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Todo influenciador precisa de um advogado

Por Ana Carolina de Camargo Clève
Atualização:
Ana Carolina de Camargo Clève. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Nos últimos anos, atravessamos um período de revolução digital. A sociedade moderna desenvolve-se sob novo paradigma: o tecnológico. A maior parte das nossas horas diárias são consumidas em ambiente virtual - seja em virtude de atividades profissionais ou mesmo de lazer. O fato é que não há dúvidas de que, atualmente, a internet corresponde à mais relevante ferramenta para atrair os mais diversos interesses. O acesso é fácil, a busca é rápida, e há uma multiplicidade de informações - de modo descomplicado - a respeito do tema que está sendo pesquisado. É nesse cenário que se intensifica a relevância das redes sociais (Facebook, Instagram, Twitter, TikTok, Youtube).

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Isso porque as transformações decorrentes da revolução digital afetaram não apenas o mercado de trabalho como também o próprio comportamento humano. Aliás, é bem possível afirmar que o mercado mudou porquanto - justamente - identificou haver uma mudança comportamental no campo das relações humanas. Se, de um lado, estamos a viver o fenômeno da virtualização da vida; de outro, curiosamente, verifica-se que o indivíduo jamais esteve tão exigente de uma real identificação com o que acompanha virtualmente. Explico exemplificando com as relações de consumo: as propagandas de televisão - demandantes de sofisticadas produções e, por isso mesmo, caras e esteticamente perfeitas - já não mais têm o poder de alcançar o consumidor, que - agora - sente-se muito mais atraído pelos produtos/serviços anunciados pelos chamados influenciadores digitais. É que, ainda que os influenciadores -muitas vezes - tornem-se verdadeiras celebridades, em alguma medida, mostram a dinâmica da vida real. Falam a partir de si mesmos e não de um personagem - daí forma-se a conexão com os seus seguidores.

Tamanho foi o crescimento do número de influenciadores digitais (atuantes nos mais variados nichos - moda, beleza, lifestyle, entretenimento, e de produção conteúdo em áreas específicas do conhecimento) que, hoje, dúvidas não há de que se trata de autêntica atividade profissional. Não à toa, há projetos de lei em trâmite na Câmara dos Deputados visando a regulamentação da profissão de Influenciador Digital.

A questão que se coloca é: diante da ausência de regulamentação sobre a atividade, a quais regras esse profissional está submetido?

Antes de tudo, é preciso alertar que, uma vez que anuncia produtos e/ou serviços, é certo que o influenciador tem o dever de observar todas as regras estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor em relação aos limites da ação publicitária - não podendo, por exemplo, veicular publicidade enganosa ou abusiva. Na dúvida, sempre vale observar a lógica da ampla transparência e do direito de o consumidor ser bem informado - quanto mais informações e clareza houver no conteúdo, mais adequado estará. Isso não significa, contudo, que a publicação deve tornar-se engessada ou mesmo afastar-se da espontaneidade do profissional.

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Especificamente sobre as ações publicitárias realizadas por influenciadores digitais, o Conselho Nacional de Autorregulamentação - CONAR elaborou, neste ano, guia apresentando orientações para a aplicação das regras do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária ao conteúdo comercial nas redes sociais. Vale alertar que embora essas regras, formuladas a partir de diretrizes de órgãos internacionais, não tenham caráter vinculante, é certo que, no Brasil, todas as recomendações e decisões oriundas do CONAR são respeitadas e - sobretudo - seguidas por toda a comunidade envolvida (marcas anunciantes e agências de publicidade).

E quais são as principais regras estabelecidas pelo CONAR em relação ao conteúdo divulgado pelos influenciadores? Em primeiro lugar, o guia define que a configuração de publicidade depende - cumulativamente - de três requisitos: (i) divulgação de produto, serviço, causa ou outro sinal a ele associado; (ii) compensação ou relação comercial - ainda que não financeira - com o anunciante e/ou agência de publicidade; e (iii) a ingerência por parte do anunciante e/ou agência sobre o conteúdo da publicação - controle editorial da postagem.

Uma vez presentes esses três requisitos e caracterizada a publicidade, o influenciador tem o dever de identificar (de modo visível) aquele conteúdo como publicitário, de preferência (caso o contexto não torne claro que se trata de publicidade) usando as expressões "publi", "publipost" ou "publicidade". Orienta-se, também, que, na hipótese de a plataforma contar com ferramenta padronizada para fins de identificação de conteúdo publicitário, seja tal ferramenta ativada na divulgação.

E como ficam as orientações acerca das publicações sobre brindes e os chamados "recebidos" (divulgação sobre produtos/serviços que são oferecidos - gratuitamente - pela marca e, por isso mesmo, sem que haja qualquer interferência/controle da marca sobre o conteúdo)? Neste caso, ainda que a divulgação não se enquadre como publicidade (lembre-se que não preenche os três requisitos acima indicados), recomenda-se que seja informada a relação com o titular da marca responsável pelo produto ou serviço. Note-se que essa recomendação segue a já citada lógica da transparência e direito de o consumidor ser bem informado.

Ainda, restam as divulgações espontâneas - aquelas divulgadas naturalmente, e quando não há qualquer relação comercial entre o influenciador e a marca mencionada. Aqui, mais uma hipótese que não se caracteriza como publicidade e, por isso, não está presente o dever da respectiva indicação. Mas, atenção: caso a marca (ou agência responsável) compartilhe/replique essa postagem no seu próprio canal, esse conteúdo torna-se uma nova postagem e, assim, passa a se submeter às regras que regem as ações publicitárias.

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Em linhas gerais, são essas as principais recomendações do CONAR. Mas há muito mais regras e dicas jurídicas voltadas àqueles que atuam como influenciadores digitais ou produtores de conteúdo. A verdade é que, especialmente em razão da ausência de regulamentação específica e das dúvidas e inseguranças por isso ocasionadas, a atuação desses profissionais demanda a contratação de assessoria jurídica especializada.

*Ana Carolina de Camargo Clève, advogada, mestre em Ciência Política e pós-graduanda em Fashion Law

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