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Teto de gasto não pode ser obstáculo para o crescimento e geração de empregos

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Por Wilhelm Eduard Meiners
Atualização:
Wilhelm Eduard Meiners. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Quando foi aprovada a Emenda Constitucional nº 95, em dezembro de 2016, o panorama macroeconômico brasileiro era perverso. Completavam-se 8 trimestres de contração econômica que reduziram o PIB em 8%, a taxa de desemprego chegava a 11,5% e o nível de investimento atingia 15% do PIB. O desequilíbrio fiscal recorrente desde 2014 colocava em xeque o Tripé Macroeconômico (Meta de Inflação, Câmbio Flutuante e Superávit Primário), conjunto de instrumentos que conferem consistência e estabilidade econômica, adotado desde 1999. Ao fixar um limite (teto) real para as despesas totais do governo, corrigidas apenas pela inflação do ano anterior, o objetivo desenhado pelo economista Mansueto Almeida (ex-Secretário do Tesouro Nacional), era comprimir a participação dos gastos públicos no PIB e permitir a retomada de superávits estruturais, reduzindo o peso da Dívida Pública na economia. Com isso, seria garantido o equilíbrio fiscal estrutural, abrindo espaço para a redução de juros, retomada de investimentos privados e do crescimento sustentado.

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As críticas postas à época já demonstravam os problemas desse mecanismo. Primeiro, as despesas obrigatórias, como as aposentadorias que têm crescimento real demográfico, acabam por promover o ajuste forçado nos recursos livres, reduzindo os gastos sociais e investimentos em infraestrutura. Em segundo lugar, o ajuste na folha de salários reduz as contratações e implica em carência de técnicos especializados, o que afeta a capacidade de gestão e fiscalização do Estado - como exemplo, tem-se o atraso escandaloso para a concessão de benefícios previdenciários e aposentadorias pós-reforma e a desestruturação (induzida) do Sistema de Vigilância da Amazônia. Terceiro, e mais grave, a eliminação da capacidade do Estado de utilizar políticas fiscais anticíclicas, de atuar como Big Government na recuperação da economia em casos de grave recessão, como na latrogenia da pandemia da Covid-19.

O teto de gastos é um instrumento de ajuste fiscal que deve ser complementar às reformas estruturais, como a administrativa, do Estado e tributária, todas emperradas na gaveta da presidência da República. Sem isso, é insustentável. Você põe a tampa na panela de pressão, ergue o fogo e fecha a válvula: ela vai explodir.

A equipe econômica, formada por técnicos e executivos com discernimento e lógica, percebe que o caminho é abandonado e prefere sair do governo. No mês passado, largou seu posto o empresário Salim Mattar (Localiza), ex-secretário de Desestatização. Uma decepção. Em que pese sua falta de experiência para estruturar e conduzir projetos de privatização, ele percebeu que o governo freou a desestatização para manter cargos e atender a aliados políticos. Guedes e Bolsonaro mantêm o discurso e a pose liberal, mas cederam ao clientelismo da velha política do Centrão. As privatizações e concessões parecem ser feitas mais para espoliar o patrimônio público - uma pechincha com as joias da coroa -, favorecendo os grupos financeiros amigos do Posto Ipiranga, e menos como política para melhorar a efetividade dos serviços à população.

Também Guedes é incapaz de propor uma Reforma Tributária e enfrentar a busca de consensos para a justiça e simplificação fiscal, preservando o pacto federativo. Insiste no modelo do Imposto sobre Movimentações Financeiras, a tese de Marcos Cintra, seu ex-Secretário da Receita Federal.

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Este ano, com a pandemia da Covid-19 e o Orçamento de Guerra, condições excepcionais de aumento de despesas e queda de receitas, o teto foi abandonado. Espera-se um déficit público que chegue a 10% do PIB, elevando o endividamento interno nessa mesma proporção.

Mas em 2021 volta o regime fiscal do Teto de Gastos, com problemas que vão implicar num ajuste de rota. A economia, em que pese uma recuperação estatística de 3,5%, ante uma queda de 6% em 2020, estará no mesmo nível de atividade de 2011, 10 anos atrás. A receita da arrecadação será insuficiente para atender às demandas sociais. O Estado será chamado para induzir uma recuperação da economia e dos empregos, com instrumentos de política fiscal expansionista. Também haverá as demandas políticas dos aliados nas eleições presidenciais de 2022, para investimentos em infraestrutura e moradia. Mas isso é impossível com o Teto de Gastos. A equação social, financeira, macroeconômica e política não fecha.

Há algumas linhas de ajustes que poderiam ser adotados para manter o Regime Fiscal. Ao invés de considerar somente a correção inflacionária, o teto deve ser ajustado também pelo crescimento da população, mantendo o gasto social real per capita. O teto também pode segregar os investimentos e despesas obrigatórias dos gastos correntes de custeio para não afetar o investimento e crescimento. Desde que o teto fiscal foi estabelecido, estamos presos em uma âncora de estagnação e desemprego. Também o teto deveria disparar gatilhos para reduzir subsídios, desonerações e benefícios fiscais. Não faz sentido comprometer recursos vitais para o funcionamento do condomínio Brasil e manter benefícios aos moradores privilegiados da cobertura.

*Wilhelm Eduard Meiners é economista, professor de Macroeconomia e Economia Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), pesquisador do Estúdio de Economia e Finanças e do Observatório das Metrópoles - Núcleo Curitiba. Foi diretor-geral da Secretaria de Planejamento do Paraná

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