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Supremo forma maioria para manter sigilo das informações do programa de repatriação

Ação proposta pelo PSB questionava garantia prevista em lei para quem regularizasse bens ou valores mantidos no exterior

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Foto do author Rayssa Motta
Foto do author Fausto Macedo
Por Rayssa Motta e Fausto Macedo
Atualização:

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para manter o sigilo das informações de quem aderiu ao Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) - o chamado 'programa de repatriação'.

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O julgamento foi iniciado no plenário virtual, ferramenta que permite aos ministros analisarem os processos e incluírem os votos no sistema online sem necessidade de reunião física ou por videoconferência, e encerrado na sexta-feira, 5.

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A análise tem origem em uma ação proposta pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) em 2017. A sigla pedia que fossem declarados inconstitucionais os dispositivos da Lei de Repatriação (Lei nº 13.254/2016) que impedem o compartilhamento de informações dos contribuintes do programa com órgãos de controle, como Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e Tribunal de Contas. Na avaliação do partido, o 'sigilo ilimitado' dos dados dificulta a fiscalização tributária e o combate ao branqueamento de capitais.

Ao Supremo, o partido usou como exemplos investigados na Operação Lava Jato que teriam usado o programa para regularizar dinheiro de propina recebido no exterior, como o ex-gerente da Petrobrás Márcio Almeida Ferreira, segundo acusou o Ministério Público Federal (MPF).

Criado no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), o programa de repatriação foi pensado para aumentar a arrecadação durante a crise econômica e fiscal e, ao mesmo tempo, regularizar a situação fiscal dos brasileiros com dinheiro e bens não declarados no exterior. Em suas duas fases de adesão, rendeu mais de R$ 48 bilhões aos cofres da União.

Entre os requisitos para aderir ao programa estavam o pagamento de 15% de imposto e 15% de multa sobre os valores declarados e a origem lícita do dinheiro. Em troca, o contribuinte era liberado de responder por crimes como sonegação, evasão de divisas e lavagem.

Receita Federal. Foto: MARCELO CAMARGO/AG. BRASIL

O ministro Luís Roberto Barroso, relator da ação, abriu os votos e se manifestou pela manutenção do sigilo. Na avaliação do ministro, as garantias oferecidas aos contribuintes que aderiram ao programa devem ser mantidas.

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"Enquanto "regras do jogo", devem ser, tanto quanto possível, mantidas e observadas, a fim de assegurar a expectativa legítima do aderente e proporcionar segurança jurídica na transação", escreveu.

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Para o ministro, o programa de repatriação não diminui a transparência no combate à corrupção. "A adesão ao programa envolve a prestação de informações sensíveis que merecem proteção e não há qualquer limitação a que sejam fornecidas por determinação judicial, se for o caso", observou.

Em seu voto, Barroso defendeu ainda que o 'a mera circunstância de algumas pessoas se utilizarem do programa imbuídos de má-fé não o inquina de inconstitucionalidade'.

"A utilização de meios lícitos para o cometimento de delitos não é razão para proibi-los: pessoas usam o sistema bancário para lavar dinheiro, celebram contratos para praticar estelionato, valem-se de computadores para a prática de crimes cibernéticos etc. Nem por isso se pretenderá proibir a celebração de contratos ou o uso do sistema bancário ou de computadores", defendeu.

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O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luis Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O relator foi seguido pelos colegas Cármen Lúcia, Edson Fachin, Gilmar Mendes, Rosa WeberDias Toffoli, Alexandre de Moraes, Marco Aurélio, Luiz Fux e Nunes Marques.

Apenas o ministro Ricardo Lewandowski abriu divergência. Ele apresentou uma proposta de ressalva ao sigilo: em caso de 'fundadas suspeitas' de origem ilícita as informações poderiam ser compartilhadas.

Para o advogado criminalista Marcelo Bessa, como as pessoas que aderiram ao regime já estavam contando com o sigilo, previsto na legislação, uma mudança de entendimento a essa altura poderia gerar instabilidade.

"Haveria uma quebra da previsibilidade da norma (caso a tese do PSB fosse aceita) e, a partir de agora, também geraria uma grande desconfiança em relação a qualquer norma que venha a ser editada pelo estado brasileiro. Isso seria péssimo para a imagem do país", explica.

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O advogado Marcelo Ávila de Bessa. Foto: Divulgação

"Felizmente o Supremo optou por manter a previsibilidade e a segurança jurídica para os contribuintes que decidiram regularizar sua situação. O sigilo era uma condição prevista no programa, até para atrair os contribuintes a participar e a corte reconheceu que essa situação excepcional foi necessária naquele momento", acrescenta Bessa, que é membro do Instituto de Garantias Penais.

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