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STJ diz que Polícia Federal deletou dados de investigação e anula provas de processo

Operação 'Negócio da China' foi deflagrada em 2008 para investigar contrabando, sonegação e lavagem de dinheiro

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Por Mateus Coutinho
Atualização:

por Fausto Macedo e Mateus Coutinho

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A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou provas produzidas em interceptações telefônicas e telemáticas (e-mails) realizadas na operação Negócio da China. Seguindo o voto da relatora, ministra Assusete Magalhães, os ministros consideraram que a conservação das provas é obrigação do Estado e sua perda impede o exercício da ampla defesa.

A operação foi deflagrada em 2008, para investigar suspeitas de contrabando, sonegação de impostos e lavagem de dinheiro pelo Grupo Casa & Vídeo. Foram denunciadas 14 pessoas, entre elas, os acusados que recorreram ao STJ por meio de habeas corpus.

Os ministros concederam o habeas corpus para anular as provas produzidas nas interceptações telemáticas e telefônicas. Eles determinaram à Justiça de primeiro grau que as retirasse integralmente do processo e que examinasse a existência de prova ilícita "por derivação".

Tudo deverá ser excluído da ação penal em curso.

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A defesa de dois dos envolvidos alegou nulidade das provas produzidas a partir das interceptações de e-mails, "ante a inviolabilidade do sigilo das comunicações telegráficas e de dados, prevista no artigo 5.º, XII, da Constituição Federal".

A defesa sustentou que não teria sido demonstrada a indispensabilidade da medida de quebra de sigilo telefônico e telemático e que o único elemento de prova anterior a essa providência eram notícias jornalísticas e documentos societários das empresas supostamente envolvidas.

Mas o principal argumento foi a falta de acesso dos investigados às provas, devido ao desaparecimento do material obtido por meio da interceptação telemática e de parte dos áudios telefônicos interceptados. Segundo a defesa, os dados foram apagados pela PF, sem que os advogados, o Ministério Público ou o Judiciário os conhecessem ou exercessem qualquer controle ou fiscalização sobre eles.

A defesa apontou "a inobservância do procedimento de incidente de inutilização de provas previsto no artigo 9.º, parágrafo único, da Lei 9.296/96". Segundo os advogados, a eliminação dos dados só foi descoberta após insistentes pedidos à Justiça de acesso integral ao material interceptado.

A ministra Assusete Magalhães destacou que a intimidade e a privacidade das pessoas não são direitos absolutos. Havendo indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal punida com pena de reclusão e a impossibilidade de produção de provas por outros meios, a jurisprudência admite a interceptação de comunicação não só por telefone, como também a telemática, que se refere à transmissão de dados.

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"Não existindo pronunciamento definitivo do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria, o STJ tem admitido a interceptação do fluxo das comunicações telemáticas", frisou a ministra. O inquérito policial foi instaurado em maio de 2006, por requisição do Ministério Público, a partir de reportagem publicada pela revista Exame, intitulada "O Misterioso Sucesso da Casa e Vídeo".

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Antes da decretação da quebra do sigilo telefônico, foram requisitados documentos na Junta Comercial do Rio de Janeiro e em cartório de registro de imóveis. Seguiu-se um minucioso relatório de inteligência policial. Somente em 2008 foi solicitada e deferida a quebra de sigilo, em decisão devidamente fundamentada, segundo analisou a ministra relatora.

Para a ministra, está demonstrado no processo que a prova cabal do envolvimento dos investigados na suposta trama criminosa não poderia ser obtida por outros meios que não a interceptação de comunicações. Apesar de considerar legal a quebra dos sigilos telefônico e telemático, a ministra Assusete Magalhães considerou ilegal a destruição do material obtido a partir das interceptações.

Os autores do habeas corpus contestaram a ausência, no DVD entregue à defesa, da integralidade do áudio das escutas e do conteúdo dos e-mails interceptados, mencionados nos relatórios e na representação policial. O próprio STJ havia assegurado a alguns dos réus o acesso integral aos autos do inquérito. No entanto, destacao STJ, parte das provas obtidas a partir da interceptação telemática foi apagada, ainda na Polícia Federal, e o conteúdo dos áudios telefônicos não foi disponibilizado da forma como captado, havendo descontinuidade nas conversas e na sua ordem.

A PF informou à Justiça que, ao contrário do que ocorre com a interceptação telefônica realizada por meio do programa Guardião, ela não dispõe de equipamentos ou programas voltados à interceptação de e-mails. Por tal motivo, essas informações seriam disponibilizadas e armazenadas diretamente pelos provedores de internet - no caso, a Embratel.

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A Embratel, por sua vez, informou que, para cumprir a ordem judicial de interceptação de e-mails, encaminhou à PF diretamente as contas-espelho criadas para a operação, de forma que fossem visualizados pelos policiais. Informou também que não foram mantidas cópias das mensagens, uma vez que a determinação judicial era apenas para desviar qualquer tráfego de dados telemáticos para um e-mail determinado pela autoridade policial.

Segundo o STJ, a Polícia Federal esclareceu que o conteúdo monitorado na interceptação telemática obtida através da Embratel "foi irremediavelmente perdido, pois o computador utilizado durante a investigação precisou ser formatado".

"Como se viu, o material obtido por meio da interceptação telemática, vinculado ao provedor Embratel, foi extraviado, ainda na Polícia Federal, impossibilitando, tanto à defesa quanto à acusação, o acesso ao seu conteúdo", afirmou a ministra Assusete Magalhães.

Citando o princípio do devido processo legal, a ministra disse que as provas produzidas em interceptações não podem servir apenas aos interesses do órgão acusador e que é imprescindível a preservação de sua integralidade, sem a qual fica inviabilizado o exercício da ampla defesa.

Quanto às interceptações telefônicas, a relatora destacou que a jurisprudência do STJ considera desnecessária a transcrição integral do material interceptado. Mas a ministra assinalou que é imprescindível, pelo menos em meio digital, que a prova seja fornecida à parte em sua integralidade, com todos os áudios do período, sem possibilidade de qualquer seleção de trechos pelos policiais executores da medida.

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Defesa: confira abaixo a nota da empresa sobre o caso

 Na última terça-feira (18/02), a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em votação unânime, reconheceu que a Polícia Federal manipulou as provas utilizadas pelo Ministério Público Federal para embasar a ação penal movida contra dirigentes, funcionários e pessoas ligadas ao grupo CASA & VÍDEO, alvo, em 2008, da operação policial batizada de Negócio da China.

 As acusações feitas pelo Ministério Público Federal foram de descaminho, lavagem de dinheiro e quadrilha. "No entanto, em outubro de 2010, a de descaminho foi trancada pelo STJ, no julgamento do habeas corpus n° 137.628/RJ, e a de lavagem de dinheiro, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do habeas corpus n° 108.715/RJ, realizado em setembro de 2013. Apenas a de formação de quadrilha prosseguia", esclarece o criminalista Fernando Augusto Fernandes, do escritório Fernando Fernandes Advogados, que defendeu os habeas corpus.

"Agora, no julgamento do habeas corpus n° 160.662/RJ, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu que a Polícia Federal inutilizou parte do material obtido por meio das interceptações telefônicas antes de a defesa dos acusados ter acesso à integralidade das gravações", afirma o criminalista. "Assim, o STJ considerou que as provas que embasaram a ação penal foram unilateralmente selecionadas pela acusação e, por isso, declarou a nulidade das interceptações telefônicas e do processo."

 Antes da operação policial, a CASA & VÍDEO era uma das maiores redes varejistas do Sudeste, que gerava 6 mil empregos diretos e mais de 20.000 indiretos, figurando como a quinta maior contribuinte de ICMS do Estado do Rio de Janeiro, apesar de já ter ocupado a terceira posição nesse ranking. Logo após a Operação Negócio da China, na qual houve o bloqueio de bens e contas bancárias, a CASA & VÍDEO foi obrigada a demitir mais de 2 mil funcionários, além de ingressar num penoso processo de recuperação judicial e até ser vendida.

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O escritório Fernando Fernandes Advogados já obteve importantes decisões dos tribunais superiores. Anulou, em leading cases, provas e grandes operações da Polícia Federal, como as gravações telefônicas da Operação Cevada, que investigava o grupo Schincariol (HC n° 57.624, do STJ); a Operação Esfinge (HC n°. 93.856, do STJ); a busca e apreensão realizada

 Na última terça-feira (18/02), a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em votação unânime, reconheceu que a Polícia Federal manipulou as provas utilizadas pelo Ministério Público Federal para embasar a ação penal movida contra dirigentes, funcionários e pessoas ligadas ao grupo CASA & VÍDEO, alvo, em 2008, da operação policial batizada de Negócio da China.

 As acusações feitas pelo Ministério Público Federal foram de descaminho, lavagem de dinheiro e quadrilha. "No entanto, em outubro de 2010, a de descaminho foi trancada pelo STJ, no julgamento do habeas corpus n° 137.628/RJ, e a de lavagem de dinheiro, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do habeas corpus n° 108.715/RJ, realizado em setembro de 2013. Apenas a de formação de quadrilha prosseguia", esclarece o criminalista Fernando Augusto Fernandes, do escritório Fernando Fernandes Advogados, que defendeu os habeas corpus.

"Agora, no julgamento do habeas corpus n° 160.662/RJ, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu que a Polícia Federal inutilizou parte do material obtido por meio das interceptações telefônicas antes de a defesa dos acusados ter acesso à integralidade das gravações", afirma o criminalista. "Assim, o STJ considerou que as provas que embasaram a ação penal foram unilateralmente selecionadas pela acusação e, por isso, declarou a nulidade das interceptações telefônicas e do processo."

Antes da operação policial, a CASA & VÍDEO era uma das maiores redes varejistas do Sudeste, que gerava 6 mil empregos diretos e mais de 20.000 indiretos, figurando como a quinta maior contribuinte de ICMS do Estado do Rio de Janeiro, apesar de já ter ocupado a terceira posição nesse ranking. Logo após a Operação Negócio da China, na qual houve o bloqueio de bens e contas bancárias, a CASA & VÍDEO foi obrigada a demitir mais de 2 mil funcionários, além de ingressar num penoso processo de recuperação judicial e até ser vendida.

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O escritório Fernando Fernandes Advogados já obteve importantes decisões dos tribunais superiores. Anulou, em leading cases, provas e grandes operações da Polícia Federal, como as gravações telefônicas da Operação Cevada, que investigava o grupo Schincariol (HC n° 57.624, do STJ); a Operação Esfinge (HC n°. 93.856, do STJ); a busca e apreensão realizada na operação Monte Éden (HC n° 149.008, do STJ); gravações ambientais (HC n° 80.949, do STF), entre inúmeros casos.

 

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