Marta Barroso*
10 de junho de 2019 | 15h00
Marta Barroso. FOTO: DIVULGAÇÃO
Somos chamados a definir: quanto de passado haverá em nosso futuro?
Ao não darmos certas respostas, estaremos fadados a repetir certas perguntas.
A paz social não pode ser uma mera ausência de violência obtida pela imposição de uma parte sobre as outras. Tampouco é a ausência de conflito…
O conflito não pode ser ignorado ou dissimulado: deve ser aceito.
Mas, se ficarmos encurralados nele, perdemos a perspectiva, os horizontes reduzem-se e a própria percepção da realidade fica fragmentada.
Quando paramos na conjuntura conflitual, perdemos o sentido da unidade profunda da realidade.
Só haverá futuro, em termos de sociedade, se houver uma repactuação ética do que entendemos como desenvolvimento.
A escolha que sou…
A escolha que somos…
Destaco uma passagem envolvendo um antropólogo que estava estudando os hábitos e costumes de uma tribo africana vivia cercado por crianças na maioria dos dias e decidiu fazer um jogo com elas. Comprou doces da cidade mais próxima e colocou tudo em uma cesta decorada no pé de uma árvore.
Depois ele chamou as crianças e sugeriu o jogo que ocorreria assim: quando o antropólogo dissesse “já”, as crianças deveriam correr para a árvore e o primeiro a chegar lá pode ter todos os doces.
As crianças se alinharam à espera do sinal. Quando o antropólogo disse “já”, todas as crianças pegaram umas às outras pela mão e correram em conjunto para a árvore.
Todas chegaram ao mesmo tempo, dividiram os doces, sentaram-se e começaram a mastigar felizes.
O antropólogo foi até as crianças e perguntou por que eles correram juntos quando qualquer uma delas poderia ter tido os doces só para eles.
As crianças responderam:
UBUNTU. Como pode qualquer um de nós ficaria feliz se todos os outros ficariam tristes?
UBUNTU é uma filosofia das tribos africanas que pode ser resumido como “Eu sou o que sou por causa de quem todos nós somos”.
E esse desenvolvimento tem que estar relacionado com a melhoria da vida que levamos e das liberdades que desfrutamos.
Falemos do que parece estar “hidden in the light”: há tantas coisas na luz que você não nota mais.
Pouco ou nada conseguiremos, se permanecemos ausentes de nós.
Não podemos perder o foco de sermos socialmente eficientes.
Portanto, a utilidade da riqueza está nas coisas que ela nos permite fazer, ou seja, as liberdades substantivas que ela nos ajuda a obter.
Mas também não podemos olvidar que a Política não pode se liberar da Economia, a Economia não pode se liberar da política.
Assim, claro está que o conceito de ética na economia não é … exclusivamente… técnico, mas essencialmente político.
Busquemos, nestas bases, compreender a relação entre indivíduos e instituições é desvendar os mistérios no desenvolvimento das sociedades.
Fundamental para a consolidação do desenvolvimento são as instituições, ou seja, as regras formais e informais do jogo de funcionamento da sociedade, uma vez que a evolução das regras predeterminam e condicionam o desenvolvimento sócio-econômico e político de uma sociedade.
Assim devemos ficar atentos para a afoiteza dos tempos ultramodernos que, por vezes, inverte a cadeia causal no processo de conhecimento colocando o efeito antes da causa, apontando soluções ou remédios, mesmo antes da análise.Eis o grande risco, o risco de o efeito ser dominante sobre a causa…da Cura inventar a Doença…
E que não se trata de ser otimista ou ser pessimista, pois ambos são fatalistas.
Reservo-me o direito de ser realista.
Se faltam recursos, compromete-se o êxito dos projetos voltados ao Estado de Bem-Estar Social, o que, em ambiente de baixa densidade ideológica e tênue consciência cidadã, se desatendidas as necessidades e expectativas imediatas, abre-se caminhos promessas de milagreiros populistas, comprometendo-se o êxito da própria democracia.
Claro está que há dois grandes inimigos da DEMOCRACIA: ignorância e miséria.
Falamos de estabelecer uma efetiva Comunidade Política calcada no realçar das convergências portadoras de futuro e não nas divergências que fazem do Passado, um único tempo.
O nosso futuro será realidade na exata proporção da nossa resiliência na efetivação dos nossos propósitos.
E resiliência está diretamente relacionada às nossas causas.
“As nossas causas ‘valem’ mais que a nossa vida, porque são elas as que à vida dão sentido.”
E lhes digo, com segurança: quem é da causa, se reconhece…
Ouso vaticinar: “quem é da causa se reconhece, mesmo que tenha posições divergentes”.
Deixemos em algum lugar do passado, os “arautos da discórdia” pois é de futuro que estamos a falar e construir
Afinal, bem sabemos porquê e por quem lutamos.
É o que impregna de sentido as nossas ações.
Desta forma, a questão maior não é “o que nós queremos ser” mas “quem nós queremos ser”, enquanto indivíduos, enquanto Nação.
Enfim, a sustentável defesa do ser… porque somos…
*Marta Barroso é advogada em Brasília. Sócia do escritório Barroso, Palhares & Siqueira Advocacia especializado em Mediação e Arbitragem com sede em Brasília – Distrito Federal
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