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STF mantém trecho da Lei Maria da Penha que autoriza policiais a invadirem casas para proteger mulheres de agressão

Por Weslley Galzo/BRASÍLIA
Atualização:
STF rejeitou ação de magistrados contra trecho da Lei Maria da Penha que dispensa mandado judicial para resgatar vítima de violência doméstica. Foto: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira, 23, por unanimidade, rejeitar uma ação apresentada pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) contra um trecho da Lei Maria da Penha que autoriza policiais a invadirem a casa de mulheres vítimas de violência doméstica, ou na iminência de sofrê-la, para afastar o agressor. Na prática, a lei só permite a invasão quando não houver juiz na comarca para expedir mandado judicial autorizando a ação policial, mesmo assim a AMB considera a medida inconstitucional.

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Embora a medida seja aplicada na prática para evitar crimes de feminicídio, a AMB argumenta que "não se pode cogitar da possibilidade de um policial ou delgado vir a 'penetrar' no 'lar, domicílio ou local de convivência', sem ordem judicial, para retirar alguém do ambiente e ainda mantê-lo afastado, privando-o de sua liberdade, antes do devido processo legal".

Em manifestação encaminhada ao Supremo, a Presidência da República, a Câmara e o Senado foram contrários ao pedido de alteração da lei. Para os integrantes da cúpula do Senado, o dispositivo da Lei Maria da Penha que garante a intervenção policial, sem autorização prévia da Justiça, tem como objetivo garantir "um maior nível de proteção das mulheres em relação às agressões e violências domésticas."

Dados publicados pelo Fórum de Segurança Pública em dezembro passado mostram que 666 mulheres foram assassinadas por atuais ou ex-companheiros entre janeiro e junho de 2021. Além disso, os casos de estupro em geral e de vulnerável, com vítimas mulheres, aumentaram 8,3% no País no primeiro semestre do ano passado em comparação ao mesmo período de 2020. O levantamento considera a possibilidade de subnotificação, pois nem todos os crimes cometidos contra mulheres por atuais ou ex-parceiros são registrados como feminicídio.

O relator do caso, Alexandre de Moraes, destacou em seu voto que apenas 48% dos municípios no País sediam comarcas da Justiça Estadual -- ou seja, os órgãos competentes por autorizar as invasões domiciliares para proteger vítimas em potencial. O ministro disse ainda não ser razoável esperar decisões para garantir a segurança das mulheres. Ele citou o fato de antes do trecho em questão ser adicionado à Lei Maria da Penha ser necessário aguardar quatro dias entre a comunicação judicial e a decisão.

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"Fui promotor criminal em São Paulo. As mulheres procuravam a promotoria e quando voltavam para casa às vezes eram mais agredidas ainda e, não raramente, mortas pela procura às autoridades", disse Moraes. "Ainda há 1.464 municípios sem delegacia de polícia no Brasil. Por absurdo que pareça, não há nem a figura da polícia. Se 52% dos municípios não são sede de comarca, algo precisava ser feito para dar mais efetividade", destacou em outro momento.

A ministra Cármen Lúcia, responsável por iniciativas de combate à discriminação de gênero no Supremo, defendeu em seu voto que a medida de invasão domiciliar é aplicada de maneira excepcional na ausência de juiz na comarca com condições de expedir uma decisão. A magistrada disse ser necessário levar em consideração "a proteção eficiente que a de ser dada à mulher" e enfatizou que "vivemos numa sociedade extremamente preconceituosa contra a mulher".

"Na carência do Estado brasileiro de oferecer um juiz naquela comarca é que se permite que uma outra autoridade, que não do judiciário -- porque nós do judiciário teríamos falhado, afinal justiça ausente é justiça falha --, é neste momento que a autoridade policial atua, tendo que se remeter, como nos casos de prisão em flagrante, em que se tem que comunicar também a autoridade judicial. Não há substituição de uma autoridade e pela outra", afirmou.

Para a ministra, é necessário aumentar o número de juízes no País, em vez de limitar uma medida excepcional. Ela disse não ver "nenhuma incompatibilidade com o princípio da jurisdição" e sustentou que o caso analisado pelo Supremo buscou "a liberdade e garantia da vida" das mulheres.

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