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Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

STJ mantém condenação de 'japonês da federal' por corrupção

Newton Ishii, que ficou famoso na Lava Jato, é acusado de ter atuado para facilitar o contrabando de produtos na fronteira com o Paraguai, em Foz do Iguaçu

Foto do author Julia Affonso
Por Mateus Coutinho e Julia Affonso
Atualização:

O Superior Tribunal de Justiça negou parcialmente o recurso do agente da Polícia Federal no Paraná Newton Ishii e manteve a sentença da Justiça Federal no Paraná que o condenou em 2009 por corrupção e descaminho, ao facilitar a entrada no Brasil de produtos contrabandeados do Paraguai. Ishii, que ficou conhecido como "japonês da federal" ao escoltar presos e investigados da Lava Jato e até ganhou marchinha de carnaval, foi um dos 23 policiais federais alvos da Operação Sucuri, deflagrada em 2003 para apurar um esquema formado por agentes da PF e da Receita Federal que facilitava o contrabando de produtos ilegais na fronteira com o Paraguai em Foz do Iguaçu (PR). A decisão do ministro Félix Fischer acata em parte o recurso de três réus, entre eles Ishii, e reduzir a pena de um deles. A decisão, contudo, não identifica os réus e não deixa claro qual a condenação de Ishii. A defesa do agente alega que ele foi condenado a pagar apenas cestas básicas e informou que já recorreu da decisão do STJ. Atualmente, Ishii responde a três processos, derivados da Operação Sucuri, sendo um na esfera criminal, outro administrativo e um terceiro por improbidade administrativa. Todos estão em andamento. Operação Sucuri. Deflagrada em 2003, a a operação desmontou um grande esquema de contrabando de procutos na Ponte da Amizade, na fronteira do Brasil com o Paraguai em Foz do Iguaçu, no Paraná.Ao todo, participavam do esquema sete "agenciadores", seis contrabandistas, 23 agentes da PF, sete técnicos da Receita Federal e três políciais rodoviários federais. Os "agenciadores", no total de sete, faziam a intermediação entre os contrabandistas e os servidores públicos e repassavam a propina aos agente da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Receita Federal que atuavam na Ponte da Amizade. Além deles, havia um grupo de seis contrabandistas formado, que atravessavam a ponte com as mercadorias contrabandeadas mediante o pagamento das propinas. O terceiro e maior grupo do esquema criminoso era formado por servidores públicos federais que atuavam na Ponte da Amizade, que recebiam propina e deixavam de fiscalizar ou mesmo fingiam fiscalizar os veículos dos contrabandistas. Em alguns casos, as placas dos carros eram repassadas ao grupo de servidores que, com isso, sabiam quem "proteger". VEJA A ÍNTEGRA DA DECISÃO:

DECISÃO

Trata-se de recursos especiais interpostos pelo Ministério Público

Federal (fls. 9571/9593), e por N. H. I., M de O. M. e O. A. de M.

(fls. 9612/9709), em face de v. acórdão proferido pelo eg. Tribunal

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Regional Federal da 4ª Região, consubstanciado na seguinte ementa

(fls. 9527/ 9529):

PENAL E PROCESSUAL PENAL. OPERAÇÃO SUCURI. CORRUPÇÃO PASSIVA.

FACILITAÇÃO DE CONTRABANDO OU DESCAMINHO. QUADRILHA OU BANDO.

INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DEFESA PRELIMINAR.

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INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 514 DO CPP. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS.

LEI 9.296/96. PRORROGAÇÃO. ADEQUAÇÃO. PERÍCIA NOS ARQUIVOS DE ÁUDIO.

DESNECESSIDADE. TIPICIDADE. CONCURSO DE CRIMES. CONSUNÇÃO.

MATERIALIDADE E AUTORIA NÃO DEMONSTRADA SATISFATORIAMENTE EM RELAÇÃO

A UM DOS CORRÉUS. DÚVIDA. ABSOLVIÇÃO. ARTIGO 386, VII, DO CPP.

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COMPROVAÇÃO QUANTO AOS DEMAIS COACUSADOS. DEPOIMENTO DE AGENTES

POLICIAIS. VALIDADE. DOLO. DOSIMETRIA DAS PENAS. PENA-BASE DO DELITO

DO ARTIGO 318 DO CP. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. VALORAÇÃO NEGATIVA.

AFASTAMENTO. CONTINUIDADE DELITIVA. REDUÇÃO DA FRAÇÃO DE AUMENTO.

REDUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVA E DE MULTA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

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QUANTO AO DELITO DO ARTIGO 288 DO CP. CARGO PÚBLICO. PERDA.

FUNDAMENTAÇÃO. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. EXCEÇÃO NO QUE TOCA AO

CORRÉU APOSENTADO.

1. Pelo teor da peça acusatória, verifica-se ser ela formalmente

apta ao fim a que se destina, atentando às exigências do artigo 41

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do Código de Processo Penal, de modo que não há falar em inépcia a

ser reconhecida. Encontra-se alcançado pela preclusão o debate

acerca da inaptidão da denúncia, quando aventado após a sentença

penal condenatória. Precedentes.

2. A aplicabilidade do regramento do artigo 514 da Lei Adjetiva

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Penal restringe-se aos crimes funcionais afiançáveis.

3. Não há necessidade de prévia instauração de inquérito policial

para que sejam realizadas as interceptações telefônicas ou outras

diligências pertinentes à investigação. Inteligência do artigo 1º da

Lei 9.296/96.

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4. A interceptação telefônica é apta a demonstrar a materialidade de

difícil apuração pelas vias ordinárias, pois apenas com o uso de

sistemas de inteligência é que poderá ser 'mapeada' e revelada a

dinâmica 'invisível' das redes criminosas organizadas, além da

identificação de seus integrantes e de interações, permitindo,

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assim, que sejam realizadas articulações estratégicas para o seu

desvelar.

5. É possível a prorrogação da escuta telefônica em mais de uma

oportunidade, desde que devidamente fundamentada e necessária, o que

está adequado ao caso dos autos, tendo-se em conta o número de

pessoas investigadas e a complexidade dos fatos perscrutados.

6. Desnecessário que as transcrições dos diálogos sejam feitas em

sua integralidade, mormente diante da disponibilização dos áudios de

todas as conversas captadas às defesas. Perícia técnica dispensável

quando há possibilidade de identificação dos interlocutores por

outros meios, bem como que seja realizada a referida degravação por

perícia técnica. Precedentes.

7. Não reconhecida qualquer modificação do conteúdo, tampouco a

interpretação extensiva dos diálogos interceptados por parte dos

agentes responsáveis pelas degravações. Hipótese em que as anotações

e esclarecimentos feitos pelos policiais visavam a facilitar a

decodificação das conversas e sua utilização nos relatórios de

investigação.

8. Posta a premissa de que a interceptação telefônica foi o único

meio hábil a demonstrar o cometimento dos delitos de corrupção

passiva e facilitação de contrabando ou descaminho, não se prescinde

da necessidade de que haja, ao menos, uma conversa, em que os réus

tenham sido interlocutores, que sirva para delinear qualquer

comportamento que pudesse atribuir a condição de corrupção

direcionada à finalidade de facilitar a prática do contrabando e do

descaminho.

9. Ausentes elementos que corroborem a participação efetiva de um

dos corréus no esquema criminoso, não há prova suficiente para a

condenação em relação àquele, razão pela qual a sua absolvição é

medida que se impõe, in casu, nos termos do artigo 386, inciso VII,

do Código de Processo Penal.

10. O depoimento do agente policial pode ser admitido como elemento

de persuasão do juiz, pois o exercício da função, por si só, não

desqualifica, nem torna suspeito seu titular.

11. Cometem os delitos de corrupção passiva e facilitação de

contrabando/descaminho os agentes policiais que, mediante o

recebimento de propinas, permitem a entrada de mercadorias

contrabandeadas ou descaminhadas no território nacional.

12. Hipótese em que se reconhece a consunção entre os delitos do

artigo 317, caput, e 318, ambos do Código Penal. Delito-meio com

pena mais grave absorve crime-fim.

13. Praticam os delitos de formação de quadrilha os sujeitos que se

associam, em número mínimo de quatro três pessoas para a prática, de

modo estável e com permanência, de diversos crimes contra a

Administração Pública. O elemento anímico é o dolo consistente na

atuação livre e consciente dos agentes no sentido de, auxiliar, de

forma decisiva, estável e permanente, a percepção de propinas por

partes de outros codenunciados, ganho este relacionado ao poder de

coação que o exercício das funções públicas conferia aos que

ostentavam a condição de intraneus.

14. Na mensuração da pena-base, descabe o agravamento da reprimenda

inicial a título de consequências do delito, em vista de que o dano

à imagem das instituições públicas envolvidas, responsáveis pela

repressão do contrabando e descaminho, não restou comprovado,

tampouco a lesão aos cofres públicos pode ser aferida.

Quanto à violação à moralidade administrativa, esta se constitui no

próprio bem jurídico protegido nos crimes contra a Administração

Pública, de modo que não cabe utilizá-la para incrementar a pena

inicial.

15. É devida a redução da fração de aumento pela continuidade

delitiva, no tocante ao cometimento por parte dos agentes do delito

de facilitação ao contrabando ou descaminho, em conta da

impossibilidade de aferição exata da quantidade de ações praticadas

pelos réus, decisivamente, nas mesmas condições de tempo, lugar e

modo de execução.

16. Extinção da punibilidade em relação ao delito de quadrilha pela

prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa.

17. A perda do cargo é efeito específico da condenação e foi

fundamentadamente decidida no caso concreto em razão da violação ao

dever de lealdade com a Administração Pública, sendo independentes

as instâncias cível e penal.

Exceção com relação ao corréu aposentado antes da sentença,

ressalvada, porém, a possibilidade de cassação da aposentadoria em

âmbito administrativo. (e-STJ fls. 9.527/9.529).

Os embargos de declaração opostos pelos réus foram rejeitados, em

acórdão que possui a seguinte ementa (fl. 9607):

"PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.OMISSÃO. INOCORRÊNCIA.

REDISCUSSÃO MERITÓRIA E PREQUESTIONAMENTO. IMPROVIMENTO.

1. A via declaratória tem o objetivo específico de provocar novo

pronunciamento judicial de caráter integrativo e/ou interpretativo

nas hipóteses de ambigüidade, omissão, contradição ou obscuridade, a

teor do artigo 619 do Código de Processo Penal, ou então, por

construção pretoriana integrativa, quando constatado erro material

no julgado.

2. Desatendidos tais requisitos, não devem ser providos os embargos

declaratórios que apenas visam à rediscussão do mérito da

Daí os recursos especiais interpostos.

O Ministério Público Federal recorre com fulcro no art. 105, inciso

III, alínea a, da Constituição Federal, apontando violação aos

artigos 317 e 70 do Código Penal. Defende, em síntese, que não é

possível a aplicação do princípio da consunção a fim de que o delito

de corrupção passiva seja absorvido pelo crime de facilitação ao

contrabando ou descaminho. Sustenta essa impossibilidade,

inicialmente, ao argumento de que a pena do crime de corrupção

passiva é superior à do delito de facilitação de contrabando ou

descaminho. Alega, ainda, que a corrupção passiva não constitui fase

para a consumação do crime de facilitação de contrabando, visto que,

na hipótese, a consumação desses crimes não ocorreu simultaneamente,

decorrendo de condutas não coincidentes e baseadas em dolos

próprios. Ao final, requer a reforma do v. acórdão recorrido.

Por sua vez, o recurso especial interposto pelos correus N. H. I.,

M. de O. M. e O. A. de M., está bem sumariado no douto

pronunciamento que a ilustre Subprocuradora-Geral da República, Dra.

Maria das Mercês de C. Gordilho Aras,  ofereceu nos presentes autos.

Transcrevo, para evitar tautologia, o seguinte trecho (fls.

9923/9931):

"Trata-se de recurso especial interposto por N. H. I. , M. DE O. M.

e O. A. DE M.com fundamento no art. 105, inciso III, alínea a , da

Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal

Regional Federal da Quarta Região, que, por sua Oitava Turma,

improveu o apelo ministerial, vindo, por outro lado, a dar parcial

provimento à apelação defensiva, a fim de desclassificar o delito de

corrupção passiva qualificada para a modalidade simples; reconhecer

a consunção entre o crime de corrupção passiva e o de facilitação ao

contrabando ou descaminho; reduzir a pena definitiva aplicada para

04 (quatro) anos, 02 (dois) meses e 21 (vinte e um) dias de

reclusão; declarar, de ofício, a prescrição da pretensão punitiva do

Estado quanto ao delito de formação de quadrilha; e, por fim,

afastar a pena de perda do cargo de N. H. I., em razão de sua

aposentadoria.

(...)

No presente reclamo nobre, interposto em concomitância com o recurso

extraordinário de fls. 9.711/9.814, almejam N. H. I., M. DE O. M. e

O. A. DE M. a reforma do aresto hostilizado e seu integrativo,

assinalando violação dos arts. 3º, 41, 156, inciso II, 157, 159,

caput , 160, 184, 402, 514 e 564, inciso IV, todos do Código de

Processo Penal; dos arts. 5[9 e 334, ambos do Código Penal; dos

arts. 333, incisos I e II, e 535, ambos do Código de Processo Civil;

do art. 8º, nº 2, do Pacto de São José da Costa Rica; dos arts. 5º,

incisos LV, LVI e LVII, e 93, inciso IX, ambos da Constituição

Federal, e dos arts. 2º, incisos I, II e III, 4º e 6º, §1º, todos da

Lei nº 9.296/96 (e-STJ fls. 9.613/9.709).

Aduzem, inicialmente, que os embargos declaratórios opostos não

foram devidamente apreciados pelo Pretório a quo , com afronta ao

disposto no art. 535 do Código de Processo Civil.

Apontam os ora Recorrentes, em seguida, nulidade do acórdão

vergastado e do seu integrativo, acoimando de ilegal a interceptação

telefônica que embasou a peça acusatória, a uma, por haver o Juiz

Singular determinado o início daquele monitoramento com base em mera

denúncia anônima, sem indícios razoáveis de autoria e sem

demonstração de ser a quebra do sigilo a única forma de investigação

possível; a duas, porque as sucessivas renovações das escutas não

foram devidamente motivadas e, a três, por não terem sido os autos

da quebra de sigilo telefônico acompanhados da integral transcrição

das conversas interceptadas, contrariando, assim, os arts. 157 e

184, ambos do Código de Processo Penal; os arts. 5º, inciso LVI, e

93, inciso IX, ambos da Constituição Federal, e os arts. 2º, incisos

I, II e III, 4º e 6º, §1º, todos da Lei nº 9.296/96.

Assinalam, também, que os arestos combatidos negaram vigência aos

arts. 156, inciso II, 159, caput , e 160, todos do Código de Ritos

Penais, por ausência de perícia no material de gravação colhido e

sustentam que o conteúdo das conversas telefônicas monitoradas não

foi colocado à disposição da defesa técnica durante parte da

instrução criminal, acarretando nulidade do processo, por

cerceamento de defesa, nos termos do art. 564, inciso IV, daquele

Codex e do art. 8º, nº 2, do Pacto de São José da Costa Rica.

Noutro giro, sustentam N. H. I., M. DE O. M. e O. A. DE M. a inépcia

da denúncia, por entenderem deficiente a descrição da forma do

envolvimento de cada acusado no fato delituoso, ausente a

individualização das condutas praticadas, indispensável ao exercício

do direito de defesa.

Como forma de demonstrar a existência de afronta aos arts. 3º e 514,

ambos do Código de Processo Penal, pleiteiam os ora Recorrentes a

declaração da nulidade da ação penal, por falta de notificação dos

acusados para apresentarem resposta preliminar.

Pretendem, no mérito, serem absolvidos do crime de falsificação de

contrabando, sob o fundamento de insuficiência de provas, com

violação do art. 333, incisos I e II, do Código de Processo Civil e

o art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal.

Sustentam os acusados, também, ofensa ao art. 334 do Código Penal,

sob o argumento de que o dever funcional de fiscalizar as

mercadorias estrangeiras no recinto da área alfandegária é da

competência exclusiva da Receita Federal, faltando, portanto, a

elementar do crime de facilitação de contrabando.

Alegam, ainda, contrariedade ao art. 59 do Estatuto Repressivo, com

arrimo na tese de falta de fundamentação idônea a sustentar a

exasperação da pena-base e pugnam, igualmente, pelo afastamento do

acréscimo da continuidade delitiva.

Afirmam, por fim, haver a Corte Regional Federal negado vigência ao

art. 402 do Código de Processo Penal, ao chancelar o decisum

condenatório no ponto em que determinara a perda do cargo público

por M. DE O. M. e O. A. DE M..

O Parquet Federal apresentou contrarrazões a ambos os recursos, às

fls. 9.821/9.827; 9.829/9.834 (e-STJ).

O Vice-Presidente do Tribunal Regional Federal da Quarta Região

admitiu os apelos extremos, conforme se vê às fls. 9.857/9.863;

9.866 (e-STJ).

Eis, em síntese, o relatório."

Ao final, a ilustre Subprocuradora-Geral da República opina pelo

desprovimento dos recursos especiais interpostos, pelas razões que

expõe às fls. 9.907/9.919 e 9.920/9.952.

É o relatório.

Decido.

Inicialmente, analiso o pedido recursal deduzido pelo Ministério

Público Federal (fls. 9571/9593).

Conforme relatado, o Parquet aponta violação aos artigos 317 e 70 do

Código Penal. Entende que, no caso, não seria possível a aplicação

do princípio da consunção a fim de que o delito de corrupção passiva

fosse absorvido pelo crime de facilitação ao contrabando ou

descaminho. Sustenta essa impossibilidade, inicialmente, ao

argumento de que a pena do crime de corrupção passiva é superior à

do delito de facilitação de contrabando ou descaminho. Alega, ainda,

que a corrupção passiva não constitui fase para a consumação do

crime de facilitação de contrabando, visto que, na hipótese, a

consumação desses crimes não ocorreu simultaneamente, decorrendo de

condutas não coincidentes e baseadas em dolos próprios. Ao final,

requer a reforma do v. acórdão recorrido.

O exame dos autos revela que o r. decisum recorrido aplicou ao caso

o princípio da consunção, reconhecendo a absorção do delito de

facilitação de contrabando ou descaminho (art. 318 do CP) pelo crime

de corrupção passiva (art. 317 do CP). Na oportunidade, consignou

que no caso concreto, o dolo dos servidores públicos estava,

indubitavelmente, voltado para a obtenção da vantagem indevida, no

exercício da função (corrupção passiva), e, para a obtenção dessa

vantagem indevida (objetivo final), o único modo possível era atuar

em violação a dever funcional (na espécie, a prática da facilitação

ao contrabando e/ou descaminho). Portanto, tenho que a solução

jurídica mais adequada aos fatos sob exame é o afastamento do

concurso forma de crimes, entre a corrupção passiva e a facilitação

ao contrabando e/ou descaminho, aplicando-se o princípio da

consunção, porquanto 'a condenação pelo ilícito-típico mais grave

exprime, já de forma bastante, o desvalor de todo o comportamento:

lex consumens derogat legi consuntae(fl. 9444). Diante disso,

determinou o prosseguimento da persecução penal somente quanto ao

crime de facilitação de contrabando ou descaminho, uma vez que este

era o delito com pena mais alta, à época.

A leitura das razões expostas no v. ato questionado revela que o

acolhimento da tese deduzida no recurso interposto pelo Ministério

Público Federal - com a conseqüente alteração das conclusões a que

chegou o eg. Tribunal a quo - demandaria, necessariamente, o

revolvimento da matéria fático-probatória, o que é vedado pela

Súmula 7/STJ.

Essa mesma percepção do tema foi manifestada pela ilustre

Subprocuradora-Geral da República que oficiou nos presentes autos.

Em sua peça processual destacou que "forçoso é reconhecer que, a

partir do minucioso exame das provas constantes dos autos do

processo principal, detalhadamente contrastadas naquele decisum

colegiado, os Julgadores de Segunda Instância concluíram que o dolo

dos integrantes da organização criminosa esteve voltado, desde o

início da empreitada delituosa, à obtenção de vantagem indevida,

através da violação do dever funcional pelos agentes públicos

federais, que facilitavam a passagem de mercadorias estrangeiras

ilícitas pela Ponte Internacional da Amizade (....)

Fundamentalmente, trata-se de avaliação fática em derredor do animus

dos acusados, concluindo aquele Colegiado, à luz das provas

produzidas, que os réus agiram com unidade de desígnios em torno de

um único objetivo - obtenção de vantagem indevida. Destarte, forçoso

é reconhecer que refutar tal entendimento, a fim de se concluir pela

existência de crimes autônomos, envolveria, necessariamente, o

reexame das provas carreadas aos autos, o que torna inviável o

conhecimento do reclamo nobre (....)". (fl. 9917).

Esse entendimento tem amparo em farta jurisprudência dessa eg.

Corte. Destaco, por sua pertinência à espécie, os seguintes

julgados:

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL. DISPARO ABSORVIDO

PELA LESÃO CORPORAL LEVE CAUSADA NA VÍTIMA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO

DA CONSUNÇÃO. POSSIBILIDADE. INTENÇÃO DO AGENTE DE LESIONAR A

VÍTIMA.REVISÃO. SÚMULA 7/STJ.

1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de

que 'o princípio da consunção pressupõe que haja um delito-meio ou

fase normal de execução do outro crime (crime-fim), sendo que a

proteção de bens jurídicos diversos e a absorção de infração mais

grave pelo de menor gravidade não são motivos para, de per si,

impedirem a referida absorção' (AgRg no REsp 1472834/SC, Rel.

Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 07/05/2015,

DJe 18/05/2015). Precedentes.

2. O Tribunal a quo, ao aplicar o princípio da consunção, consignou

que a  intenção do réu era ofender a integridade física da vítima,

logo, o delito insculpido no artigo 15 da Lei 10.826/2003 não foi

nada mais do que o "crime-meio" para a execução da lesão corporal,

'crime-fim' almejado. Ora, alterar as conclusões consignadas no

acórdão recorrido, para decidir de forma diversa, como requer a

parte recorrente, afastando a aplicação do princípio da consunção,

exigiria a incursão no conjunto fático-probatório e nos elementos de

convicção dos autos, o que não é possível nesta Corte Superior.

Incidência da Súmula 7/STJ.

3. Agravo regimental improvido."

(AgRg no REsp 1221504/MG, Quinta Turma,  Rel. Min.  Reynaldo Soares

da Fonseca, DJe 01/12/2015)

"PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FRAUDE À

LICITAÇÃO. ELEVAÇÃO ARBITRÁRIA DE PREÇOS PARA LICITAÇÃO. MALVERSAÇÃO

DE VERBAS DE SAÚDE. (....) REVOLVIMENTO DE MATÉRIA

FÁTICO-PROBATÓRIA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE

VERIFICAÇÃO NA VIA ELEITA. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO.

(....)

V - Na hipótese, não há falar em aplicação do princípio da consunção

entre o crime de resistência e o de desobediência, mormente neste

momento processual, já que a avaliação da sua incidência demandaria

profunda valoração probatória, devendo ser sopesada por ocasião da

prolação da sentença.

Recurso ordinário desprovido."

(RHC 59.287/RS, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe 25/11/2015)

"PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO

ESPECIAL. ROUBO MAJORADO E EXTORSÃO. CONDUTAS PRATICADAS NO MESMO

CONTEXTO FÁTICO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. AFASTAMENTO. REEXAME DO

CONTEXTO FÁTICO PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL

IMPROVIDO.

1. No recurso especial, sustenta o Parquet ser imprópria a aplicação

do princípio da consunção ao caso, porquanto que não haveria crime

único e, sim, concurso material entre os delitos de extorsão

qualificada  (art. 158, § 3º, do CP) e roubo majorado (art. 157, §

2º, I e II, do CP).

2. Tendo a Corte de origem, ao analisar as provas constantes nos

autos, entendido que os crimes teriam ocorrido no mesmo contexto

fático, não há como modificar o acórdão atacado, em razão da

necessidade de incursão no contexto probatório, óbice intransponível

nos termos da Súmula n. 7/STJ.

3. Agravo regimental improvido."

(AgRg no AREsp 399.982/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe

19/11/2015)

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO

ESPECIAL. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO. AFASTAMENTO DAS

QUALIFICADORAS. MOTIVO TORPE E MEIO CRUEL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7

DO STJ. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO.

CONSUNÇÃO.SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. O exame da pretensão recursal, para se concluir pelo afastamento

das qualificadoras previstas nos incisos I e III do § 2º do art. 121

do Código Penal, implica a necessidade de revolvimento do suporte

fático-probatório delineado nos autos. Incidência da Súmula n. 7 do

STJ.

2. A análise acerca da incidência do princípio da consunção demanda

o reexame das provas amealhadas aos autos, o que é vedado em recurso

especial, consoante o enunciado da Súmula n. 7 do STJ.

3. Agravo regimental não provido."

(AgRg no AREsp 296.159/DF, Sexta Turma, Rel. Min. Rogerio Schietti

Cruz, DJe 29/10/2015)

Desse modo, em razão da necessidade de revolvimento de matéria

fático-probatória, tema não suscetível de análise na presente sede

especial em razão da aplicação da Súmula 7/STJ, tenho que o recurso

do MPF não merece seguimento.

Analiso, agora, o recurso especial interposto pelos réus às (fls.

9.612/9709), no qual os recorrentes apontam ofensas a dispositivos

de índole constitucional e infraconstitucional.

No que concerne à alegada violação às normas constitucionais

especificadas na peça recursal (no caso, o art. 5º, incisos LV, LVI

e LVII, e o art. 93, inciso IX, da CF), cumpre ter presente, desde

logo, que "em sede de recurso especial é inviável qualquer discussão

acerca da violação de normas constitucionais."(AgRg no AREsp

477.994/SP, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe 11/06/2015).

Assim, nesse ponto, o recurso especial dos réus não merece

conhecimento.

Passo ao exame das alegadas violações a dispositivos de caráter

infraconstitucional.

Nas razões de seu recurso especial, inicialmente, o recorrente

aponta a "nulidade do acórdão recorrido", pela "negativa de vigência

ao art. 156, II, art. 159, caput e seus parágrafos e art. 160 do

CPP", diante da "Inexistência de perícia para atestar idoneidade do

funcionamento do sistema guardião" (fl. 9616).

Aduz que "a decisão judicial proferida em desfavor dos recorrente

demonstra falta de clareza acerca da fonte probatória que levou o

Tribunal a quo a informar o funcionamento do Sistema Guardião, sem a

indispensável prova pericial, constituindo-se nulidade flagrante por

cerceamento de defesa (...)" (fl. 9618).

Segundo entende, a prova decorrente da interceptação telefônica

existente nos autos deve ser considerada inexistente, uma vez que o

"instrumento de captação de conversa telefônica" não foi periciado

e, por isso, a sua funcionalidade não pode ser atestada, não se

revelando lícito, ainda, ao eg. Tribunal a quo "defender a

legalidade da prova sem uma conclusão de perito oficial, ou seja,

sem qualquer conhecimento técnico retido nos autos" (fl. 9618).

Ao resolver a questão, o eg. Tribunal a quo destacou que o ilustre

magistrado de primeiro grau indeferiu o pleito de realização de

perícia em razão da formulação de "(....) pedidos genéricos, que nem

ao menos indicavam o que pretendiam comprovar através da realização

da diligência, ou, ainda, qual o áudio suspeitava-se ter sido

adulterado ou não ter partido da pessoa do postulante, quer seja

porque não demonstraram a necessidade de ser realizado o exame,

sendo certo que a mera alegação do réu no sentido de que não

realizou os referidos diálogos não autoriza o deferimento da

diligência, sobremaneira porque os diálogos interceptados

encontram-se em consonância com os demais elementos de provas" (fl

9.436).

Sobre a questão, o decisum questionado acrescentou a desnecessidade

de realização de perícia no equipamento de gravação, na medida em

que a possibilidade de manipulação e/ou edição das interceptações

telefônicas efetuadas pelo "Sistema Guardião" seria inexistente.

Segundo restou consignado no r. voto condutor "(....) todos os dados

e eventos ocorridos na plataforma ficam arquivados em banco de dados

sem possibilidade de alteração" (fl. 9436).

Nesse ponto, vale referir que é farta a jurisprudência desta Corte

no sentido de que "Ao magistrado é facultado o indeferimento, de

forma fundamentada, do requerimento de produção de provas que julgar

protelatórias, irrelevantes ou impertinentes, devendo a sua

imprescindibilidade ser devidamente justificada pela parte.

Doutrina. Precedentes do STJ e do STF" (HC 313.098/SP, Quinta Turma,

Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 17/12/2015).

Assim, não há qualquer ilegalidade a ser reparada por esta eg. Corte

no que concerne ao indeferimento do pleito pericial em questão.

Outra alegação que deve ser afastada de plano diz respeito à

nulidade do v. acórdão recorrido no ponto em que manteve a perda dos

cargos públicos de dois dos recorrentes (O. A de M. e M. O. M).

Sobre a questão, os recorrentes alegam que "o v. acórdão recorrido

culminou a perda do cargo público de policial federal ocupado pelos

recorrentes, mas limitou-se à menção da motivação vazada na sentença

de Primeiro Grau" (fl. 9619).

Também nesse ponto, entendo não assistir razão aos recorrentes, uma

vez que, segundo a atual jurisprudência dessa eg. Corte Superior de

Justiça, é "Legítima a decretação da perda do cargo público pela

sentença, se a decisão foi devidamente fundamentada na relação entre

o uso do cargo e a prática delituosa" (HC 192.074/PR, Sexta Turma,

Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe 15/12/2015).

No caso dos autos, vale destacar que o v. acórdão recorrido, em

consonância com esse entendimento, salientou que "Na hipótese

vertente, entendo que merece ser mantido o perdimento do cargo,

porque a gravidade dos delitos objetos de apreciação nesta ação

penal (....) implicaram violação ao dever de lealdade com a

Administração Pública (....) de modo que se encontra devidamente

justificada a imposição da sanção (art. 92, inciso I, alíena 'a' do

CP) (fl. 9521).

Assim, nada há a ser provido nesse específico tópico recursal.

Posteriormente, os recorrentes apontam a "nulidade absoluta", por

inépcia, da denúncia oferecida nos presentes autos, na medida em que

se teria omitido, na inicial acusatória, a "imputação fática típica

objetiva e subjetiva individualizada" (fl. 9621).

Em sua peça recursal, aduzem os recorrentes que "não há na denúncia

a narração/descrição fática objetiva e subjetiva individualizada da

execução ou da consumação de qualquer fato típico, ilícito e

culpável, supostamente praticados pelos recorrentes, o que

indubitavelmente, impediu a defesa ampla" (fl. 9622).

Por isso, entendem por violado o art. 41 do Código de Processo

Penal.

Para análise desse tópico recursal, destaco, inicialmente, o

panorama geral das condutas atribuídas a todos os denunciados, que

são mais de 40 (quarenta), no presente feito:

"(...) todos denunciados neste feito, estariam intermediando

acertos entre funcionários públicos federais (Agentes da Polícia

Federal, Técnicos da Receita Federal e Policiais Rodoviários

Federais), lotados na Ponte Internacional da Amizade, e compradores

de mercadorias no Paraguai, para que os agentes públicos permitissem

a entrada no País de mercadorias estrangeiras provenientes do

Paraguai, sem fiscalização, mediante o pagamento/recebimento de

dinheiro

Em decorrência disto a Autoridade Policial representou à Justiça

Federal pela interceptação das comunicações telefônicas dos

envolvidos acima nominados, tendo o pedido sido deferido pelo MM

Juízo Federal da 1ª Vara Criminal de Foz do Iguaçu, nos precisos

termos da lei de n.º 9.296/96

Para realizar o acompanhamento das investigações foram designados

pela Coordenação de Inteligência do Departamento de Polícia Federal

(Cl/DPF) um Delegado e vários Agentes Federais para, em conjunto Com

Agentes Federais do Núcleo de Inteligência da Delegacia de Polícia

Federal de Foz do Iguaçu, efetuarem o acompanhamento, nos moldes da

lei de n° 9.034/95, dos fatos aparentemente delituosos, dando início

a nominada OPERAÇÃO SUCURI.

Bastaram apenas 15 dias de interceptação das comunicações

telefônicas dos denunciados (....), para se descortinar a existência

de uma ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ESTABELECIDA DENTRO DO ESTADO, com a

efetiva participação de Agentes Federais, Técnicos da Receita

Federal e Policiais Rodoviários Federais, facilitando a entrada no

País de mercadorias ilícitas (contrabando) e de mercadorias lícitas

sem o devido pagamento dos tributos incidentes pelo seu ingresso em

solo pátrio (descaminho).

Em conseqüência disto foram prorrogadas as interceptações das

comunicações telefônicas dos denunciados acima mencionados, bem como

estendida a interceptação para outros membros da quadrilha, conforme

se verifica da análise do Procedimento Criminal Diverso n°

2002.70.02.007647-1.

Ao final de mais de 90 dias de investigações pode-se visualizar, com

clareza, o modo de atuação do bando formado por Servidores Públicos

Federais, contrabandistas e intermediários, detalhando-se a maneira

como lesavam o Estado Brasileiro, auferindo vantagem indevida,

permitindo a entrada no País, através da Ponte Internacional da

Amizade, de mercadorias frutos de contrabando/descaminho, mediante o

pagamento/recebimento de dinheiro (....)" (fls. 16-20).

No que concerne ao primeiro recorrente a denúncia afirma que ele

teria acertado "valores para passagem de veículos sem fiscalização

pela Aduana Brasileira localizada na Ponte Internacional da Amizade"

(fl. 19). Além disso, os três recorrentes também teriam se omitido,

"de forma consciente e voluntária, de fiscalizar os veículos cujas

placas eram fornecidas pelos intermediários (....), ou realizar

fiscalização ficta, abordando veículos para simular uma pseudo

fiscalização, sendo os veículos liberados sem nenhuma mercadoria

apreendida. Para facilitar a passgem dos veículos pela Ponte

Internacional da Amizade, com mercadorias

descaminhadas/contrabandeadas, os Servidores Públicos Federais acima

mencionados recebiam, rotineiramente, determinada quantia em

dinheiro dos contrabandistas (....) dentre outros não identificados.

O pagamento da propina, bem como a negociação do valor, era

realizada através dos intermediários (....), que, após faziam o

pagamento aos Servidores Públicos Federais " (fl. 20-21).

Ainda segundo a inicial: (fl. 21)

"Os Agentes Federais, ainda, faziam uso de armas de fogo para

intimidar Servidores da Receita Federal que não participavam da

quadrilha, além de determinarem que os veículos não parassem na

aduana Brasileira caso fossem abordados para fiscalização por

servidores da Receita Federal que não participavam do "esquema",

mediante promessa de que atirariam para o alto, simulando ação de

austeridade na persecução dos veículos que se furtavam a

fiscalização da Receita Federal.

A materialidade dos delitos imputados aos denunciados encontra-se

amplamente demonstrada no Procedimento Criminal Diverso n°

2002.70.02.007647-1, nos relatórios de inteligência realizado nos

materiais aprendidos na posse dos denunciados, anexo VI, bem como no

diagrama de cruzamento entre os dados do auto circunstanciado e

dados das escalas, livros de plantão da Polícia Federal, da Receita

Federal e Polícia Rodoviária Federal constante do apenso V."

Por isso, conclui a inicial da acusação, os recorrentes, dentre

outros denunciados, "(....) solicitaram e receberam, para si e para

outrem, direta e indiretamente, em razão da função, vantagem

indevida, além de aceitaram promessa de tal vantagem, deixando de

praticar ato de ofício visando facilitar, com infração de dever

funcional, a prática de contrabando e descaminho. Registra-se que,

in casu, em conseqüência da vantagem e da promessa de vantagem os

denunciados acima citados deixaram efetivamente de praticar o ato de

ofício." Além disso, "associaram-se em quadrilha ou bando para

cometerem crimes, com a utilização de armas" (fl 23).

A leitura dos trechos transcritos revela que a peça de acusação não

revela a existência dos vícios que os recorrentes apontam. Sobre a

questão, vale rememorar a denúncia deve conter a exposição do fato

delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias.

Essa narração impõe-se ao acusador como exigência derivada do

postulado constitucional que assegura ao réu o pleno exercício do

direito de defesa. A inépcia da denúncia caracteriza situação

configuradora de desrespeito estatal ao postulado do devido processo

legal, isso porque a imputação penal contida na peça acusatória não

pode ser o resultado da vontade pessoal e arbitrária do órgão

acusador.

No caso em apreço, a denúncia (fls. 6-25) e o aditamento à denúncia

(fls. 32-50) contêm a individualização dos denunciados (no caso,

mais de 40 denunciados), a descrição dos fatos delituosos, a

classificação dos crimes e o rol de testemunhas, de modo que está de

acordo com os requisitos exigidos no art. 41 do CPP.

Além disso, convém rememorar que a presente ação penal cuida de

delitos em que figuram como réus mais de 40 (quarenta) acusados, e

que, nesses casos (de co-autoria), conforme entendimento desta eg.

Corte Superior, não é imprescindível (na denúncia) a

individualização da conduta de forma pormenorizada, como ocorre, in

casu (RHC 53.715/CE, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe

25/03/2015, v.g.) .

Nesse sentido, dentre outros, destaco:

"HABEAS CORPUS. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CO-AUTORIA. DENÚNCIA. ALEGADA

INÉPCIA. INICIAL ACUSATÓRIA QUE DESCREVE CRIME EM TESE  E ATENDE AOS

REQUISITOS LEGAIS EXIGIDOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO

(....)

2. Nos chamados crimes de autoria coletiva, embora a vestibular

acusatória não possa ser de todo genérica, é válida quando, apesar

de não descrever minuciosamente as atuações individuais dos

acusados, demonstra um liame entre o agir da paciente e a suposta

prática delituosa, estabelecendo a plausibilidade da imputação e

possibilitando o exercício da ampla defesa, caso em que se entende

preenchidos os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal.

Precedentes (....)2. Ordem denegada"

(HC 211.586/PB, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de

13/10/2011).

No que concerne à alegada violação ao disposto no art. 514 do Código

de Processo Penal, em virtude da "ausência de notificação para

apresentação da defesa antes do recebimento da denúncia" (fl. 9628),

cumpre ter presente que "Este Superior Tribunal consolidou o

entendimento de que a notificação do funcionário público, nos termos

do art. 514 do Código de Processo Penal, não é necessária quando a

ação penal for precedida de inquérito policial. Súmula n. 330 do

STJ."(HC 237.881/BA, Sexta Turma, Rel. Min.  Rogerio Schietti Cruz,

DJe 27/10/2015, grifei).

No caso, a denúncia foi oferecida, nos termos da orientação que

venho de referir, "com fulcro no Inquérito Policial Federal de n.º

2003.70.02.001463-9" (fl. 6), o que, nos termos da Súmula 330/STJ,

torna desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514

da Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito

policial.

O recurso também não pode prosperar quanto à alegação segundo a qual

os réus não poderiam ser sujeitos ativos do delito tipificado no

art. 318 do Código Penal, em virtude da ausência de dever funcional

em zona primária de fiscalização de veículos. No ponto, asseveram

que enquanto os 'contrabandistas', 'atravessadores', 'muambeiros'

ou meramente 'compristas' estiverem em zona primária nada há de se

fazer pela Polícia Federal, exceto quando introduzidas em território

nacional por via não autorizada, ilidindo o fisco, pois, enquanto

presentes na Aduana, a posse de mercadorias não é considerada

ilícita (fl. 9.683).

O fato é que essas questões não foram debatidas no v. acórdão

recorrido. Dessa forma o recurso não pode ser conhecido em virtude

da ausência prequestionamento. Incidem na espécie, portanto, as

Súmulas 282 e 356/STF.

Nesse sentido:

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. CRIME DE CONCUSSÃO.

CONDENAÇÃO. RESP INADMITIDO. ARESP NÃO PROVIDO.  PREQUESTIONAMENTO

DO TEMA RECORRIDO. INOCORRÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356 DO SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL. APLICAÇÃO.

1. A ausência de pronunciamento pelo Tribunal de Justiça em torno da

questão contida nos dispositivos da legislação federal invocada

impede o conhecimento do recurso especial, pela falta de

prequestionamento.

2.  A matéria que não é objeto de debate na origem e sobre a qual

sequer há oposição de embargos de declaração com o fim de forçar a

sua análise, atrai, por consequência, a incidência da Súmulas

Súmulas 282 e 356/STF.

3. É de se destacar, outrossim, que, ainda que a violação a lei

federal tenha origem no acórdão proferido pelo Tribunal local, o

requisito do prequestionamento pode (e deve) ser suprido por meio

dos embargos de declaração, que, in casu, não foram sequer opostos.

(...)

5. Agravo regimental não provido (AgRg no AREsp 422.841/RO, Quinta

Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe 27/8/2014).

Posteriormente, em suas razões recursais, os recorrentes questionam

a legalidade do procedimento de interceptação telefônica. Nesse

ponto, tenho por suficientes para afastar tais alegações, as doutas

considerações constantes da manifestação do Ministério Público

Federal produzidas nos presentes autos e que, a seguir transcritas,

adoto como razão de decidir:

"(....)  Quanto às teses de violação dos arts. 157 e 184, ambos do

Código de Processo Penal, e dos arts. 2º, incisos I, II e III, 4º e

6º, §1º, todos da Lei nº 9.296/96, as testes defensivas não merecem

guarida.

É certo que a Carta da República assegurou, como direito

fundamental, a inviolabilidade da vida privada e da intimidade de

qualquer pessoa, estabelecendo, em seu art. 5º, inciso XII, o

direito à inviolabilidade do sigilo da correspondência e das

comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas,

salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma

que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou

instrução processual penal.

Sem dúvida, é a tutela jurídica da intimidade uma das mais

significativas expressões dos direitos da personalidade, tratando-se

de valor constitucionalmente assegurado, cuja proteção normativa

busca garantir, em favor do indivíduo, esfera de autonomia a salvo

do arbítrio do Estado.

Todavia, tal direito à inviolabilidade não se reveste de caráter

absoluto, cedendo espaço, excepcionalmente, às exigências impostas

pela preponderância do interesse público, quando há fundados

elementos de suspeita, apoiados em indícios idôneos e reveladores de

prática delituosa.

No que tange à garantia do sigilo das comunicações telefônicas, a

Lei Maior prevê, expressamente, que a interceptação só será admitida

para fins de investigação criminal ou de instrução processual penal.

Regulamentando a parte final do inciso XII, do prefalado dispositivo

constitucional, a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, cuida, em

seu art. 2º, de outros requisitos indispensáveis à medida cautelar

em apreço, quais sejam, a existência de indícios razoáveis de

autoria ou de participação em infração penal, a indisponibilidade de

outros meios de prova para o esclarecimento do fato e a previsão de

reprimenda corporal reclusiva, como punição à conduta investigada.

Demais disso, a providência deve ser autorizada por decisão judicial

fundamentada, dela fazendo-se constar a descrição clara da situação

objetivada no apuratório, inclusive, com a indicação e a

qualificação dos envolvidos, nos termos do quanto preconizado nos

arts. 2º, Parágrafo único, 3º e 5º, do referido Diploma Legal.

No caso sob análise, sustenta a Defesa que a quebra de sigilo

telefônico foi lastreada, tão somente, em denúncia anônima, sendo,

por tal razão, nula. Entretanto, verifica-se dos autos que as

interceptações telefônicas somente foram autorizadas após uma série

de diligências de cunho investigativo, que demonstraram, com

clareza, a necessidade da medida de invasão.

Consoante se infere do in folio , após receber notitia criminis

apócrifa, dando conta da existência de estruturada organização

criminosa atuante na Ponte Internacional da Amizade, voltada ao

ingresso, no território nacional, de mercadorias estrangeiras

ilícitas ou, ainda, sem o pagamento dos tributos devidos, a

Autoridade Policial passou a investigar o caso, havendo solicitado a

quebra do sigilo de dados telefônicos dos investigados, a fim de

verificar o exato grau de envolvimento de cada um com os crimes de

corrupção passiva, facilitação de contrabando e formação de

quadrilha.

Imperioso lembrar o pacífico entendimento dos Tribunais Pátrios de

que a denúncia anônima é instrumento perfeitamente capaz de ensejar

a realização de procedimentos de averiguação, consoante se depreende

dos arestos adiante colacionados:

EMENTA: 'PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA.

INQUÉRITO POLICIAL. INSTAURAÇÃO. 'DENÚNCIA ANÔNIMA'. SUPERVENIENTE

COLHEITA DE PROVAS ANTES DA INSTAURAÇÃO DA FORMAL INVESTIGAÇÃO.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA. NOTÍCIA DE FALECIMENTO DE UM DOS

PACIENTES. ORDEM PREJUDICADA EM PARTE.

1. A Constituição Federal veda o anonimato, o que tinge de

ilegitimidade a instauração de inquérito policial calcada apenas em

comunicação apócrifa. Todavia, na hipótese, a notícia prestou-se

apenas a movimentar o

Ministério Público que, após diligenciar, cuidou de, higidamente,

requisitar o formal início da investigação policial.

2. Com a notícia do falecimento de um dos pacientes, resta

prejudicada em parte a ordem.

3. Ordem em parte prejudicada e, na parte conhecida, denegada.' (STJ

- HC 53.703/RJ - Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA -

Sexta Turma - Julgamento em 02.04.2009 - DJe de 17.08.2009) 

Destacou-se.

EMENTA: 'HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE JOGO DO BICHO E

POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. DENÚNCIA

ANÔNIMA. MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. OBSERVÂNCIA DOS DITAMES

LEGAIS. VALIDADE DA PROVA COLHIDA. ORDEM DENEGADA.

1. Ainda que com reservas, a denúncia anônima é admitida em nosso

ordenamento jurídico, sendo considerada apta a deflagrar

procedimentos de averiguação conforme contenham ou não elementos

informativos idôneos suficientes, e desde que observadas as devidas

cautelas no que diz respeito à identidade do investigado.

2. Ao receber a denúncia anônima, o membro do Ministério Público, em

observância aos preceitos legais, solicitou à Autoridade Policial

que realizasse investigações a fim de verificar os fatos narrados e,

após evidenciada a verossimilhança da narrativa, requereu ao Juízo

competente a expedição de mandado de busca e apreensão, onde foram

apreendidos os bens utilizados no jogo do bicho e as munições em

desacordo com a determinação legal. 3. Descabe o trancamento da ação

penal, porque não se mostra ilícita a prova colhida em desfavor do

acusado, bem como foram obtidos elementos probatórios suficientes

para embasar a acusação contra o Paciente.

4. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

5. Ordem denegada.' (STJ - HC 83.830/PR - Relatora Ministra LAURITA

VAZ - Quinta Turma - Julgamento em 03.02.2009 - Dje de 09.03.2009).

- Grifou-se.

Nesse contexto, por entender presentes os pressupostos legais e

constitucionais autorizadores da providência extrema, explicitados

os indícios da prática delituosa e registrada, também, a

inexistência de outros meios menos invasivos e igualmente eficientes

para a plena elucidação dos acontecimentos, o Magistrado Singular

deferiu as interceptações e as prorrogações requeridas.

Em situações de tal jaez, a inviabilidade da eficiente obtenção de

provas por outras vias é patente, porquanto, conforme explicitado

pelo Juízo Singular, 'o próprio modus operandi pelo qual a suposta

organização criminosa atua, especialmente em relação aos servidores

públicos, seria, em tese, na modalidade de incitação a práticas

omissivas, as quais dificilmente, por outros meios de prova (menos

cautelares e urgentes, por certo) poderiam ser descobertos' (e-STJ

fl. 9.422).

Além disso, as manobras típicas do crime organizado são feitas, na

sua absoluta maioria, por telefone ou por serviços de voz sobre IP

(VOIP), sendo do conhecimento de todos as dificuldades que cercam a

tarefa de identificação de agentes envolvidos, que se valem de

inúmeros recursos para acobertar suas atividades ilícitas.

Assim, demonstradas a existência de indícios razoáveis de

materialidade das infrações penais investigadas, a indisponibilidade

de outros meios de prova e a indispensabilidade da medida extrema em

testilha, mostraram-se preenchidos contrariamente ao quanto

asseverado pelos ora Recorrentes os requisitos exigidos na Lei nº

9.296/96 para a quebra inaugural do sigilo das comunicações

telefônicas objeto do procedimento inquisitório, por meio da qual se

obteve, posteriormente, provas cabais do envolvimento dos acusados

nos crimes apurados.

Ultrapassado o prazo inicial de duração da medida cautelar de que se

cogita, com amparo na regra inserta no art. 5º da Lei nº 9.296/96,

que permite a elasticidade da diligência e uma vez constatada sua

indispensabilidade como meio de prova, o Juízo de Primeiro Grau de

Jurisdição deferiu sucessivas prorrogações das interceptações

telefônicas em testilha, sempre amparado nos relatórios de análise

das escutas realizadas.

Nesse diapasão, não merece guarida a tese defensiva de ilicitude

daquelas prorrogações determinadas pelo Magistrado Singular.

É cediço que a interceptação telefônica deve perdurar pelo tempo

necessário à completa investigação dos ilícitos penais, sendo que o

prazo legal de 15 (quinze) dias para a realização do ato

investigativo, expressamente previsto no art. 5º da Lei nº 9.296/96,

pode ser renovado por igual período, sem qualquer restrição no

tocante à quantidade de prorrogações a serem efetivadas, desde que

comprovada a imprescindibilidade do meio de prova em questão.

É certo, ainda, distintamente do que se dá por ocasião da primeira

decisão judicial limitadora do direito à intimidade, que o que

importa para a renovação da medida excepcional é que o juiz tenha

conhecimento do que está sendo investigado, justificando o

prosseguimento da interceptação, mediante a demonstração de sua

indispensabilidade.

Neste sentido posicionou-se o Pleno do Supremo Tribunal Federal, no

julgamento do Habeas Corpus nº 83.515/RS (DJU de 04.03.2005),

entendendo ser 'possível a prorrogação do prazo de autorização para

a interceptação telefônica, mesmo que sucessivas, especialmente

quando o fato é complexo a exigir investigação diferenciada e

contínua'. Do voto condutor do aresto, então, proferido, da lavra do

Ministro NELSON JOBIM, extrai-se a orientação de que o juízo acerca

da necessidade na renovação das autorizações de interceptação

telefônica deve levar em conta a natureza dos fatos e dos crimes e

das circunstâncias que envolvem o caso. O julgamento teve por base

doutrina amplamente majoritária, citada pelo eminente Relator, tendo

como defensores VICENTE GRECO FILHO, ANTÔNIO SCARANCE FERNANDES,

DAMÁSIO DE JESUS E LUIZ FLÁVIO GOMES.

O mesmo posicionamento foi sufragado pelo Excelso Pretório no bojo

do Recurso em Habeas Corpus nº 88.731/SP (voto unânime, publicado no

DJ em 02.02.2007) e em julgamento realizado, em novembro de 2008,

nos autos do Inquérito nº 2.424/RJ, em que se ratificou a licitude

da prorrogação do prazo para a interceptação telefônica, ainda que

de modo sucessivo, quando o fato seja complexo e o imponha sua

investigação.

Na hipótese sob exame, os acontecimentos sob apuração, de extrema

complexidade, envolvendo grande rede voltada à internação, no

Brasil, de mercadorias adquiridas no Paraguai, sem qualquer

impedimento ou fiscalização por parte das autoridades brasileiras,

ensejaram trabalho policial diferenciado, com a consequente quebra

do sigilo telefônico dos investigados.

Conforme destacado pelo Pretório a quo , 'Na hipótese, a renovação

automática tinha razão de ser pela probabilidade de maiores

desdobramentos da complexa teia delituosa, os quais somente seriam

esclarecidos por meio das investigações policiais, cuja interrupção

repentina poderia causar prejuízos inestimáveis à elucidação dos

fatos, mormente considerada a complexidade e quantidade elevada de

pessoas, exigindo, então, investigação diferenciada e contínua.'

(e-STJ fl. 9.433).

Sendo assim, as escutas telefônicas deferidas deveriam, mesmo,

perdurar por mais tempo, relevantes que se apresentavam à plena

elucidação dos fatos delituosos, mostrando-se pertinente o juízo de

conveniência da autoridade judiciária, que justificou,

satisfatoriamente, as prorrogações da medida acautelatória em tela.

Dessa forma, tem-se que a autorização originária e as prorrogações

das interceptações telefônicas combatidas no presente reclamo nobre

obedeceram os ditames da Constituição Federal e da Lei nº 9.296/96,

inexistindo qualquer mácula a invalidar as decisões que estenderam a

providência vergastada.

Acerca do tema, seguem reproduzidos os seguintes precedentes desse

Augusto Sodalício:

EMENTA (parcial): 'PENAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CORRUPÇÃO ATIVA.

LAVAGEM DE DINHEIRO. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ESTELIONATO. TIPICIDADE.

PROCESSO PENAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. PROCEDIMENTO INVESTIGATIVO

CRIMINAL. INICIATIVA. LEGALIDADE.

[...]

7. Ao autorizar a interceptação das comunicações telefônicas,

fundamentou o Juiz de maneira suficiente, determinando zelosa

observância da garantia ao sigilo, razão por que não constitui causa

de nulidade processual.

8. A impossibilidade de obtenção das provas por outros meios,

esgotadas as investigações levadas a efeito sobre a documentação

apreendida, é mesmo motivo suficiente para autorizar a interceptação

das comunicações telefônicas e telemáticas, e a sua prorrogação,

enquanto necessária, não configura constrangimento ilegal.

Precedentes.

[...] 12. Ordem denegada. (STJ - HC 190.917/SP - Relator Ministro

CELSO LIMONGI (Desembargador convocado do TJ/SP) - Sexta Turma -

Julgamento em 15.03.2011 - Dje de 28.03.2011) Grifou-se.

EMENTA: 'INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS.

DILIGÊNCIAS QUE ULTRAPASSAM O LIMITE DE 30 (TRINTA) DIAS PREVISTO NO

ARTIGO 5º DA LEI 9.296/1996. POSSIBILIDADE DE VÁRIAS RENOVAÇÕES.

EXISTÊNCIA DE DECISÕES FUNDAMENTADAS. ILICITUDE NÃO CARACTERIZADA.

DENEGAÇÃO DA ORDEM.

1. Apesar de no artigo 5º da Lei 9.296/1996 se prever o prazo máximo

de 15 (quinze) dias para a interceptação telefônica, renovável por

mais 15 (quinze), não há qualquer restrição ao número de

prorrogações possíveis, exigindo-se apenas que haja decisão

fundamentando a dilatação do período. Doutrina. Precedentes.

2. Ordem denegada.'

(STJ - HC 121.340/AM - Relator Ministro JORGE MUSSI - Quinta Turma

- Julgamento em 01.03.2011 - DJe de 25.04.2011) Destacou-se.

Noutra alheta, diversamente do quanto pretende fazer crer a Defesa,

a Lei nº 9.296/96 não estabelece a obrigatoriedade da degravação

integral das conversas obtidas pelos monitoramentos telefônicos.

Pelo contrário, o art. 6º, §2º, da Legislação em comento determina

que, cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o

resultado da interceptação ao juiz, acompanhado de auto

circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações

realizadas.

Manifestando-se em derredor do tema posto sub judice , o Supremo

Tribunal Federal firmou entendimento no sentido da prescindibilidade

da transcrição total das conversas, sendo suficiente a juntada da

degravação dos excertos necessários ao embasamento da denúncia, não

configurando, portanto, ofensa ao princípio do devido processo legal

a ausência do inteiro teor dos diálogos monitorados. É o que se

depreende do julgado adiante colacionado:

EMENTA: 'PROCESSUAL PENAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CERCEAMENTO DE

DEFESA. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIA PROBATÓRIA. OFENSA REFLEXA.

INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS JUDICIALMENTE AUTORIZADAS.  DEGRAVAÇÃO

INTEGRAL. DESNECESSIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.

I - Este Tribunal tem decidido no sentido de que o indeferimento de

diligência probatória, tida por desnecessária pelo juízo a quo, não

viola os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Precedentes.

II - No julgamento do HC 91.207-MC/RJ, Rel.

para o acórdão Min. Cármen Lúcia, esta Corte assentou ser

desnecessária a juntada do conteúdo integral das degravações das

escutas telefônicas, sendo bastante que se tenham degravados os

excertos necessários ao embasamento da denúncia oferecida.

III - Impossibilidade de reexame do conjunto fático probatório.

Súmula 279 do STF. IV - Agravo regimental improvido.' (STF AI

685.878 Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI Primeira Turma 

Julgado em 05.05.2009 DJe de 10.06.2009) Grifou-se.

Dessarte, não há falar em cerceamento de defesa baseado na violação

dos arts. 156, inciso II, 159, 160 e 564, inciso IV, todos do Código

de Processo Penal, e do art. 8º, nº 2, do Pacto de São José da Costa

Rica, como resultado da falta de determinação, pelo Juiz da

Instância de Piso, da transcrição integral das conversas

interceptadas no curso do inquérito policial, mormente considerando

que a Defesa teve amplo acesso à totalidade do material resultante

da diligência sob análise. Frise-se, ainda, haver o Pretório Federal

entendido ser desnecessária a providência aqui almejada pelos ora

Recorrentes, com supedâneo, também, na ausência de suspeita sobre a

autenticidade das gravações, conforme se extrai das seguintes

passagens do aresto combatido (fls. 429/430):

'Sobre a aventada ausência de disponibilização dos áudios às partes

interessadas, tal alegação não corresponde ao que realmente ocorreu

no processamento deste feito e dos demais processos conexos.

(&) Outro ponto de interesse neste feito diz respeito aos repetidos

indeferimentos dos reiterados pedidos de perícia nos áudios e no

disco rígido do sistema de registro e gravação (Hard Disk) frente a

uma sugerida manipulação e/ou edição das interceptações efetuadas

por meio do Sistema Guardião plataforma de comunicação digital

utilizada pela Polícia Federal.

Os argumentos defensivos foram, no entender desta Relatoria,

acertamente rejeitados pelo julgador monocrático.

(&) Primeiramente, deve ser esclarecido o funcionamento do Sistema

Guardião.

Esse sistema, produzido pela empresa Dígitro Tecnologia

(www.digitro.com.br), recebe, em sua plataforma, as comunicações dos

telefones interceptados (alvos) da operadora, mediante autorização

judicial, desviando-as para um policial cadastrado na operação

(processo de siga-me). Ato contínuo, essas comunicações são

convertidas em dados (comutação) e, posteriormente, gravados em um

Compact Disk (CD) que será entregue à autoridade judicial.

Um dos aspectos que merece destaque é que esse programa permite

acesso às comunicações telefônicas (móvel, fixo e fax) e aos

chamados torpedos (SMS Short Message Service), mas impede qualquer

tipo de edição, supressão ou inclusão de diálogos. Trata-se, em

verdade, de um sistema 'passivo' e não 'ativo', ou seja, apenas

recebe as comunicações interceptadas que são enviadas pelas

operadoras mediante a conferência da autorização judicial.

Não há, pois, possibilidade técnica de o Sistema Guardião capturar

uma linha telefônica para monitoramento sem intervenção das

operadoras de telefonia. Além disso, todos os dados e eventos

ocorridos na plataforma ficam arquivados em banco de dados sem

possibilidade de alteração

Sobre o tema da imprescindibilidade de perícia em áudios

decorrentes de interceptação telefônica, o Supremo Tribunal Federal

já decidiu que, se o indeferimento do pedido de produção de prova

técnica foi devidamente fundamentado, não há constrangimento

ilegal. (e-STJ fls. 9.430; 9.435/9.437) Grifos não constantes do

original. (....)" (fls. 9934/9946).

Em outro tópico de seu recurso, os recorrentes alegam a ausência de

fundamentação do v. acórdão recorrido no que concerne à operação de

dosimetria penal lá realizada. Aduzem, para tanto, a nulidade v.

acórdão proferido "na medida em que elevou a pena-base em 7 (sete)

meses e aplicou o acréscimo da continuidade delitiva, sem

fundamentação" (fl. 9696).

No ponto, tenho que a alegação não merece amparo, na medida em que o

v. acórdão questionado "reportou-se aos fundamentos do édito

condenatório, que concluira que a culpabilidade de N.H.I, M. DE O.

M. e O. A. DE M. devia 'ser considerada no grau máximo, tendo em

vista a alta reprovabilidade de sua conduta', uma vez que tinham

'papel de relevo e destaque dentre os servidores públicos que

integravam o esquema criminoso', destacando, ainda, que a função que

exerciam 'na empresa criminosa era de extrema e indispensável

importância para o êxito da prática delituosa'. Por fim, ressaltou

serem desfavoráveis as circunstâncias do cometimento da infração,

uma vez que relevaram 'audácia e desfaçatez'" (fl. 9950).

Além disso, vale sempre reiterar que "Não há cogitar nulidade do

acórdão por ausência de fundamentação, ou ofensa ao artigo 93,

inciso IX, da Constituição Federal, se o Colegiado estadual, ao

motivar o decisum de apelação, além dos fundamentos próprios,

reporta-se à ratio decidendi da sentença condenatória anteriormente

prolatada, ou mesmo ao parecer do Ministério Público, valendo-se da

denominada fundamentação per relationem ou aliunde." (HC 342.633/RS,

Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe

02/02/2016).

No caso, conforme referido, o v. decisum questionado reportou-se aos

fundamentos que deram suporte à dosimetria realizada em primeiro

grau de jurisdição.

De outro lado, também não merece prosperar a alegação de que a

fração correspondente à continuidade delitiva tenha sido aplicada

(no percentual de um sexto - 1/6) sem qualquer fundamentação.

Os recorrentes aduzem que "a pluralidade de condutas é uma

incógnita, vez que não foram discriminados quais seriam os vários

delitos (...) Não está descrito em quais épocas, dias, meses, ou

seja, as infrações penais não estão distinguidas no v. acórdão

recorrido (...)" Assim, "não havendo pluralidade de crimes e nem

comprovação do nexo de continuidade delitiva, é medida de rigor

jurídico ser interpretado em favor dos recorrentes" (fl. 9701).

Nesse particular aspecto da questão, tenho que o v. acórdão

recorrido - ao fixar o percentual de aumento de pena em 1/6 (um

sexto) - operou a dosimetria em favor dos recorrentes, uma vez que o

percentual de aumento da pena pela continuidade delitiva deve ser

coerente com o número de infrações cometidas e, na hipótese em

exame, esse percentual de aumento foi fixado no mínimo legal, ainda

que a prática delituosa tenha se estendido por cerca de 4 (quatro)

meses.

Com efeito, na espécie, restou consignado no v. acórdão recorrido:

"Na terceira fase, nada obstante o período em que se estendeu a

prática delituosa - cerca de quatro meses - há que ser reduzida a

fração de acréscimo de pena em face da incidência da causa de

aumento do artigo 71 do Código Penal, pois não se sabe, exatamente,

a quantidade de ações praticadas pelo réu, decisivamente, nas mesmas

condições de tempo, lugar e modo de execução.

Assim, reduzo a proporção fixada na sentença para í/6 (um sexto), de

modo que a sanção criminal definitiva resta estabelecida em 04

(quatro) anos, 02 (dois) meses e 21 (vinte e um) dias de reclusão,

em regime semiaberto, e 95 (noventa e cinco) dias-multa, no valor

unitário de 1/4 (um quarto) do salário mínimo vigente à época do

último fato, devidamente atualizado" (fl. 9512)

Sobre a questão, destaco o seguinte julgado:

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO E ATENTADO

VIOLENTO AO PUDOR. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. SÚMULA 7/STJ. CONTINUIDADE

DELITIVA. DIVERSAS CONDUTAS. AUMENTO MÍNIMO. ACUSADO BENEFICIADO.

VIOLAÇÃO DO ART. 71 DO CÓDIGO PENAL NÃO DEMONSTRADA. AGRAVO

REGIMENTAL IMPROVIDO (...)

2. Quanto ao quantum das sanções, o recurso especial não especifica

qual seria a ofensa perpetrada pelo acórdão recorrido, limitando-se

a citar o art. 71 do Código Penal. Na hipótese, foram praticadas

diversas ações e o aumento pela continuidade delitiva foi fixado na

fração mínima pelo acórdão recorrido. O agravante foi, portanto,

beneficiado na dosimetria da sua pena, já que é entendimento desta

Corte que o percentual de aumento da pena pela continuidade delitiva

deve guardar coerência com o número de infrações cometidas. Neste

sentido: HC 267217/SP, Rei. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJe de

25/11/2013, HC 147987/RJ, Rei. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta

Turma, DJe de 6/8/2012.

3. Agravo regimental improvido."

(AgRg no AREsp 457.150/MS, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares

da Fonseca, DJe 19/10/2015, grifei)

Sendo assim, e pelas razões expostas, nego seguimento aos recursos

especiais interpostos.

P. e I.

Brasília (DF), 24 de fevereiro de 2016.

Ministro Felix Fischer

Relator

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