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Stock options e outros incentivos de longo prazo são ferramentas essenciais no meio corporativo, mas sua adoção inspira cuidados

Por Eduardo Bouwman
Atualização:
Eduardo Bouwman. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Tem se tornado cada vez mais comum entre as empresas a adoção dos chamados planos de incentivos de longo prazo (ILP), como ficaram conhecidas no meio corporativo as vantagens concedidas a executivos e colaboradores-chave, com base na valorização do negócio ou no atingimento de metas que gerem valor no longo prazo.

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O mais tradicional dos incentivos de longo prazo são as chamadas opções de compra, mais conhecidas pela expressão inglesa stock option ou stock options plans (SOP), cuja popularidade entre nós ampliou o sentido da expressão a ponto de ser comumente utilizada como sinônimo de quaisquer benefícios baseados na valorização do negócio.

Em sentido mais técnico, entretanto, a stock option corresponde a uma promessa unilateral da companhia de alienar ações de sua emissão por um preço fixado no momento da outorga e mediante o atendimento a certas regras de "vesting" que, em resumo, são prazos e condições mínimas para que o beneficiário possa ter a propriedade plena das opções.

A lógica por trás desse mecanismo é ao mesmo tempo simples e sofisticada.

No âmbito empresarial, as stock options nascem como um mecanismo de governança que visa a promover o alinhamento de interesses entre acionistas e colaboradores.

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Em outras palavras, se a sabedoria popular ensina que é o olho do dono que engorda o gado, a stock option é uma ferramenta que se propõe a conferir olhos de dono às pessoas relevantes para o sucesso do negócio, ou seja, executivos e colaboradores-chave.

Mas não é só. Além de ser uma importante ferramenta de governança corporativa, as stock options cumprem de forma eficiente outra função igualmente relevante, a saber, a atração e a retenção de talentos. E foi nas startups que elas encontraram terreno fértil para se popularizar ainda mais.

No caso das startups, principalmente aquelas nos estágios mais iniciais, onde os recursos costumam ser escassos para atrair bons profissionais por meio de salários competitivos, as stock options caíram como uma luva. Não por acaso, no setor de tecnologia, em que o problema da atração de talentos é agravado pela escassez de mão de obra qualificada, o oferecimento de participação no negócio deixou de ser um diferencial e tornou-se um verdadeiro padrão de mercado.

Hoje é difícil encontrar uma startup que não utilize ou tenha utilizado contratos de vesting (outro nome para as opções de compra) para atrair e reter talentos. Normalmente, a fórmula usada consiste em oferecer a colaboradores-chave o direito de adquirir um certo número de ações/quotas, condicionando-se esse direito a uma espécie de estágio probatório de 1 ano (cliff period), dentro do qual o beneficiário não tem direito a qualquer benefício se sair ou for dispensado. Ainda, para efetivamente gozar do direito de adquirir a participação societária prometida na data de exercício, o beneficiário deve se submeter a um período aquisitivo (vesting period), normalmente de 3 a 4 anos, no qual as opções são adquiridas (vestidas) proporcionalmente de forma mensal, trimestral ou anual.

Com o passar do tempo novas modalidades de incentivos de longo prazo têm surgido e rapidamente se difundido, a exemplo da restricted stocks unit (RSU), da restricted stock, do employee stock purchase plan (ESPP) e da phantom stock, cada qual com características próprias.

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No Brasil, a disciplina legal das stock options se resume à Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas), que regula apenas alguns aspectos societários da instituição dos planos de outorga de opções de compra, a exemplo da necessidade de prévia aprovação em assembleia geral e de previsão estatutária de capital autorizado.

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Esse vazio normativo fez surgir relevantes controvérsias quanto à natureza jurídica das stock options e de outras modalidades de incentivos de longo prazo, com importantes repercussões fiscais e trabalhistas. A questão principal consiste em delimitar se as stock options, RSU, restricted stocks, ESPP, ou phantom stock têm natureza mercantil (de investimento) ou remuneratória.

A importância do tema reside no fato de que qualquer vantagem econômica oferecida por uma empresa ao seu colaborador teria, em princípio, caráter remuneratório, estando sujeita aos encargos previdenciários e trabalhistas incidentes sobre folha salarial, além do imposto de renda. Por outro lado, a assunção de riscos por parte do colaborador beneficiado com planos de ILP justificaria a posição dos contribuintes de que a concessão de direitos de compra, ou de participação societária, corresponde a um negócio jurídico com natureza mercantil independente da relação de emprego. Desse modo, a única tributação ocasionalmente incidente sobre tais planos seria sobre o ganho de capital em eventual alienação futura da participação societária, se o colaborador apurar lucro na sua venda.

Em linhas gerais, os tribunais administrativos e judiciais tendem a reconhecer a natureza mercantil somente dos planos dotados de voluntariedade, onerosidade e risco. As participações ou direitos concedidos sem essas características, por outro lado, tendem a ser caracterizados como possuindo natureza remuneratória. Ainda assim, a jurisprudência sobre o assunto não se encontra consolidada, e não há uma posição definitiva sobre cada um dos variados tipos de planos de ILP existentes.

Ainda mais problemáticas são as questões relativas ao momento da eventual tributação, isto é, se no exercício da opção, ou na venda futura da ação. Por exemplo, ao exercer o direito de compra objeto da opção, o colaborador ainda não sabe se apurará ganho ou perda sobre as participações adquiridas. Porém, caso ele seja tributado no exercício da opção e acabe vendendo as ações por valor menor ao do exercício, o colaborador pode se ver numa situação em que pagou impostos e ainda sofreu uma perda.

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Isso tudo ganha uma camada de complexidade adicional nos casos cada vez mais comuns de concessão do benefício por controladoras estrangeiras das sociedades brasileiras, em especial quando a modalidade de incentivo adotada no exterior não encontra um paralelo claro em nosso direito.

Assim, embora os stock option plans sejam uma ferramenta importante e amplamente difundida de alinhamento de interesses, atração e retenção de talentos, sua adoção e implementação requer bastante cautela. Recomenda-se que a estruturação do plano conte com uma avaliação multidisciplinar de forma a se perseguir a modalidade mais adequada, evitando-se assim riscos ou efeitos indesejáveis.

*Eduardo Bouwman, advogado da área de Direito Societário, Fusões e Aquisições do KLA Advogados

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