante e disseminada, e de pequeno valor, os termos do edital é que estabelecem quem poderá se valer da transação.

Pode haver abertura de transações especiais, como a extraordinária federal, regulada pela Portaria PGFN nº 9.924/2020, que objetiva viabilizar a superação da crise decorrente da pandemia causada pela covid-19, cujo prazo de adesão se encerrará no dia 31.07.  Neste caso, qualquer contribuinte que tenha tributo em aberto inscrito em dívida ativa pode aderir à transação, que permite o pagamento da dívida em sete anos, sendo que as três primeiras parcelas correspondem a 1% da dívida (ou em prazo maior para pequenas empresas, pessoas físicas, instituições de ensino, cooperativas, Santas Casas e outras organizações da sociedade civil).

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Até o fim do ano, está disponível para adesão a transação excepcional, regulada pela Portaria PGFN 15.402/2020, que, por sua vez, proporciona alongamento da dívida e descontos, sendo que todas as informações devem ser prestadas pelo devedor e a adesão deve ser realizada até 29 de dezembro de 2020.  Ela também busca auxiliar na superação da crise resultante da pandemia, mas levando também em conta a perspectiva de recebimento dos créditos inscritos.

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A introdução da transação tributária na esfera federal deve ser saudada.  Ainda que possa ser aprimorada em alguns aspectos, trata-se de ótima novidade que, espera-se, proporcione oportunidades mais efetivas para devedores regularizarem seu passivo fiscal federal, com recuperação de valores para os cofres públicos, especialmente em época tão desafiadora como a atual.  A transação extraordinária, cuja adesão pode se dar até esta sexta-feira, é uma dessas oportunidades.

*Antonio Carlos de Almeida Amendola é sócio-coordenador da área Tributária do Dias Carneiro Advogados. Graduado em Direito pela PUC/SP, possui mestrado em Master of Laws - LL.M. - Cornell University e em Direito Econômico e Financeiro pela USP. É conselheiro da Associação dos Advogados (AASP)

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