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Todos perdem com o julgamento da tese do século

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Por Maurício Maioli
Atualização:
Maurício Maioli. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O Supremo Tribunal Federal (STF) irá julgar em breve, o que várias pessoas estão denominando da tese do século. O impacto que o julgamento pode trazer aos cofres públicos é de R$250bilhões (em valores até 2015), daí seu apelido.

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O pano de fundo é uma tese tributária muito bem conhecida por todos os empresários do setor industrial e comercial. A exclusão do ICMS da base de cálculo das contribuições PIS/COFINS.

A tese dos contribuintes é muito simples. A Constituição Federal prevê que as contribuições PIS/COFINS devam incidir sobre faturamento/receita bruta da empresa. O ICMS, que está embutido e destacado nas notas fiscais, não é receita das empresas. Como todos sabem, esse tributo é de competência dos Estados, ou seja, o ICMS é receita desses mesmos Estados. Se é receita dos Estado, portanto, não é receita das empresas. Há outros fatores técnicos, que envolvem o caso, mas a parte essencial é essa.

A questão tributária, em si, é pano de fundo, pois o mérito já foi julgado pelo STF de forma favorável aos contribuintes em 2014 (RE 240.785) e reiterado em 2017 (RE 574.706).

A questão central agora é outra. É de Segurança Jurídica. O só fato de colocarmos em xeque novamente a Segurança Jurídica nos torna a todos perdedores.

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Perdemos por conta da ineficiência do Sistema. A tese é conhecida desde 1998 pelo STF. Isso significa que ela se originou muitos anos antes. E ainda está em julgamento 23 anos depois. Caso a tese fosse julgada de forma rápida lá em 1998 não haveria um passivo de R$250bi.

Perdemos por falta de planejamento do Executivo. Essa discussão já dura 5 (cinco) Presidentes da República. Diversos Ministros da Fazenda e outro tantos Secretários da Receita Federal. Todos sabiam, ou deveriam saber, que quanto mais tempo demorasse, pior seria para o próprio Executivo. Todos poderiam já ter realizado reservas, provisionamento ou utilizado mecanismos para mitigar o impacto no Tesouro.

Perdemos pelo desrespeito aos precedentes. O STF já definiu a matéria em 2014. Mas a União insiste em trazer ao tema nuances que ele não tem, para tentar buscar uma reviravolta na decisão.

Perdemos pela utilização de argumentos falaciosos. A União requer a modulação de efeitos alegando que o posicionamento do STF de 2017 teria sido disruptivo, que essa tese romperia com a jurisprudência dos tribunais, que há surpresa no julgamento do STF. O que é uma inverdade, pois essa tese tem maioria formada no STF desde 2006 (RE 240.785). Isso mesmo - 15 anos atrás. Qualquer empresa aberta quando tem um processo com maioria formada no STF (ou muito antes) contra sua tese, tem obrigação legal de provisionar os valores devidos e se preparar. Assim protege seus acionistas.

É, portanto, simplesmente errado supor que a União "se viu desprevenida", se "surpreendeu" com o resultado final do julgamento favorável aos contribuintes, considerando que havia risco provável (para usar um termo técnico) de perda há pelo menos 15 anos.

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Perdemos por estarmos mais uma vez discutindo a modulação de efeitos. Essa técnica não pode ser aplicada contrariamente ao contribuinte, a menos que seja caso de extrema excepcionalidade. E o presente caso não é.

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A rigor, perdemos pela demora em decidirmos uma questão tão simples. Aqui não se trata de matéria ideológica, que envolva paixões. Não se trata de julgamento criminal de determinado político. Não se trata de julgamento sobre questões delicadas como aborto, pena de morte, que envolvem quase infinitos matizes para a discussão.

É apenas um tributo. Sua base de cálculo. E o que a compõe ou não.

Perdemos, enquanto sociedade por termos tornado um tema tão singelo no julgamento da tese do século. E, daí sim, com possíveis consequências nefastas para todo o Sistema pelo enfraquecimento e desrespeito à Segurança Jurídica.

Perdemos, portanto, pela própria existência desse julgamento em tal contexto.

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Esperamos que, ao menos, o mínimo de Segurança Jurídica seja mantido, com a confirmação da tese dos contribuintes, sem qualquer modulação, e com a finalização, em definitivo, dessa questão.

*Maurício Maioli, sócio de Tributário do Feijó Lopes Advogados. Coordenador e professor da Especialização de Direito e Gestão Tributária da Unisinos/RS. Mestre em Direito pela UFRGS e professor de Direito Tributário

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